Cláudio Ferreira Lima: A urgência da reforma política

Por *Cláudio Ferreira Lima

O sistema político é construção altamente complexa, que abriga tanto instituições, como governo, partidos, Congresso e forças representativas da sociedade civil, de papel politicamente relevante, quanto regras, como regime de governo e sistemas eleitoral e partidário. É no seu interior que se tomam as grandes decisões a cuja obediência deve render-se toda a sociedade. Reformar sistema dessa natureza é tarefa extremamente difícil, visto que significa nada menos que obter o consentimento do poder para mudar as bases em que ele se assenta. E mudança assim nos remete à lição de Maquiavel em O príncipe, segundo a qual “devemos convir que não há coisa mais difícil de se fazer, mais duvidosa de se alcançar, ou mais perigosa de se manejar do que ser introdutor de uma nova ordem, porque quem o é tem por inimigos todos aqueles que se beneficiam com a antiga ordem, e como tímidos defensores todos aqueles a quem as novas instituições beneficiariam”. E, no entanto, é preciso mudar. Uma nova ordem faz-se urgente, sob pena de sérios danos à democracia brasileira, que, a duras penas, lutamos para consolidar, com graves consequências no plano socioeconômico. Mas, como gosta de lembrar o professor Filomeno Moraes, não s e muda uma construção histórica de uma hora para outra. Nesse terreno, em face inclusive das razões expostas pelo secretário florentino, não se pode dar saltos, nem mesmo na ruptura que, no Brasil, aliás, nunca em sua história – marcada pela conciliação –, chegou a ocorrer de verdade.

É inegável que, sobretudo depois da Revolução de 30, o sistema eleitoral conheceu expressivo avanço tanto na inclusão da população no eleitorado (voto feminino em 1934, voto do analfabeto em 1985 e, com a Constituição de 1988, idade mínima de dezesseis anos para o eleitor), quanto na administração do processo, no sentido de tornar os resultados dos pleitos mais verdadeiros (criação da Justiça Eleitoral em 1932, uso da informática e campanhas da sociedade civil pela lisura eleitoral, culminando, mais recentemente, com a Lei da Ficha Limpa). Mas isso não é suficiente. É preciso – e a rua tem exigido isso com veemência – melhorar as relações entre o Estado e a Sociedade, mediante o aperfeiçoamento da democracia representativa e o fortalecimento da democracia direta e participativa, com regras normativas mais claras para a aplicação dos mecanismos de participação popular (art. 14 da Constituição federal).

Estão aí, a um só tempo, a fundamentação e as linhas mais gerais e urgentes para a reforma política. Sobre como proceder, não é o caso, como o próprio governo chegou a cogitar, de uma constituinte exclusiva, visto que, como nos ensina Paulo Bonavides, não há ruptura que a justifique.

O caminho, conforme a lei da Ficha Limpa já indicou, é a iniciativa popular. Mas, atenção! A reforma não é panaceia, e deve começar, necessariamente, no cidadão, pois ela não ocorrerá enquanto convivermos com o elevado grau de analfabetismo político que permeia todas as camadas da nossa sociedade.

*Cláudio Ferreira Lima é economista

Fonte: O Povo

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