Gabriel García Márquez, o primeiro Nobel a defender a paz na Colômbia
Ele sonhou com o fim da “solidão da América Latina” e empenhou sua vida e sua obra a denunciar a guerra em seu país e as injustiças em decorrência dela. Ao receber o Prêmio Nobel de Literatura em 1982, expôs ao mundo um continente dilacerado por décadas de ditaduras e conflitos e ousou desejar às “raças condenadas a cem anos de solidão, uma segunda oportunidade sobre a terra”.
Por Mariana Serafini
Publicado 07/10/2016 18:33
Gabriel Garcia Marques, com toda sua genialidade, pavimentou este caminho que os colombianos percorrem hoje rumo a paz sólida e duradoura. Não foi à toa que Timoleón Jiménez, comandante em chefe das Farc, citou seu Cem Anos de Solidão ao encerrar seu discurso no ato de assinatura do Acordo de Paz para anunciar que o fim do conflito estava próximo.
“O amor de Maurício Babilônia por Meme poderá ser agora eterno e as borboletas que voavam livres atrás dele, simbolizando seu infinito amor, poderão agora se multiplicar pelos séculos cobrindo a pátria de esperança. Bem vinda a segunda oportunidade sobre a terra”, disse o Timochenko.
Santos e Gabo, o Nobel da Paz e o Nobel de Literatura
O acordo de paz assinado pelo presidente Juan Manuel Santos, laureado nesta sexta-feira (7) com o Nobel da Paz, e por Timoleón Jimenez, busca dar aos colombianos a sonhada segunda oportunidade sobre a terra de Gabo.
Diferente de seu coronel Aureliano Buendia que lutou e perdeu 32 guerras, agora os colombianos podem sonhar com o fim deste conflito interminável que já causou mais de 220 mil mortes, deixou milhões de desalojados e tem, atualmente, mais de 9 mil presos políticos.
Dos Cem Anos de Solidão à Notícia de Um Sequestro
Gabo foi além da fantástica chuva de flores que fizeram um tapete pelas ruas de Macondo depois da morte de José Arcádio Buendia e empenhou seus esforços para denunciar a realidade em uma das mais importantes obras do jornalismo mundial: Notícia de Um Sequestro.
O livro-reportagem que relata a história das vítimas do Cartel de Medellín, liderado por Pablo Escobar, completou 20 anos este mês. Uma das mais notáveis reféns deste crime, Maruja Pachón, falou recentemente à Folha de S. Paulo sobre suas expectativas com o acordo de paz. Ela votou “sim”, disse estar otimista e garantiu: “Gabo queria isso também”.
Não apenas queria, como empenhou até os últimos dias de sua vida a construir a liberdade da “América Latina, esse reino sem fronteiras de homens alucinados e mulheres históricas, cuja infinita obstinação se confunde com a lenda”.