Frente Popular do Acre: Um projeto para 20 anos
Logo após a primeira vitória do engenheiro florestal Jorge Viana para o governo do Acre, passou-se a difundir no meio da população acreana que o projeto de poder do PT e dos demais partidos da Frente Popular seria para 20 anos ou mais.
Publicado 14/07/2007 01:47 | Editado 04/03/2020 16:10
Um projeto para 20 anos
Leonildo Rosas
Logo após a primeira vitória do engenheiro florestal Jorge Viana para o governo do Acre, passou-se a difundir no meio da população acreana que o projeto de poder do PT e dos demais partidos da Frente Popular seria para 20 anos ou mais.
De forma conveniente, um grupo recém-guindado ao poder passou a acreditar nisso. Outro, mais presente nas discussões e nas decisões políticas, trabalha incansavelmente para que as duas dezenas no comando do Acre realmente se efetivem.
Olhando o cenário político atual, não é difícil acreditar que há possibilidade de o grupo que hoje administra o Estado e a maioria dos municípios se manter tanto tempo no poder. Basta guardar a coesão e impedir que as vaidades pessoais não sobreponham os interesses coletivos.
Essa projeção é fácil de ser defendida quando evocada a eleição do professor Binho Marques. A vitória de Marques pode ser considerada a prova de fogo dessa afirmativa. Tratava-se de um candidato que nunca fora testado nas urnas e tinha como missão enfrentar um processo eleitoral cuja missão seria garantir a continuidade do projeto iniciado com a eleição de Jorge Viana.
O governo de Binho Marques ainda está no início. Bem no início mesmo. Depois de um pit stop para o planejamento estratégico do mandato, somente agora ele pôs os carros na pista. Recentemente conseguiu aprovar a reforma administrativa desenhada por ele e sua equipe.
A expectativa do mandato é maior porque, além de adotar um estilo diferente do seu antecessor, Binho Marques fez uma declaração ousada: prometeu que, no fim do seu governo em dezembro de 2010, o Acre será o melhor lugar para se viver na Amazônia.
A afirmação poderá ser uma faca de dois gumes no processo eleitoral que irá decidir o sucessor de Marques. É mais ou menos como a história dos 40 mil empregos prometidos em 1998 e que até hoje serve para fortalecer o discurso da oposição.
Se Binho Marques executa seus projetos passo a passo, o mesmo não se pode dizer dos partidos políticos. Sua sucessão começou. E a disputa não está se dando no campo da oposição. Essa ainda se debate em busca de um candidato e de um projeto que possa confrontar o que ora está posto.
As disputas rumo a 2010 estão dentro da própria Frente Popular. Elas têm as eleições municipais do próximo ano como passo intermediário. A maioria dos partidos procura se fortalecer para poder pleitear maior espaço no campo de discussão da formação da chapa majoritária. A meta é eleger o maior número possível de prefeitos e vereadores. Política é força. E força eleitoral é poder.
Acompanho a política acreana de perto há um bom tempo. Os espaços dentro da coligação FPA não são conquistados na marra. É preciso construir base e ganhar confiança. A capacidade de renunciar em nome da unidade também conta ponto. Quase sempre quem força a situação acaba saindo derrotado.
Aos longos dos seus quase 18 anos de existência, a Frente Popular aumentou ou diminuiu o número de partidos conforme suas necessidades eleitorais. Já teve o PSDB como integrante de chapa majoritária. Os tucanos hoje estão na oposição. O núcleo decisório da aliança sempre se manteve coeso, pautado nas forças do PT, PC do B, PSB e, por último, o PMN.
Ocorre que as eleições de 2006 exigiram que uma nova estratégia fosse adotada. Jorge Viana estava no fim do seu segundo mandato. O senador Tião Viana não poderia concorrer ao governo. E a senadora Marina Silva declinou da missão de lançar candidatura para a sucessão de Viana.
A escolha recaiu sobre o nome do professor Binho Marques, técnico de capacidade reconhecida, porém, como fá foi dito, sem lastro eleitoral, que iria disputar contra um adversário carismático e testado nas urnas. Marcio Bittar ameaçava a continuidade do projeto de poder da FPA. E, mesmo sem contar com o apoio político e financeiro necessário, o pepessista assustou muito.
A fragilidade eleitoral de Binho Marques obrigou o núcleo político da Frente Popular a redesenhar todo o quadro. O candidato a vice-governador natural seria o deputado estadual Edvaldo Magalhães. Mas não foi.
O próprio Magalhães foi responsável por convidar o ex-prefeito de Cruzeiro do Sul César Messias (PP) para ser o companheiro de chapa de Binho Marques. A opção garantiria mais votos no Juruá e, consequentemente, o equilibro eleitoral necessário para garantir a vitória. O que de fato aconteceu.
Não dá para entrar no assunto César Messias sem voltar um pouco ao passado. Jorge Viana assumiu em janeiro de 1999 recebendo um Estado em total desgoverno. Ele acabara de suceder o empresário cruzeirense Orleir Messias Cameli, que saíra do governo com um Boeing abarrotado de acusações.
Cameli não foi o governador sonhado e prometido aos acreanos. Sua administração pode ser considerada desastrosa em praticamente todos os sentidos. A verdade é que ele não gostava do cargo e não o exercia para construir o bem coletivo.
Mas o ex-governador cumpriu um papel fundamental para ajudar as pretensões do PT e da Frente Popular de chegar ao poder. Ele poderia concorrer à reeleição. Alimentou essa possibilidade até o último minuto. Seria um candidato fortíssimo. Atraiu aliados para esse campo. O PMDB, principalmente, jogou-se de corpo e alma nessa possibilidade. A idéia seria garantir a reeleição de Flaviano Melo para o Senado. No último minuto, Cameli desistiu de concorrer a um segundo mandato. Vingou-se daqueles que tanto prejudicaram sua administração.
Órfãos de candidatos para concorrer ao governo, restou ao PMDB e aos demais partidos governistas procurarem alternativas de última hora. Os peemedebistas convenceram o então deputado federal Chicão Brígido a encarar a disputa. O PFL veio com Alércio Dias.
Com adversários tão fracos, não foi difícil para Jorge Viana chegar ao governo. Como também não foi para o médico Tião Viana ganhar a vaga do Senado.
Jorge Viana assumiu um Estado sucateado, com a estima dos acreanos no chão. Esse, ao contrário dos que muitos pensam, é o quadro ideal para quem pretende implantar um estilo centralizador e tocador de obras. Todo mundo ajuda e está disposto a aceitar o estilo adotado pelo condutor das ações.
E Viana administrou no seu estilo durante os oito anos em que esteve na função de governador. As pedras no caminho foram retiradas. A principal era os grupos de extermínios. Depois, com muita habilidade, conseguiu construir uma imagem melhor do Acre fora do Estado e do país, o que lhe conferiu uma aprovação de mais de 80% junto à população no seu último ano de mandato.
O retorno a 1998 serve para justificar o que vem a seguir. César Messias, que hoje é vice-governador, foi presidente da Assembléia Legislativa e secretário de Orleir Cameli. Os dois são primos.
Para chegar ao terceiro mandato, a Frente Popular trouxe para dentro do governo pessoas que praticamente saíram da política há pouco mais de oito anos. O ex-governador Cameli foi linha de frente da campanha de Binho Marques e Tião Viana no Juruá.
Quando se juntou aos antigos adversários, o que se percebe é que a Frente Popular não conseguiu passar sua mensagem para o conjunto da população. A impressão que se tem é de que o Governo da Floresta depende mais do carisma dos seus líderes do que de seu projeto calçado na proposta de um desenvolvimento sustentável e de amor pelo Acre.
Pelo que foi feito nos oito anos de administração Jorge Viana, não havia motivo para temer a derrota para Marcio Bittar ou qualquer outro candidato oposicionista. Não seria necessário atrair partidos como o PP e o PR, que começam a trazer problemas ao procurarem crescer de forma desordenada, assediando personagens que sempre estiveram em outros palanques para dento da coligação.
Ao longo desses anos todos, o PT e os demais partidos da Frente Popular têm obtido vitórias graças ao total descontrole e falta de projetos dos partidos oposicionistas, que não têm um discurso unificado nem um líder capaz de concentrar todos os interesses ao seu redor. O clima de oposição sempre esteve presente. E é forte.
Esse líder o PT tem. O PC do B, o PSB o PMN também têm. E, antes de qualquer análise apressada, sempre é bom lembrar que os acreanos não votaram somente porque aprovam o projeto da Frente Popular. Eles votam no carisma dos seus líderes, em particular de Jorge Viana. Como ele ainda pode concorrer novamente ao governo, é possível que os 20 anos de poder se concretizem. Antes, segundo a lógica, o próximo candidato será o senador Tião Viana.
A preocupação que acomete muitas pessoas é o que será necessário fazer para se chegar ao quarto ou quinto mandato. É esperar o que sairá das urnas em outubro de 2008. Mas o que se percebe hoje é que não será fácil escolher o candidato a vice-governador e os candidatos ao Senado. E, sem unidade, o inimigo pode estar bem ao lado.