Lula destaca Foro de São Paulo como espaço de luta pela democracia

“A gente queria que a esquerda da América Latina voltasse a conversar entre si e voltasse a disputar os espaços democráticos”, disse o presidente sobre a origem da organização

Lula na abertura do Foro de São Paulo (Fotos: Valter Campanato/Agência Brasil)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quinta-feira (29) à noite, em Brasília, durante a abertura do 26º encontro do Foro de São Paulo, que o espaço de diálogo surgiu para que os partidos de esquerda pudessem, por meio da organização dos trabalhadores e do povo em geral, chegar ao poder pela via democrática.

O Foro reúne na capital federal 150 delegações de partidos de esquerda e movimento social de 27 países da América Latina e Caribe. Participam representantes da Argentina, Uruguai, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Venezuela, Cuba, Panamá, República Dominicana, El Salvador e Nicarágua.

Também estão representados países como Alemanha, Arábia Saudita, Belarus, China, Espanha, França, Irã, Rússia e Turquia.

De acordo com o presidente, antes do Foro, existiam muitas organizações de esquerda na América Latina que lutavam pela revolução.

Depois das eleições presidenciais de 1989, junto com fundador do PT Marco Aurélio Garcia, homenageado do evento, Lula contou que se reuniu, em Cuba, com Fidel Castro para debater a possibilidade de reunir as forças progressistas da região.

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“A gente queria que a esquerda da América Latina voltasse a conversar entre si e voltasse a disputar os espaços democráticos existentes no seu país”, lembrou o presidente.

A partir dessa conversa, surgiu a ideia da realização do 1º Foro de São Paulo, em 4 de julho de 1990, que recebeu o nome em alusão à sede do seu primeiro encontro.

O presidente considerou o resultado da eleição presidencial de 1989, quando disputou contra figuras expressivas da política nacional, como um exemplo de que era possível mudar realidade política na região.

“Eu imaginava que a gente não teria nenhuma chance de disputar aquela eleição. E aconteceu uma supressa: eu fui para o segundo turno e, pela primeira vez, um operário metalúrgico de um partido de esquerda no Brasil, que tinha como aliado apenas o PCdoB, conseguimos 47% dos votos e quase ganhamos as eleições”, discursou.

Respostas aos fascistas

Ao esclarecer a gênese política da organização, Lula respondeu as críticas: “Vocês sabem quantas vezes nós somos acusados. Vocês sabem quanta difamação e quantos ataques pejorativos se faz contra a esquerda na América do Sul. Nós não somos vistos pela extrema direita fascista, nem do Brasil, nem do mundo, como organizações democráticas. Eles nos tratam como se nós fôssemos terroristas. Eles nos acusam de comunistas, como se nós ficássemos ofendidos com isso.”

“Nós ficaríamos ofendidos se nos chamasse de nazista, neofascista, de terrorista. Mas, de comunista, de socialista, nunca. Isso não nos ofende. Isso nos orgulha muitas vezes. E, muitas vezes, nós sabemos que merecemos isso”, completou.

O presidente conclamou os participantes a lutar para acabar com a desigualdade no mundo.

“Não é possível a gente continuar com essa desigualdade na comida, no salário, na educação, na moradia. Com a desigualdade de gênero, racial. Todo santo dia a gente vê aumentar a quantidade de pobres no planeta. Crianças morrem de fome enquanto os ricos pagam passagem de foguete para procurar o novo mundo, enquanto o mundo deles é esse”, disse.

No caso brasileiro, Lula disse que os setores progressistas e de centro aprenderam o que significa ser governado pela extrema direita.

“Quatro anos da extrema direita neste país foi uma lição para todos nós. Ou nós nos organizamos para resolver os problemas da sociedade brasileira, sobretudo a questão da inclusão social, ou a extrema direita está aí, contando mentiras, utilizando fake news, violentando qualquer parâmetro de dignidade para voltar ao poder”, alertou.

Lula ainda defendeu o fortalecimento de organizações que lutam para um mundo multipolar como os Brics, Unasul e Celac. Também propôs mudanças no Conselho de Segurança da ONU.

Lula e Luciana Santos durante a abertura do Foro de São São Paulo

Vitórias

A presidente nacional do PCdoB, Luciana Santos, que é ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, fez um apanhado da luta dos partidos e movimentos sociais que compõem o Foro desde seu surgimento, quando a América Latina saia de ditaduras militares.  

No atual contexto, ela destacou a vitória eleitoral de Lula, no Brasil, e de Gustavo Petro, na Colômbia, como dois fatos importantes para o movimento.

“Animam e mobilizam o conjunto de partidos e movimentos desse Foro a construírem novamente uma agenda comum, que possa impactar na diminuição da desigualdade, da fome, da desindustrialização e fazer avançar projetos de integração, na infraestrutura e logística, na educação, saúde e segurança dos países e da região como um todo”, observou.

Contudo, ela alertou para um contexto internacional conturbado e conflitivo, com tensões e múltiplas crises, entre elas os impactos do pós-pandemia e as consequências da guerra na Ucrânia.

“Esse quadro influencia na atividade econômica em nossos países. Os desdobramentos desta prolongada crise no centro do capitalismo têm resultado em fenômenos políticos e sociais graves como é o já mencionado surgimento de forças de extrema direita, que continuam ganhando espaço no ambiente político europeu”, considerou.

Na mesma linha, a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que as ideias atrasadas e antipopulares do neoliberalismo continuaram ameaçando a região.

“Mas hoje elas se impõem ou tentam se impor aliadas a movimentos de extrema direita, que por sua vez ameaçam a própria ideia de democracia que nos une. Aqui no Brasil, sentimos na pele o que são capazes de fazer para demolir a ordem constitucional e democrática, destruir direitos individuais e coletivos, atacar pessoas e instituições”, afirmou.

Integração

Durante a abertura, o secretário de Relações Internacionais do governo de Cuba, Emílio Lozada, defendeu a retomada e o fortalecimento da integração no continente.

“Sem articular adequadamente a necessária unidade dos nossos povos, das forças de esquerda e dos movimentos progressistas, não poderemos enfrentar, como região, os colossais desafios do mundo contemporâneo”, disse.

O representante da Frente Ampla do Uruguai, Rony Corbo Alvarez, afirmou que é necessária uma integração soberana, que “meça os tempos de forma diferenciada, como são diferentes os países”.

“Precisamos defender a democracia, e defendê-la sempre, aprofundá-la mais para que os nossos povos sejam os verdadeiros protagonistas dessa construção democrática e integradora”, defendeu.

Rodrigo Andres Alvarez, do Partido União Patriótica da Coalizão Pacto Histórico da Colômbia, destacou a importância dos movimentos populares para a recuperação e fortalecimento da democracia. Ele citou como exemplo a situação vivida pelo Peru.

“Hoje, aqui, nessa mesa, diante de vocês, eu quero pedir que vocês mandem um abraço ao povo peruano, que está resistindo ao golpismo, está resistindo à repressão”, discursou.

Ele também ressaltou que as recentes eleições de governos progressistas no continente, como a de Lula e Petro, permitiram reconstruir uma nova união desse campo político.

A mesa de abertura foi coordenada pela secretária-executiva do Foro de São Paulo, Mônica Valente. Participaram ainda o secretário de Relações Internacionais do PT, Romênio Pereira, a secretária de Relações Internacionais do PCdoB, Ana Prestes, o presidente da Fundação Perseu Abramo, Paulo Okamoto, e o presidente da Fundação Maurício Grabois, Adalberto Monteiro.

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