Joan Edessom: Homenagem a Patinhas

O texto foi proferido durante homenagem a Carlos Augusto Diógenes, o Patinhas, ex-presidente estadual do PCdoB-CE que, por 22 anos, liderou os comunistas cearenses.

É preciso não ter medo,
é preciso ter a coragem de dizer.
(Carlos Marighela, Rondó da liberdade)

Carlos, Cacá, Carlos Augusto, Luís, João. Há homens que são múltiplos, diversos, em um só; e que parecem viver tantas vidas que não caberiam em uma única.

Carlos Augusto Diógenes Pinheiro é desses homens, múltiplos, que numa única vida vivem muitas.

No restaurante universitário ou no curso de engenharia da Universidade Federal do Ceará; no Jaguaribe; em Macarani, no sul da Bahia; na Vila Maria, em São Paulo; no Mato Grosso; em Pimenta Bueno, em Rondônia; em todos estes lugares Carlos Augusto foi muitos e foi um só.

Estudante, engenheiro, pequeno lavrador, mestre de obras, topógrafo, professor, ao longo da vida Carlos Augusto foi tudo isso mas, no fundo, foi apenas uma coisa: um construtor.

Foi construtor de um caminho, um caminho extremamente acidentado, árduo, mas que serviu para que, por ele, passasse uma nação inteira. Carlos Augusto, juntamente com centenas e milhares de brasileiros, construiu o caminho para que este país deixasse uma ditadura sangrenta e ingressasse numa democracia. Muito do que somos hoje, em nossa pátria, é devido a homens como ele.

Carlos Augusto sempre foi um homem das exatas, um engenheiro, um matemático, pouco afeito à poesia. Será mesmo? O que ele fez e continua fazendo, até hoje, na verdade é a escrita de um grande poema, um poema épico. Parafraseando outro Carlos, poeta e revolucionário, este Carlos Augusto escreveu e continua a escrever, através da sua militância política, um “rondó da liberdade”.

Carlos Augusto é um menino grande, um menino sertanejo do Jaguaribe, desajeitado, desengonçado. Daqueles meninos que chegam aos lugares fazendo alarido, rindo de tudo e de todos, pisando nos brinquedos alheios, mas que, inexplicavelmente, não desperta zangas nos outros. Os sentimentos que se têm por ele vão sempre do respeito à ternura, da admiração ao carinho. Talvez, por ser este menino grande, com seu eterno grito de “juventude”, é que os jovens tenham tanto bem-querer por ele.

Um dia, perdido num canto deste imenso Brasil, quando nosso país vivia uma escuridão que parecia não ter fim, Carlos Augusto, como topógrafo, demarcou os limites de uma cidade. Seu nome, então, era João Ferreira dos Santos. Sua condição era a de clandestino, de pária dentro do seu próprio país, de exilado da sua própria família. No coração de Rondônia Carlos Augusto mediu e fincou os marcos de madeira com suas iniciais: JFS. É possível que, ainda hoje, nas imediações da cidade de Rolim de Moura, nós consigamos encontrar esses marcos, com as iniciais JFS, como marcas do trabalho de um construtor.

No Ceará, qualquer um que se dedicar a prospectar a nossa história política do último meio século, haverá de encontrar também alguns marcos, que delimitaram o campo progressista, que se fincaram afirmando o império da liberdade, o nascer da democracia, o cultivar de um novo mundo.

Em um desses marcos da história do Ceará, certamente, haverá um nome escrito nele, um nome que, bem mais fortemente do que as iniciais JFS em Rolim de Moura, significa muito para os comunistas cearenses e para todos os que lutaram e lutam pela democracia.

Nos nossos corações, um nome que sintetiza todos os outros, que dá conta da multiplicidade deste homem, por quem temos tanto carinho.

Nos nossos corações, um único nome: Patinhas.