Atingidos pela Chevron no Equador têm esperanças na justiça brasileira
Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) podem tomar a decisão de impor a reparação de danos de um dos maiores desastres ambientais, sociais e culturais da história. O caso dos atingidos pela Chevron-Texaco, nas províncias de Orellana e Sucumbíos, na Amazônia equatoriana, chegou à Justiça brasileira depois da petroleira se recusar a pagar a indenização de US$ 9,5 bilhões, prevista na decisão da Corte Nacional de Justiça do Equador.
Publicado 23/09/2015 16:53

“A Justiça brasileira tem a oportunidade, agora, de demonstrar ao mundo que é independente, transparente. O oponente neste caso é uma das maiores [empresas] do mundo, que tem mais de 2 mil advogados trabalhando em tempo integral contra a gente. A Chevron faz um grande esforço para transformar as vítimas em criminosos e a empresa em vítima”, ressalta Fajardo, advogado que defende os atingidos pela companhia no Equador, em uma batalha judicial que já dura quase 22 anos.
Ele conta que a Chevron se aproveitou da demora dos processos judiciais. Quando o caso foi encerrado na Justiça do Equador, com posição favorável aos afetados pela Chevron, em 2012, a empresa já não tinha mais bens no país, o que se mostrou como obstáculo para a desapropriação de ativos e a reparação dos grupos prejudicados. Diante da situação, a Udapt decidiu entrar com ações em outros países onde a petroleira tem empreendimentos. Além do processo no STJ brasileiro, foram abertos outros na Argentina e no Canadá.
De acordo com Fajardo, a empresa foi responsabilizada pela poluição de 480 mil hectares da Floresta Amazônica equatoriana, pelo derramamento de 60 bilhões de litros de água tóxica e pela formação de mil piscinas de resíduos contaminantes junto aos poços de petróleo perfurados. Estima-se que pelo menos 30 mil pessoas tenham sido diretamente prejudicadas. Fajardo ressalta que o dano foi tanto que não é tão fácil mensurar os impactos indiretos. “Os rios levaram essa água tóxica também para a Amazônia no Brasil e no Peru”, exemplifica.
Racismo ambiental
Para o advogado, as ações da Chevron não podem ser vistas apenas como acidentes. “A empresa fez tudo que fez com a clara intenção de obter mais lucro”, diz. Ele caracteriza as atividades da petroleira como “absolutamente racistas”, lembrando que entre os mais prejudicados estão seis povos indígenas: Cofans, Siona, Siekopai, Secoyas, Tetetes e Sansahuari, sendo que estes dois últimos “desapareceram logo nos primeiros anos de atuação da Chevron no Equador”.
O indígena Humberto Piaguaje, porta-voz dos Siekopai no julgamento contra a petroleira, destaca que os reflexos dessa degradação também estão na saúde da população. As áreas diretamente atingidas registram os mais altos índices de câncer no país. Houve pelo menos 2 mil mortos pela doença nas regiões impactadas pela petroleira. As populações das províncias de Orellana e Sucumbíos viram se espalhar doenças como leucemia, principalmente entre crianças, e câncer de útero, estômago, fígado e pulmões entre os adultos.
Sem informação do Estado ou da empresa, Piaguaje relata que muitos beberam a água contaminada e consumiram peixe dos rios poluídos. “Durante toda minha vida, vi como foram sendo afetados nossos rios, nossa selva, nosso ar. No que era um paraíso de beleza natural, onde podíamos pegar peixes, pegar medicamentos na floresta, para poder, sobretudo, ter uma vida digna, veio a atividade da petroleira, sem respeito às vidas dos humanos e da natureza”, relembra ele, que perdeu sete parentes vítimas de câncer.
Rrelembre o caso
A Chevron operou no Equador entre as décadas de 1960 e 1990. O litígio contra a petroleira foi instaurado, em 1993, nos Estados Unidos, país de origem da empresa. Nove anos depois, o processo voltou para o Equador. Em 2012, os afetados, finalmente, conseguiram uma decisão judicial favorável da Suprema Corte equatoriana. A empresa foi condenada a pagar US$ 9,5 bilhões, mas retirou todos os seus bens do país.
No Brasil, o Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se, em maio último, contra a homologação da sentença. Antônia de Araújo Lima, advogada de defesa dos afetados pela Chevron no país, explica que a decisão final cabe aos ministros do STJ. Ela avalia que a posição do MPF é “desacertada” por desrespeitar a soberania do Equador. “Não se julga o mérito da causa em homologações de sentença estrangeira. Apenas é preciso ver se a sentença cumpre determinados quesitos do STJ. Você não pode entrar nessa discussão de mérito, pois ela já foi discutida no Equador”, argumenta.
Sem mobilização contra, o temor é que a Justiça brasileira ceda às pressões da empresa. Segundo a Udapt, as pressões da Chevron travaram o avanço do caso na Argentina. Em meio a tantas dificuldades, houve, no início deste mês de setembro, uma primeira vitória na Suprema Corte do Canadá, que reconheceu que existe jurisdição para avançar na homologação do processo no país. A notícia trouxe esperança aos afetados pela Chevron no Equador e aos seus apoiadores pelo mundo.