A esquerda bem informada
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Transferência de renda reduz desigualdades, mas tributos anulam benefícios

Segundo Theo Ribas Palomo, é preciso aumentar a incidência dos impostos sobre a população mais rica e reduzir tributos sobre o consumo

(Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

Para redistribuir renda, o Estado brasileiro adota algumas estratégias como Previdência e assistências sociais e outros tipos de auxílio. O histórico dessas políticas ao longo do século 21, bem como seus impactos positivos e negativos, são tema de um estudo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP.

Para traçar um panorama sobre a redistribuição de renda, Theo Ribas Palomo, pesquisador do Made e um dos autores do artigo, explica que a renda inicial, aquela que os indivíduos conseguem no mercado de trabalho, se alterou pouco ao longo do tempo. “Em todos esses 20 anos, a desigualdade brasileira do mercado de trabalho continua muito alta e relativamente constante”, afirma.

“‘É na alteração do perfil regressivo do sistema tributário nacional que reside as maiores possibilidades para elevar a capacidade redistributiva do Estado brasileiro. E, como se verificou, não ocorreram grandes alterações desse perfil concentrador da tributação no século XXI, refletindo os grandes obstáculos que envolvem uma melhora redistributiva via tributação no país”, defende o artigo do Made.

Segundo Palomo, programas de transferência de renda como o Bolsa Família tiveram papel central na redução das desigualdades. Por outro lado, os tributos diretos, que incidem na renda e no patrimônio, como o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), tiveram um impacto praticamente nulo.

“A desigualdade de riqueza é muito maior que a desigualdade de renda”, explica o pesquisador. “Quando a gente tem tributos que taxam a riqueza e não reduzem a desigualdade, quer dizer que há um grande problema no desenho desses tributos”, acrescenta.

Estudos que associaram as informações das pesquisas domiciliares com os registros fiscais apontaram para a estabilidade da desigualdade no período recente, grandemente ligada à resiliência da participação na renda dos muito ricos – 5% e 1% do topo, diz o estudo. “Além disso, como resultado desses ajustes a partir dos registros do IRPF, a desigualdade observada é, na realidade, muito mais expressiva que a identificada nas pesquisas domiciliares, explicitando mais uma vez o peso que os mais ricos têm sobre o nível da desigualdade no país”, afirma o texto.

Já os tributos indiretos, que incidem sobre o consumo, afetam principalmente as famílias mais pobres. O saldo final é negativo, pois os poucos benefícios dos tributos diretos não equilibram os prejuízos dos indiretos. “A tributação brasileira consegue aumentar uma desigualdade que já é muito alta e alarmante”, afirma Palomo.

Reforma tributária

Segundo o pesquisador, uma reforma tributária precisa ser pensada no sentido amplo, de “quais são as consequências de cada medida e cada ponto da reforma sobre a desigualdade de renda no País”.

Os tributos indiretos, que incidem sobre o consumo, afetam principalmente as famílias mais pobres – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Esse cenário, de acordo com Palomo, pode ser alterado pela elevação progressiva do peso dos tributos diretos. Uma possibilidade, por exemplo, é aumentar a incidência do imposto de renda sobre a camada mais rica da sociedade, que, com manobras e isenções, paga uma alíquota menor que o resto da população. Também é necessário focar uma reforma da tributação indireta para “reduzir o peso desses tributos na população mais pobre”.

Dessa forma, o estudo defende a progressividade dos tributos diretos incidentes sobre a renda e o patrimônio, bem como a elevação de sua incidência sobre a renda dos mais ricos são para reduzir expressivamente a desigualdade de renda. No entanto, em relação aos impostos indiretos foi observado que as medidas de isenção ou desoneração de produtos essenciais para beneficiar as populações de baixa renda não alteram de forma substancial a regressividade desses tributos.

O estudo defende que, para esse resultado substancial, seriam necessárias reformas para simplificar e reduzir o peso da tributação indireta, pelas reduções de alíquotas e mudança de seu funcionamento para um imposto de valor agregado. Também defende elevação da progressividade da tributação direta, “uma vez que a literatura econômica passou a considerar cada vez mais o combate à desigualdade e a progressividade na tributação como elementos centrais para o desenvolvimento econômico”.

No âmbito dos programas de transferência de renda, o pesquisador afirma que há espaço para melhorias. Ele lamenta a extinção do programa Bolsa Família, que, segundo ele, era muito bem desenhado, apesar de não significar uma fonte de renda tão grande para as famílias mais pobres.

Para conferir o estudo do Made na íntegra, basta acessar o link www.madeusp.com.br ou clicar aqui.

Edição de entrevista à Rádio USP

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