Associação dos Funcionários do BNDES lamenta morte de Carlos Lessa

Em nota, o presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES), Arthur Koblitz, registra que a morte de Carlos Lessa, que foi presidente do banco de fomento, foi uma grande perda para o Brasil.

Segundo ele, Lessa foi de uma geração que testemunhou, soube reconhecer e se esforçou para entender o arranque do desenvolvimento brasileiro nos anos de 1950.

Leia a íntegra:

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NOTA DE PESAR: AFBNDES lamenta morte do professor Carlos Lessa

Carlos Lessa foi presidente do BNDES por pouco tempo, de janeiro de 2003 a novembro de 2004. Foi o primeiro presidente do Banco do governo Lula. Como presidente do BNDES, foi controverso. Teve sérias dificuldades com o resto da equipe econômica, formada por Pallocci na Fazenda, Henrique Meirelles no Banco Central e Furlan no Ministério do Desenvolvimento.

Internamente, é criticado mesmo por admiradores como gestor. Resolveu bater de frente com a burocracia que comandou o Banco no período FHC, muitos argumentam que de forma injusta, nem sempre democrática. Mas entre seus acertos — que grandes acertos — estão, por exemplo, o lançamento das bases de um dos programas que mais orgulham os empregados do BNDES, a atuação na área de saúde, nas cadeias produtivas do setor de fármacos.

No BNDES ainda, teve sua primeira passagem nos anos 1980 (1985-89), sendo responsável pela gestão e execução das primeiras operações com recursos do Finsocial. O “S” sendo posto em prática e criando uma expertise setorial não existente no país até então.

Enquanto presidente, foram também suas a decisão de manter a maioria acionária da Vale nas mãos de nacionais — o que explica parte dos grandes problemas com o resto do governo — e o incentivo que deu para que o Banco se envolvesse nos esforços de integração da América do Sul. Entre os empregados é lembrado muito o “curso de formação” que organizou na Casa. O Banco ideal de Lessa estaria voltado para grandes projetos que poderiam mudar o país, a burocracia do BNDES deveria estar engajada nesses projetos.

Um orador excepcional, Lessa foi professor da UFRJ durante um período em que formou uma legião de alunos e admiradores. Ele foi autor de um dos maiores clássicos da economia política brasileira, “15 anos de política econômica”. Uma interpretação e análise do funcionamento na prática do Plano de Metas do governo Juscelino Kubitschek.

O Plano foi responsável pelo primeiro verdadeiro arranque da economia brasileira na modernidade industrial. Sobre o papel do BNDES, escreveu Lessa: “Preencheu, assim, o BNDE, de forma não declarada, a função de centro de análise de programas governamentais, constituindo-se, por mais esta razão, na peça básica da filosofia do Plano de Metas”.

Ele era acima de tudo um apaixonado pelo Rio de Janeiro, pelo Brasil e pela América Latina. Organizador da “Enciclopédia da Brasilidade”, um patriota – a vida de Lessa ensina – não pode ser uma fixação vazia pela bandeira nacional ou pela camisa da seleção brasileira. Muito menos por um respeito temeroso ou acrítico da história desse país.

Em suma, não é como ser fã de um time de futebol. Patriotismo é algo mais profundo, que exige uma busca por conhecimento sobre a história e da cultura, popular e erudita de um país. Exige também generosidade; ser patriota no Brasil é sonhar e lutar por um futuro coletivo melhor. Não é apenas sonhar com um país mais justo, mas com uma economia mais produtiva, mais eficiente.

Carlos Lessa foi de uma geração que testemunhou, soube reconhecer e se esforçou para entender o arranque do desenvolvimento brasileiro nos anos de 1950. Sofreu com o retrocesso da ditadura e nutria, como muitos, esperança de que com a superação do regime militar retomaríamos o rumo do desenvolvimento, com inclusão social, ou, como ele preferia dizer, com “cidadania” (com significado mais amplo).

Entre seus últimos trabalhos intelectuais, um profícuo debate sobre a questão da falta de autoestima do brasileiro. Vamos precisar ler e reler Lessa para conseguirmos manter nossa autoestima depois do mergulho recente que demos no obscurantismo, nas trevas.

Arthur Koblitz é presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES).