Acadêmicos avaliam Acordos de Oslo como "rendição palestina"

Os Acordos de Oslo, que completaram 20 anos, foram um “desastre completo” para o povo da Palestina. Este foi o veredito quase unânime dos participantes da conferência realizada pelo Middle East Monitor (Monitor do Oriente Médio, Memo) em Londres, na semana passada. “A paz ilusória: O legado de Oslo 20 anos depois” reuniu uma riqueza de conhecimentos e experiências sobre o assunto, com especialistas e ativistas juntos na plataforma e na audiência.

Acordos de Oslo - Casa Branca / Estados Unidos

Na abertura do programa, o diretor do Memo, Daud Abdullah, assinalou que nenhum debate foi realizado antes de Oslo. A conferência seria considerada um sucesso, ele disse, se o Memo pudesse estimular a discussão sobre este tópico tão importante.

O principal exponente, Bichara Khader falou sobre “O caminho em direção a um maior papel político da União Europeia na busca pela paz no Oriente Médio”. O diretor do Centro de Estudo e Pesquisa Árabe da Universidade de Louvain, da Bélgica, ressaltou que a Europa tem sido parte e parcela da questão palestina desde o começo.

“A precursora da UE, a Comunidade Econômica Europeia, negligenciou completamente a questão palestina no fim da década de 1950; hoje, entretanto, a UE reconhece o direito dos palestinos a um Estado, com Jerusalém Leste como a sua capital”, disse Khader.

“Infelizmente, a Nakba [Catástrofe] Palestina de 1948 é considerada um ‘dano colateral’ da criação do Estado de Israel, e assim a questão tornou-se um foco sobre os refugiados, e é tratada como uma crise humanitária”, criticou o pesquisador.

Para alcançar os objetivos políticos dos palestinos, ele sugeriu, a UE precisa dirigir-se a todos os setores da sociedade palestina. “Ela precisa dirigir-se e relacionar-se com o Hamas, por exemplo, já que [o partido islâmico] é um ator legítimo no cenário político”.

Desrespeito pelo direito internacional

O professor Manuel Hassassian é o embaixador palestino para o Reino Unido, mas estava na conferência como um acadêmico e um cientista político. Ele previu, há 20 anos, que a única coisa que Oslo faria era “legitimar” a ocupação dos territórios palestinos. “Eu estava certo”. O processo de paz, disse ele, foi configurado para resolver o problema de aceitação de Israel no Oriente Médio, e não para resolver o conflito.

A quem se deve culpar pela “falha” de Oslo? Ele não se ilude: “Oslo falhou devido ao desrespeito de Israel pelo direito internacional e pela contínua colonização, que tem expandido a ocupação”. A “procrastinação” de Israel prolongou a ocupação, dando tempo para cada vez mais colônias “cancerosas” serem construídas.

“Oslo nunca foi um acordo entre iguais, em absoluto; os palestinos foram apressados para a criação de algo em segredo, e que só liberou Israel da responsabilidade dos cuidados ao povo que vivia sob a sua ocupação”.

O reconhecimento que a Organização para a Libertação da Palestina garantiu a Israel tornou a terra ocupada um “território disputado”, disse o embaixador Hassassian, enquanto afirmava que “a ideia de uma solução de dois Estados está morta; é uma fantasia.” Com o mediador supostamente “honesto”, os Estados Unidos, ao lado do cão mais forte, Israel, as negociações serão “fúteis”.

A ausência do direito internacional nos Acordos de Oslo foi ressaltada por John. O artigo 47 da Convenção de Genebra, disse o professor de direito da África do Sul, especialista sobre o apartheid, proíbe claramente qualquer acordo que contenha prejuízos aos direitos de um povo; a Declaração de Princípios de Oslo, lembrou o professor, não menciona o direito dos palestinos à autodeterminação ou o direito dos refugiados de retornarem. “Assim sendo, o direito internacional está definitivamente do lado dos palestinos”.

Linhas vermelhas estão em moda no momento, disse Dugard, mas as linhas vermelhas para os palestinos são, na verdade, o direito internacional e as convenções. “Precisamos sempre impor a lei, especialmente lidando com os dois principais violadores do direito internacional, os Estados Unidos e Israel”. Em sua opinião especializada, a situação nos territórios ocupados cumpre os critérios para a definição legal de segregação (apartheid) e deveria ser dirigida como tal: apartheid é, obviamente, um crime contra a humanidade. O “colonialismo” israelense e o “apartheid” não são mais aceitáveis no século 21 do que no século 20.

Rendição dos palestinos

O historiador Avi Shlaim, da Universidade de Oxford, relembrou os artigos que ele e o falecido [intelectual palestino] Edward Said escreveram no final de 1993, favoráveis e contrários a Oslo. Said acreditava que o acordo “colocou de lado a legalidade internacional e comprometeu os direitos fundamentais do povo palestino”. O acadêmico palestino, que vivia nos Estados Unidos, classificou o acordo de “um instrumento de rendição dos palestinos, um Versalhes palestino”.

Shlaim, por outro lado, era otimista: “Eu acreditava que [o acordo] colocaria em movimento um processo gradual mas irreversível de retirada israelense dos territórios ocupados, e que pavimentaria o caminho para o estabelecimento do Estado palestino”. 20 anos depois, disse ele, “é claro que Edward Said estava certo em sua análise, e eu estava errado”. Shlaim compartilhou da opinião de que “Israel é grande responsável pela falha de Oslo”. O acordo, sublinhou o professor, não estabelece uma “finalização”.

O diretor de Relações Internacionais do partido palestino Fatah, Dr Husam Zomlot, complementou este ponto. “O processo de paz é desenhado para impedir um final”, disse ele, desde o seu escritório, em Ramallah [sede do governo palestino, na Cisjordânia]. A [instituição da] Autoridade Palestina, afirmou, dá “conforto” para os israelenses e a sua ocupação.

Os oradores e os participantes da conferência expressaram consternação pelo fato de a UE e outras agências doadoras basicamente subsidiarem a ocupação “brutal” de Israel, ao liberar o Estado sionista do seu dever de prover educação e cuidados de saúde aos palestinos nos territórios ocupados.

Outros oradores, inclusive Daniel Levy e Azzam Tamimi, também culparam a liderança política palestina, “cuja paralisia alimentou e impulsionou a impunidade israelense” ao longo dos anos. De acordo com o exilado palestino, Tamimi, isso ressalta a necessidade de reforma da OLP, “ou da sua substituição por outra organização, mais representativa”.

Outros participantes da conferência foram Salman Abu Sitta, Robert Blecher e Alastair Crooke. As sessões foram presididas por Oliver McTernan, John McHugo, Peter Oborne e Clare Short.

Fonte: Middle East Monitor
Tradução: Moara Crivelente, da redação do Vermelho