Espionagem dos EUA à América Latina, um assunto de transgressão

A presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, qualificou como uma "violação da soberania e dos direitos humanos" a espionagem dos Estados Unidos a seu país e a várias outras nações latino-americanas.

Por esse motivo, seu governo pediu explicações sobre este procedimento e, ao não receber resposta, decidiu esta semana cancelar uma visita oficial a Washington prevista para 23 de outubro.

"As práticas ilegais de interceptação das comunicações e dados de cidadãos, empresas e membros do governo brasileiro constituem um ato grave que atenta contra a soberania nacional e os direitos individuais e é incompatível com a convivência democrática entre países amigos", indica um comunicado do palácio do Planalto.

A verdade é que o Brasil é um dos muitos países vigiados pela rede de espionagem dos Estados Unidos.

Segundo o ex-técnico da Agência de Segurança Nacional (NSA) Edward J. Snowden, grande parte das comunicações da América Latina são interceptadas por Washington.

Os vazamentos de Snowden – que também proporcionaram detalhes sobre a espionagem estadunidense a seus aliados da Europa e se converteram em um escândalo mundial – só reafirmam o que líderes latino-americanos já tinham denunciado há muito tempo atrás.

"Mais que revelações, são confirmações do que pensávamos que estava acontecendo", destacou a presidenta argentina, Cristina Fernández, ao ficar sabendo das informações.

Poucos anos antes, o falecido presidente da Venezuela Hugo Chávez; o chefe de Estado da Bolívia, Evo Morales; e o do Equador, Rafael Correa, declararam publicamente que, por trás dos atos golpistas e desestabilizadores promovidos nesses países, estava a mão de Washington também com sua rede de espionagem.

O controle estadunidense sobre a informação dos países latino-americanos se estendeu àqueles países que escolheram um sistema político diferente como a Venezuela, no entanto, até os grandes aliados como a Colômbia foram alvo de espionagem.

Estes procedimentos da administração estadunidense, com sua vasta rede de vigilância de comunicações, provocaram um mal-estar generalizado constituindo uma franca violação do direito internacional e da soberania da América Latina.

O alcance que o episódio teve é de tamanha dimensão que os países afetados, assim que ficaram sabendo da interceptação, pediram explicações ao governo de Barack Obama, analisaram o tema através de diferentes mecanismos de integração regional e decidiram levá-lo à 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas.

"Não estamos de acordo, de jeito nenhum, com uma interferência deste tipo no Brasil, nem em nenhum outro país", disse a presidenta brasileira.

Também Argentina, Equador, Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras, Paraguai, Chile, Peru e El Salvador caíram nos tentáculos do programa de vigilância da NSA.

Quais objetivos os Estados Unidos têm para tais procedimentos nesta região considerada de paz, e, pior ainda, até com os amigos?

Segundo informação entregue por Snowden ao jornalista Glenn Greenwald, divulgada através do jornal brasileiro O Globo, a NSA reuniu dados militares e de segurança de alguns países, informação sobre empresas comerciais, e das estatais Petróleos de Venezuela S.A. e dados sobre o petróleo e os recursos energéticos no México.

As operações para usurpar informação foram feitas através de chamadas telefônicas, e acesso a dados na Internet introduzidos nos servidores das companhias Google, Facebook e Skype.

Nesse subcontinente, estão a maior reserva de petróleo do mundo, há abundantes recursos hídricos, de gás natural, minerais e uma grande biodiversidade,

Do ponto de vista geoestratégico, está rodeado pelos oceanos Atlântico e Pacífico e o Mar do Caribe ao norte, o que explica alguns dos interesses por trás desse tipo de controle.

"Há documentos que indicam que um dos temas sobre os quais mais espionam no México é energia e petróleo", afirmou Greenwald.

A presidenta da Petrobras, empresa brasileira de petróleo, Graça Foster, admitiu a possibilidade de que sua companhia fosse objeto de ataques cibernéticos para interceptar informação.

Para Obama, o objetivo é lutar contra o terrorismo e as armas de destruição massiva, a favor da segurança cibernética e da segurança nacional.

Este discurso não convence a América Latina porque além das denúncias em diversos contextos, a região revisa seus serviços de inteligência com o fim de evitar a ingerência do país imperialista.

Até nos próprios Estados Unidos, várias companhias começaram uma campanha chamada "Stop Watching Us" (Parem de nos Vigiar") contra os programas secretos de espionagem.

Snowden garante que para Washington "o fato de não saber tudo sobre todo mundo significa uma crise existencial e se chega à impressão de que desrespeitar as normas está bem. Uma vez que as pessoas te odeiam por não cumprir com essas normas, seu incumprimento se converte em uma questão de sobrevivência" explicou.

Fonte: Prensa Latina