Sob pressão, Bolsonaro constrange família de petista assassinado

Reação destemperada e insensível de Bolsonaro – que nem sequer se solidarizou com a viúva – foi criticada até por integrantes da base governista

O desgaste sofrido por Jair Bolsonaro após o assassinato do guarda municipal e militante do PT Marcelo Aloizio de Arruda, no domingo (10), em Foz do Iguaçu (PR), levou o presidente a apelar para ações marqueteiras e desesperadas. Marcelo foi morto por um bolsonarista, o policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho, que invadiu a festa de aniversário do petista e o baleou.

A reação destemperada e insensível de Bolsonaro – que nem sequer se solidarizou com a viúva, Pâmela Suellen Silva – foi criticada até por integrantes da base governista. Agora, sob pressão para conter o desgaste e o isolamento, o presidente chegou a divulgar um vídeo de 13 minutos da conversa que teve nesta terça-feira (12) com Zé Arruda e Luís Arruda, irmãos de Marcelo. Os dois são apoiadores de Bolsonaro.

Embora nenhum deles estivesse presente à festa de aniversário de Marcelo, Bolsonaro chegou a sugerir que os irmãos fossem a Brasília para dar uma entrevista coletiva e “mostrar o que aconteceu”. Mais uma vez, o presidente não manifestou pesar à família de Marcelo – apenas a constrangeu com sua encenação.

Pâmela, a viúva, classificou o disparate de Bolsonaro como “um absurdo”. Para Luziana, irmã de Marcelo, a divulgação do vídeo “foi um choque”. Leonardo, filho do petista, acrescentou: “O ódio não está em mim, na nossa família. A gente estava comemorando. Não foi a gente que procurou isso. Não foi a gente que matou. A gente não odeia ninguém.”

A equipe da pré-campanha de Bolsonaro à reeleição já identificou que o caso prejudicou ainda mais sua imagem. O crime ocorreu a 84 dias do primeiro turno, num momento em que o presidente tentava reduzir a rejeição a seu governo e melhorar nas pesquisas de intenção de voto. O discurso pró-armas é um dos pilares do bolsonarismo que mais perdem força em decorrência do episódio.

Conforme revelou a Folha de S.Paulo, “integrantes da campanha tentaram fazer com o que o presidente se antecipasse à vinculação do episódio com a sua militância e se pronunciasse sobre o crime na manhã de domingo”. Além disso, “a ala política do governo e correligionários do centrão chegaram a pedir, sob reserva, um posicionamento mais firme” de Bolsonaro, “com recados para uma pacificação”.

Porém, no lugar de um gesto nessa direção, o presidente continuou a associar a esquerda à violência política, ignorando que a vítima era de esquerda, e o assassino, de extrema-direita. Outras mortes recentes de cunho político, como a da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) e a do capoeirista Moa do Katendê, evidenciam a falácia desse discurso de Bolsonaro.

Aliados do presidente consideram que a “frieza de Bolsonaro”, somada à falta de empatia com a viúva de Marcelo, pode bloquear de vez as possibilidades de diálogo com o eleitorado feminino. Segundo esses mesmos aliados, a situação tem potencial para comover não apenas eleitores de Lula – mas também antipetistas que ainda resistem a votar em Bolsonaro.

“As pessoas decidem o voto pela emoção. E a reação dele (Bolsonaro) foi muito fria – não houve nenhum tom de lamento”, resumiu um aliado bolsonarista, citado pelo Valor Econômico. “Não adianta nada pregar para convertidos. Esses votos ele já tem.”

Para o advogado Emilio Peluso Meyer, membro do Comitê Executivo do Demos e professor de Direito Constitucional da UFMG, é possível atribuir a Bolsonaro uma “responsabilização moral” pelo assassinato. Em entrevista à DW Brasil, Meyer lembrou que o presidente “de fato inflama os apoiadores dele a colocarem em prática a eliminação do opositor político”.

“O bolsonarismo, como movimento político, normalmente acusa os opositores de práticas que ele mesmo costuma empreender. Esse é um ponto fundamental”, diz o advogado. “O que o presidente deseja é a convulsão social, que ele seja justificado a tomar uma decisão drástica porque ele não tem controle do que tem acontecido no País. A consequência de fatos como esse (o assassinato do petista) é que há um cenário político muito mais inflamado, que pode pressionar ou criar as condições para que o presidente tome uma decisão de levar a uma ruptura institucional.”

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