Albano Nunes: Uma luta heróica

Da Colômbia habituamo-nos há muito a receber notícias de luta popular persistente e corajosa e de cruel repressão terrorista, numa espiral que parece não ter fim. Nos últimos dias novas notícias chegaram.

Por Albano Nunes*, no jornal “Avante!”

Chegaram de Havana onde prossegue o processo de negociações entre as Farc e o governo de Juan Manuel dos Santos. Um processo que em si mesmo é já um sucesso da oposição progressista e revolucionária colombiana que, combinando criativamente todas as formas de luta – legal, semilegal e ilegal, pacífica e armada – forçou o governo a reconhecer a legitimidade de uma força a que a classe dominante procurou colar o infamante rótulo de «narcoterrorista». Um processo que é inseparável da ação das forças sociais e políticas que por todo o país desenvolvem intensa atividade pela paz e pela democracia e para pôr fim aos crimes das Polícias e do Exército, dos bandos fascistas das Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC), dos sicários ao serviço dos latifundiários e traficantes de droga. Um processo extraordinariamente difícil como o são todos aqueles em que as forças revolucionárias defendem à mesa de negociações os mesmos objetivos que proclamam pacificamente na rua e nas instituições ou na resistência armada. Um processo que depois dos acordos já alcançados nos dois primeiros capítulos da agenda, pode estar ameaçado pela resistência dos sectores mais reacionários.

Chegaram também do interior do país, onde a dizimada União Patriótica reconquistou a legalidade, mas em que se vêm multiplicando as ações de intimidação e repressão contra o movimento popular e democrático, contra os sindicatos, contra eleitos do Pólo Democrático e Alternativo, contra ativistas da Marcha Patriótica, contra o Partido Comunista Colombiano que na madrugada do passado dia 20 viu a sua sede atacada pela Polícia Metropolitana e o seu vigilante preso e torturado. Isto num quadro em
que no espaço de um ano foram assassinados 26 militantes da Marcha e 25 sindicalistas da Central Unitária dos Trabalhadores (CUT) e se verificaram numerosas prisões, elevando para 9.500 o número de presos políticos. São notícias inquietantes que, por um lado, mostram a grande vitalidade da luta do povo colombiano, por outro lado abalam as esperanças despertas pelas conversações de paz em Havana.

A solidariedade com a luta dos comunistas, dos revolucionários, dos democratas e patriotas colombianos é necessária para erradicar as práticas de terrorismo de Estado, de criminalização de toda a forma de resistência e de assassinatos em massa do anterior governo de Álvaro Uribe, hoje a braços com processos de envolvimento direto com os traficantes de droga e os paramilitares assassinos. E para contrariar a avassaladora ingerência do imperialismo norte-americano que faz da Colômbia trampolim para a sua ofensiva contra a Venezuela Bolivariana e os países que na América Latina procuram seguir uma via de soberania e progresso social.

Mas há uma razão mais a apelar à nossa solidariedade: a extraordinária persistência, coragem e combatividade do povo colombiano em que é justo destacar o papel histórico insubstituível dos comunistas. Tantas décadas de luta duríssima, tanta repressão e tanto sangue vertido por sucessivas gerações de lutadores, tantos acidentes e viragens na história deste martirizado país, e a luta continua. E continua com a “tática de combinação das mais diversas formas de luta que é a essência da política do nosso partido, que preconiza e pratica todos os métodos de luta de massas, de acordo com as circunstâncias concretas”, como afirmava Gilberto Vieira, o então prestigiado Secretário-geral do Partido Comunista Colombiano na Conferência Internacional de Partidos Comunistas e Operários de 1969. Evidenciando, com a originalidade e a criatividade própria dos genuínos processos revolucionários, a extraordinária diversidade dos caminhos do progresso social e do socialismo.

*Membro da direção do Partido Comunista Português