Eleição em Taiwan: EUA fazem jogo duplo com a China

Governo Chinês classificou comunicado de Blinken como “um sinal gravemente equivocado” aos separatistas de Taiwan. Secretário norte-americano de Estado mandou mensagem a Lai Ching-te parabenizando-o pela vitória. China reafirma que Taiwan é território chinês

Parte do eleitorado norte-americano caiu no conto de que a China é a responsável pela queda dos empregos e das condições de trabalho em diversos setores econômicos dos Estados Unidos. O ex-presidente Donald Trump, do Partido Republicano, tentou capitalizar esse sentimento em seu favor ao pregar a estratégia “America first”, especialmente na política externa. Na pandemia de Covid-19, provocativamente, ele chamava o novo coronavírus de “o vírus chinês”.

No entanto, ao deixar a Casa Branca, Trump entregou um país com menos empregos do que na época de sua posse – caso único na história dos Estados Unidos. Sua negligência no combate à crise sanitária também cobrou um preço alto. Com pouco mais de 4% da população mundial, o país respondeu por 17% das mortes por Covid no Planeta.

Joe Biden derrotou Trump nas eleições de 2020 e, uma vez na presidência, efetivamente aboliu o negacionismo no enfrentamento à pandemia. Mas as provocações à China não cessaram. O atual presidente não chega a ser tão agressivo quanto seu antecessor. Tampouco, porém, tem a sutileza do casal Obama, que chegou a produzir um documentário faccioso, Indústria Americana (2019), para insinuar que os EUA são uma espécie de farol do sindicalismo em contraponto à cultura chinesa.

Ao mesmo tempo, essas longevas hostilidades estadunidenses acabaram por fortalecer os vínculos políticos, econômicos, diplomáticos e militares entre China e Rússia, consolidando um mundo mais multipolar, em que a dependência dos Estados Unidos cai década após década. Em que medida Biden se beneficia de ser o presidente ligado ao Partido Democrata que mais agride os chineses – e que, volta e meia, se vê igualmente forçado a lançar gestos de distensão?

Esse “morde e assopra” teve um novo capítulo no sábado (13), com a eleição presidencial na “província rebelde” de Taiwan, considerada pelo governo chinês como parte inalienável de seu território. O atual vice-presidente, Lai Ching-te, foi eleito com um discurso de confronto. Seu partido, no poder desde 2016, é contrário à unificação entre os dois países. Após a proclamação dos resultados, Lai disse que sua prioridade será “proteger Taiwan das ameaças e da intimidação da China”

Era esperado que o presidenciável utilizasse essa retórica de guerra. Pequim, da mesma maneira, reiterou sua posição histórica e oficial. “Taiwan nunca foi um país. Não foi no passado e certamente não será no futuro”, disse o chanceler chinês, Wang Yi. Segundo o ministro, “se alguém na ilha de Taiwan pensa em buscar a independência, estará tentando dividir o território da China e com certeza será duramente punido tanto pela história quanto pela lei”.

Embora os EUA tenham se comprometido a manter apenas laços extraoficiais com Taiwan, o secretário norte-americano de Estado, o sempre polêmico Antony Blinken, fez questão de mandar uma mensagem a Lai Ching-te para parabenizá-lo pela vitória eleitoral. “Esperamos trabalhar com Lai e com os líderes de Taiwan de todos os partidos para promover nossos interesses e valores partilhados”, registrou, na mensagem, o braço direito de Biden.

Pequim não passou recibo e apresentou uma queixa diplomática formal. O Ministério dos Negócios Estrangeiros da China classificou o comunicado de Blinken como “um sinal gravemente equivocado” aos separatistas de Taiwan. “A China se opõe firmemente a que os EUA tenham qualquer forma de interação oficial com Taiwan e interfiram nos assuntos de Taiwan de qualquer forma ou sob qualquer pretexto, disse a pasta. A província rebelde – agregou o ministério – é “a primeira linha vermelha que não deve ser ultrapassada nas relações China-EUA”.

O jogo duplo ficou tão constrangedor que Biden, ainda no sábado, foi questionado pela imprensa sobre a posição da Casa Branca em relação à Taiwan. “Não apoiamos a independência”, respondeu o presidente de modo lacônico, mas reiterando a defesa de “uma só China”. Em ano eleitoral, faltando menos de dez meses para um provável novo confronto entre Biden e Trump, o Partido Democrata parece não ter clareza dos rumos a seguir.

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