México: A ferida aberta e os jovens que não voltaram para casa em 2014
A busca por respostas sobre o desaparecimento de 43 estudantes após um protesto no estado de Guerrero acabou trazendo à tona um escândalo de proporções catastróficas para as autoridades do México. Evidenciou-se, uma vez mais, a fragilidade do governo do país, imerso em uma crise institucional. Acompanhe a retrospectiva e o drama de Ayotzinapa por meio da linha do tempo interativa preparada pelo Portal Vermelho.
Por Théa Rodrigues, da redação do Portal Vermelho
Publicado 01/12/2014 15:45

Em setembro deste ano, 43 estudantes da Escola Normal Rural de Ayotzinapa desapareceram após participarem de um protesto. Detidos pela polícia e depois entregues à um grupo de traficantes, os jovens nunca mais foram vistos. As autoridades do município de Iguala tentaram fazer com que o assunto fosse tratado como uma ação do crime organizado na região, assim as notícias se restringiriam às páginas de assuntos policiais.
Após serem acusados de ter ordenado a detenção e a entrega dos 43 estudantes a um cartel local, o prefeito de Iguala, José Luis Abarca, e sua esposa, Maria de los Ángeles Pineda foram presos e, assim, deu-se início ao desmoronamento de um castelo de cartas no México. Ficou evidente, mais uma vez, o estreito envolvimento entre partidos, políticos e o crime organizado – algo que de certo modo sempre foi tratado nas entrelinhas (mesmo sendo uma relação já consolidada pelo tempo).
Até o momento, o governo não reconhece a responsabilidade do Estado no sumiço e tampouco o caráter nacional dos protestos que se seguiram ao acontecido. Isso só tem alimentado o descontentamento da população, que vive a estafa da violência resultante da cumplicidade das instituições públicas com a máfia. É óbvio que os cidadãos não confiam mais no Estado.
Além de protestar contra a leniência do Estado na investigação, os familiares buscam chamar a atenção da comunidade internacional para que as investigações ganhem celeridade. Protestos desencadeados pela tragédia se espalham por todo o país. Centenas de milicianos se deslocaram para Iguala e iniciaram as suas próprias buscas aos estudantes, à margem das forças de segurança federais.
Durante as buscas, mais de 60 corpos foram encontrados em valas clandestinas. No entanto, dentre os 43 desaparecidos, apenas um foi identificado entre os restos mortais encontrados em um lixão de Cocula (Guerrero), lugar onde dois suspeitos presos confessaram ter assassinado e queimado os jovens. Forenses argentinos, legistas independentes encarregados de fiscalizar a investigação mexicana, resgataram 17 restos mortais de dois sacos de lixo encontrados no rio próximo ao lugar do sequestro.
Acompanhe os acontecimentos na linha do tempo:
O desaparecimento dos jovens de Iguala não é um caso isolado. Segundo informações da Anistia Internacional, muitas investigações de crimes semelhantes foram arquivadas precocemente no México. Alguns cálculos falam de mais de 100.000 mortos e 22.000 desaparecidos desde que o ex-presidente Felipe Calderón lançou a guerra contra o narcotráfico em 2006.
Especialistas afirmam que as políticas norte-americanas pelo controle de armas e a chamada “guerra às drogas”, que visa combater o narcotráfico são, em grande parte, responsáveis pelo descontrole estatal que vê no México.
Os Estados Unidos decidiram criminalizar a economia que satisfaz seu enorme apetite por drogas. Como o México tem um sistema policial mais frágil e corrupto, a tentação de deixar que sejam realizadas ali as atividades ilegais relacionadas é perfeitamente previsível.
Alguns rumores indicam que o desgaste do governo acelera o processo de dissolução do Estado mexicano. Sinais disso se tornam cada vez mais claros, sobretudo, no discurso do poder público, que não conseguem decifrar os sinais enviados pela sociedade civil, que chegou a pedir, inclusive, a renúncia do presidente.
O descontentamento geral da população mexicana e as cobranças internacionais devem colocar o presidente Enrique Peña Nieto na linha de tiro dos defensores dos direitos humanos. Resta saber se o governo resistirá às pressões em 2015.