Plebiscito oficial para anular venda da Vale é meta dos movimentos sociais
As 64 organizações que realizaram o plebiscito popular pela anulação da privatização da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) vão empreender novo esforço para garantir a realização de um plebiscito oficial, capaz de “constranger” as autoridades para reesta
Publicado 08/10/2007 18:14
Na entrevista coletiva, na tarde desta segunda-feira (8), na Câmara dos Deputados em Brasília, os organizadores destacaram os números alcançados no plebiscito como grande vitória. Nos estados, atos de rua foram realizados para apresentar à população os resultados do plebiscito.
A consulta, realizada entre os dias 1º e 9 de setembro, atingiu 3.157 cidades, 57% do total de municípios brasileiros, e 3.729.538 votantes. Desse total, 94,5% votaram contra a manutenção da Vale nas mãos do capital privado.
Júlio Turra, da CUT (Central Única dos Trabalhadores), anunciou que esta semana o resultado do plebiscito será entregue as autoridades em Brasília. Nesta terça-feira (9), os organizadores do plebiscito esperam encontrar com o Presidente Lula, e na quarta (10) com o presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).
Também na quarta-feira, eles vão acompanhar o julgamento de uma das 100 ações que pede a anulação do leilão no Superior Tribunal de Justiça (STJ) .
A luta continua
Ao anunciar a batalha para iniciar um projeto de lei de iniciativa popular para realizar plebiscito oficial, Turra admite que “não é fácil”, destacando a posição do Presidente Lula durante o congresso nacional do PT, que colocou em votação o apoio à realização do plebiscito. Turra lembrou que o Presidente Lula disse que a reestatização da Vale não estava e nem estaria na pauta do governo.
Todas as entidades organizadoras do plebiscito manifestaram a disposição de “continuar a luta em diferentes frentes para retomar a Vale”. Para isso, eles destacam a participação de 104.592 voluntários na organização e realização do plebiscito. Eles querem contar com esse contingente para conseguir assinatura de 1% do eleitorado brasileiro – mais de um milhão de assinaturas – para o projeto de iniciativa popular.
Para Turra, a luta do povo é igual em todo continente sul americano, citando os casos da Venezuela, Bolívia e Equador – para retomar para a nação o que foi entregue para o capital privado – as multinacionais. “O caso da Vale é emblemático porque completa 10 anos e, na época, valia cem bilhões de dólares e foi vendida por três bilhões”.
Ilegal e imoral
Waldir Misnerovicz, cordenador do MST em Goiás, disse que considera a venda como ato ilegal e imoral. Ilegal porque são mais de 100 ações questionando a forma como foi leiloada e vendida. “Não reconhecemos como legítimo o leilão que entregou o patrimônio público para o capital estrangeiro e privado”, afirmou, acrescentando que “é imoral porque não aceitamos que uma empresa da importância da Vale, com seus recursos naturais, que cumpre papel estratégico na expectativa do desenvolvimento nacional, seja entregue ao domínio e aos interesses do capital internacional”.
Dom Guilherme Antônio, da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) destacou que “a retomada da Vale é uma luta do povo e nós devemos estar ao lado dele”. Ele elogiou o papel das pastorais sociais na organização e realização do plebiscito, mas “reconhecemos nesse terceiro grande plebiscito o quanto o povo se organizar, pode caminhar por conta própria, e queremos ser parceiros desses que buscam justiça”.
Modelo de estado
Para Edson Carneiro, o Índio, da Intersindical, a discussão sobre a retomada da Vale faz parte do debate sobre modelo de Estado, “quais os rumos que queremos para o nosso País”, afirmou.
Ele destacou os outros três temas que foram abordadas no plebiscito – juros da dívida interna e externa e a reforma da previdência. Também foi questionado a exploração da energia elétrica pelo setor privado.
Este foi o terceiro Plebiscito Popular realizado pelas organizações sociais. No ano de 2000, o tema era o pagamento da dívida externa. Em 2002, foi abordado o tema da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).
Neste ano, a temática principal foi a anulação do leilão de venda da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), a partir da reabertura dos processos questionando a venda da companhia, realizada em 1997.
A avaliação dos organizadores é de que o plebiscito mostrou-se um instrumento eficaz para estabelecer um diálogo com a população e de debate das questões nacionais.
“No balanço do plebiscito, chegamos a conclusão que, como parte dessa nossa estratégia de retomar a Vale, ele alcançou o objetivo. Os números mostram a quantidade de militantes, de municípios e o debate que conseguimos colocar na sociedade, isso já é resultado positivo e conquista dessas organizações que estão realizando essa campanha”, avaliou Índio.
Irregularidades
Além do subestimado preço de venda da Vale do Rio Doce, foram apontadas várias outras irregularidades no leilão, como o vínculo entre avaliadores e arrematantes e a participação direta de avaliador na compra.
Em 2006, o Tribunal Regional da Primeira Região, em Brasília (TRF-1), considerou válidas 69 ações populares questionando o edital do leilão e a venda da Vale. Elas receberiam uma nova apreciação, baseada em perícia, e aguardam análise do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A privatização também contraria a constituição federal, que determina que as reservas de urânio são de uso exclusivo da União, e não poderiam ser vendidas. Já a exploração mineral na área de fronteira não pode ser realizada sem aprovação do Congresso Nacional – o que não aconteceu. A Vale possui 11% das reservas mundiais de bauxita, por exemplo.
De Brasília
Márcia Xavier