Izolda Cela: “A escola precisa se qualificar”
Fortalecer as relações com os municípios e investir no ensino profissionalizante. Estes são os principais planos da nova secretária de Educação Básica do Estado do Ceará (Seduc), Izolda Cela de Arruda Coelho, psicóloga com especialização em estudos de ges
Publicado 06/01/2007 19:28 | Editado 04/03/2020 16:37
O Ceará conseguiu elevar o número de alunos matriculados no Ensino Fundamental. No entanto, avaliações nacionais e locais trouxeram à tona a questão da falta de qualidade no ensino ofertado pela escola pública. A senhora tem algum projeto para enfrentar este grave problema?
Os planos de trabalho ainda estão sendo formulados. O que temos são diretrizes de governo, referenciais importantes como o fortalecimento da relação com os municípios. Hoje, o Ceará possui elevado percentual de municipalização das séries iniciais do Ensino Fundamental. Essas séries têm a tarefa de dar conta do processo de alfabetização. Avaliações nacionais, assim como as estaduais, mostram que as crianças não estão se alfabetizando. O analfabetismo escolar gera uma série de outras mazelas e está relacionado com os índices de abandono, a distorção idade/série e aos baixíssimos níveis de proficiência.
O Brasil tem o desafio de elevar o número de alunos no Ensino Médio. Como o Ceará está se preparando para encarar este desafio?
Existe uma meta na Seduc: a universalização do Ensino Médio, por isso destaco o fortalecimento com os municípios, porque precisamos nos voltar para um trabalho de base também. Isto é, de correção das etapas iniciais para que possa repercutir no Ensino Médio.
A correção é importante porque existe a questão do próprio analfabetismo funcional, que veio à tona através de exames que serviram para denunciar o baixo rendimento dos alunos em disciplinas como português e matemática. Como esse aluno vai conseguir recuperar a aprendizagem para ingressar no Ensino Médio?
Esses dados muito comprometidos são verificados na quarta e oitava séries do Ensino Fundamental e, na terceira série do Ensino Médio. Todos os finais de ciclos revelam uma situação bastante comprometida no que diz respeito à aprendizagem.
A que a senhora atribui o fraco desempenho desses alunos? Além do mais há um outro agravante, a falta de acesso às tecnologias de comunicação e informação gerando um outro tipo de analfabetismo, o digital?
De maneira geral, a maioria dos alunos que estão na escola pública tem condição de vida, social e econômica que não favorece muito. Sabe-se que níveis acentuados de pobreza geram desestruturação na família e isso repercute no desempenho escolar. A escola precisa se qualificar para saber lidar com essas questões. Pela minha experiência, vejo que existe uma cultura de normalizar esses resultados ruins da escola pública pela sociedade.
A senhora poderia explicar como isso acontece?
É como se fosse normal a criança da escola pública não ter muito conhecimento. E isso é muito grave, porque existe uma certa passividade de como essa realidade é recebida pelas pessoas. Esse comportamento é sinal de uma determinada cultura de normalização do fracasso escolar. A evasão escolar no Ensino Fundamental chega a 12%.
Como a senhora analisa a escola tradicional diante da realidade dos jovens atuais, marcada pelos apelos visuais e excesso de informação proporcionado pela Internet e pela televisão?
A escola, de maneira geral, incluindo as privadas, ainda não acompanha esse ritmo acelerado desse tipo de estímulo que os meninos têm hoje e que foi possibilitado pelas tecnologias.
A senhora acha que escola ainda está utilizando só quadro e pincel ?
Sim. Acho que nessa relação de professor e alunos dentro de uma sala de aula apenas com livros na mão e bons projetos de estudo, muita coisa boa pode acontecer, independente do uso de tecnologias. Não estou dizendo que elas não são importantes. Acho que o computador é hoje um instrumento essencial na escola pública ou privada.
Com relação aos protestos dos professores, como a senhora analisa a postura de endurecimento da categoria e reivindicar seus direitos realizando greves. Na sua opinião, as greves comprometem o aprendizado das crianças?
A greve é um instrumento utilizado pela categoria como forma de reivindicação. Entretanto, considero que o prejuízo é praticamente irrecuperável para as crianças e os jovens. Penso que os professores também concordam com isso. Será muito bom que a gente possa estabelecer diálogos permanentes para que dentro do possível essas medidas sejam evitadas.
Quais as perspectivas da Seduc com o Fundeb?
É uma reformulação no sistema de financiamento que representa um anseio nacional. No primeiro momento, houve ênfase no Ensino Fundamental porque era necessário abrir as escolas para as crianças e jovens filhos dos trabalhadores deste País. Você imagina a matrícula de um município que cresce praticamente 100% ou até mais em três anos de gestão. Isso representa aumento de demanda, insumo e de infra-estrutura. Hoje, para que a gente possa falar mesmo em melhoria da escola, precisa ter um olhar mais forte para a Educação Infantil e o Ensino Médio.
Tanto a Educação Infantil quanto o Ensino Médio necessitam de maiores incentivos. Como está a situação hoje?
Os municípios ficam com a responsabilidade de atender a pré-escola e com muitas queixas de financiamentos, principalmente os menores. Cabe ao Estado, o Ensino Médio e, mesmo assim não tem uma base consolidada de orçamento. A distribuição do livro didático para o Ensino Médio está sendo feita. O Ministério da Educação (Mec) começou a distribuir no ano passado os livros de Português, Matemática e Biologia. E o Estado passou a oferecer a partir deste ano os livros das disciplinas de Física, Química, História e Geografia.
Outro problema verificado no Ensino Médio, em todo o País, é a carência de professores de Química, Física, Biologia e Matemática. Qual é a carência do Ceará?
No Brasil, faltam 250 mil professores para essas disciplinas e, no Ceará, 1.200. Por isso, os professores temporários continuam nessas áreas. O governador destaca a melhoria do ensino profissionalizante.
Mas o Ensino Médio não é voltado para a profissionalização. Como isso será feito?
Seria uma parceria com a Secretaria de Ciência e Tecnologia (Secitec) no âmbito das escolas de Ensino Médio do Estado.
EDUCAÇÃO EM NÚMEROS
694 escolas da rede pública de ensino do Estado do Ceará
711.195 alunos matriculados no ensino público estadual
21.554 professores lotados na rede pública do Estado
188.937 alunos matriculados no Ensino Fundamental
373.156 alunos matriculados no Ensino Médio
19,76 é o percentual de abandono de alunos no Ensino Médio no Estado
12 é o percentual de evasão escolar no Ensino Fundamental
1.200 é a carência de professores de Ciências Exatas do Ensino Médio
10,42 é o percentual de reprovação no Ensino Médio na rede estadual
Por Iracema sales, do Diário do Nordeste