Direita francesa vota contra aposentadoria. Greves continuam

Maioria conservadora no Senado ignorou protestos de milhões de franceses e votaram para fazê-los trabalhar mais. Votação ainda não foi concluída e greves continuam

Mesmo com o frio intenso e a chuva, Toulouse passou o 8 de março com as ruas lotadas contra a reforma da previdência.

O simbólico Artigo 7 da Reforma Previdenciária de Emmanuel Macron foi amplamente aprovado no Senado, durante a noite de quarta para esta quinta-feira, pelos republicanos, a União Centrista, os independentes e o grupo macronista. O artigo aumenta a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos e também obriga pagar o benefício por mais tempo.

“Estou muito feliz que os debates tenham permitido chegar a esta votação”, reagiu a primeira-ministra da França, Elisabeth Borne, apesar do sentimento de apreensão diante da reprovação da maioria dos trabalhadores franceses, que continuam nas ruas e em greve. Os sindicalistas prometem mobilizações ainda maiores no sábado (11) e no dia 15 (quarta-feira), dia da junta mista, momento importante do calendário parlamentar.

Os protestos de agora, certamente, vão se refletir nas próximas eleições contra os partidos alinhados ao governo Macron. Mas podem gerar outras consequências: “O silêncio do Presidente da República constitui um grave problema democrático que conduz inevitavelmente a uma situação que pode tornar-se explosiva”, diz a Confederação Geral do Trabalho, maior sindicato do país. A CGT fala em 3,5 milhões de manifestantes nas ruas, mesmo com as chuvas e frio intenso.

Divulgação da CGT

Tramitação turbulenta

Divulgação da CGT

Foram necessárias quinze horas de debate e sessões tumultuadas por obstruções da esquerda para que o Senado aprovasse em primeira leitura, às 24h10 da madrugada de quarta-feira, 8 de março, para quinta-feira, 9 de março, o artigo 7.º da reforma das pensões. O cerne da proposta de lei que altera o financiamento da segurança social, que prevê o aumento da idade legal de reforma de 62 para 64 anos e a extensão do período contributivo, foi amplamente votado pelos Republicanos (LR), pela União centrista, pelos Independentes e o grupo macronista, com 201 votos a favor, 115 contra e 29 abstenções .

O ministro do Trabalho, Olivier Dussopt, também saudou com rugas na testa o “voto de responsabilidade do Senado, que escolheu seguir o governo”. O governo perde cada vez mais aprovação na sociedade pela mobilização sindical que não esmorece, além da votação estar longe de terminar. 

O projeto de reforma continua em busca de maioria segura na Assembleia Nacional, onde os deputados não conseguiram ultrapassar o limiar do artigo 3º sobre as alternativas de financiamento da reforma. Dussopt expressou seu desejo de que “todos os artigos do texto sejam debatidos e aprovados ” no prazo de revisão do Senado, que é domingo, 12 de março à meia-noite. Para entrar em vigor, a reforma precisa passar pelas duas Casas do Parlamento até o próximo dia 26.

A manobra de obstrução foi usada com sucesso pelos deputados da oposição na Assembleia Nacional —o artigo não chegou a ser avaliado por falta de tempo hábil.

Divulgação CGT

Preço alto a pagar

Divulgação CGT

O desprezo do governo pela opinião pública terá um custo alto para Macron, seu partido e aliados. A votação enfrentou as imagens de ruas apinhadas de manifestantes, com distúrbios de confronto entre manifestantes e policiais em cidades maiores. Foram paralisados transportes rodoviários, sobre trilhos, fluviais, marinhos e aéreos por efeito de bloqueios e piquetes de trabalhadores. Repartições públicas, escolas e universidades foram fechadas, assim como as ruas estão lotadas de lixo sem coleta. Refinarias de combustíveis também sofrem bloqueios de trabalhadores e de caminhoneiros, o que reduziu o fornecimento da gasolina nas cidades. 

O bloqueio persiste ainda nos quatro terminais de GNL (gás natural liquefeito) e nos depósitos de gás, informou Fabrice Coudour, do CGT (Confederação Geral do Trabalho, maior sindicato da França). “Isso vai continuar nos próximos dias, porque o objetivo é pressionar”, disse ele.

O 8 de março acrescentou uma camada feminista aos protestos. Com salários 25% menores que os dos homens, trabalho de meio período prejudicado, carreiras instáveis, teto de vidro imposto, o impacto de um aumento de dois anos na idade legal de aposentadoria seria ainda mais pesado para as mulheres.

As mulheres já recebem pensões 40% menores que as dos homens. 4 em cada 10 mulheres aposentam-se com uma pensão incompleta, o que significa que têm duas vezes mais probabilidade de sofrer uma redução da sua pensão ou de trabalhar até aos 67 anos.

As manifestações começaram na segunda quinzena de janeiro e prosseguiram. A expectativa do governo era que a pressão dos protestos arrefecesse com o tempo, mas esta semana, o país viu quase dois milhões de franceses nas ruas. Pesquisas de opinião também apontam amplo apoio ao movimento sindical contra a reforma.

Manifestações em Paris, Toulousse, Montpellier, Marselha, Nantes, Dijon, Lyon, entre outras localidades