Arruda Bastos – Cunha: até quando?

Por *Arruda Bastos

Eduardo Cunha - AP

Pensei em não escrever mais sobre o deputado afastado Eduardo Cunha, entretanto isso é tarefa deveras difícil, haja vista que ele sempre apronta novas peripécias. Acredito que até que seja consumada a cassação do seu mandato pela Câmara dos Deputados, muitas outras linhas vou ter que redigir. Nos últimos meses, assinei vários artigos discorrendo sobre a ficha criminal e patológica do referido meliante. Cito os principais: Cunha, o bandido com seu período santo; Cunha, o Al Capone dos tempos modernos; Cunha, o apogeu e o ocaso de um gângster; Tem um "barriga branca" no Planalto.

Todos os meus artigos anteriores vaticinaram o que está ocorrendo agora: Eduardo Cunha continua a operar lépido e faqueiro, acima do bem e do mal, na nossa república, até mesmo a suspensão do seu mandato de parlamentar e da presidência da Câmara dos Deputados, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não inibiu suas movimentações políticas de bastidores. Ele segue nas articulações para barrar sua cassação e continua como Orientador-Mor do governo golpista de Michel Temer.

Uma das últimas ações de Eduardo Cunha, que comprova a minha assertiva, foi a audiência com Temer, mesmo com a decisão do STF de suspender o seu mandato e o impedir de ocupar o gabinete ou circular nas dependências da Câmara. Tal fato não o impediu de articular com Temer sua salvação na Câmara. Só mesmo um usurpador do posto de Presidente interino para receber no Palácio um réu em dois processos no STF, com solicitação de prisão ainda para ser decidida e afastado do mandato e da presidência.

A imprensa golpista, capitaneada pela Globo, não divulgou em letras garrafais tão espúria reunião de articulação. Um conluio entre Temer e Cunha, sugerindo uma parceria de quem tem uma série de atividades contra a democracia, envolvimento em escândalos de corrupção sob investigação na Operação Lava Jato e em outras divulgadas, inclusive nas gravações de Sérgio Machado como abordei nos artigos “O golpe balança e vai cair” e “Jucá e o mensalão do impeachment”. Onde estão as manifestações contra esse escárnio?

A gota d’água que motivou esse artigo foi o teor do relatório do deputado Ronaldo Fonseca (Pros-DF), apresentado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que defende a anulação da votação do Conselho de Ética, apontando violações do devido processo legal. Ao se justificar, antes de iniciar a leitura do voto, Fonseca afirmou que levou em conta a defesa do "estado democrático de direito". Um golpista contumaz defendendo a Constituição… O que dá pra rir, dá pra chorar.

O argumento pueril do fato de a votação ter sido feita por chamada nominal e não no painel eletrônico, não se sustenta em pé. A tese de o “efeito manada” ter influenciado no voto de pelo menos um parlamentar, referindo-se ao voto do deputado Wladimir Costa (SD-PA), não é crível. Em um ponto o relator tem razão: a nossa Câmara Federal é um verdadeiro curral repleto de animais irracionais e Cunha é o Rei do Gado.

O fato mais grave em tudo que aconteceu veio na divulgação de que o relator foi aliciado com distribuição de cargos e, principalmente, de uma diretoria do Arquivo Nacional para um seu apadrinhado, José Ricardo Marques, que foi nomeado para a direção-geral do órgão no mesmo dia da leitura do relatório. Como diz o pensamento de Dona Geo, são coincidências demais para serem meras coincidências. São muitos acasos para serem por acaso. Então, de quantos acasos coincidentes é feito o destino? O melhor é perguntar a Temer e Cunha, que articularam na sua reunião do final de semana mais esta trama. Até quando o povo brasileiro vai tolerar esses dois personagens?

Na entrevista depois da renúncia da Presidência da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha demonstrou todo o seu distúrbio psiquiátrico. Ele, que foi o presidente mais corrupto da história da citada casa, saiu se fazendo de santo e afirmando ser perseguido devido seu papel no processo de impeachment da presidente Dilma. A verdade é que ele tenta, com a renúncia, salvar o seu mandato de deputado para não perder o foro privilegiado. A imprensa especula que tudo foi acertado com o usurpador Temer na reunião macabra da última semana. Até quando? Acorda, Brasil!

*Arruda Bastos é médico, professor universitário, ex-Secretário da Saúde do Estado do Ceará e um dos coordenadores do Movimento Médicos pela Democracia.

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