Para CBTU, estadualização de trens urbanos foi um erro

Depois de vistoriar o sistema de trens urbanos de Fortaleza, presidente da CBTU criticou as instalações, disse que a estadualização foi um erro e informou que as informações irão para relatório que será enviado ao Ministério das Cidades.

A conversa ocorreu no saguão do Aeroporto Internacional Pinto Martins, após visita técnica aos trens administrados pelo Metrô de Fortaleza (Metrofor). O diretor-presidente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Elionaldo Maurício Magalhães Moraes, disse a assessores que a situação encontrada reforça a percepção de que a estadualização de trens urbanos, ocorridas desde o início da década de 90, foi um erro. Moraes informou aos auxiliares que a percepção constará em relatório que ele encaminhará ao ao Ministério das Cidades.


 


O principal problema é econômico: os estados não têm demonstrado capacidade de arcar com os custos do sistema. Por isso, mesmo nos casos de gestão estadualizada, é o Governo Federal que tem pago boa parte – quando não a maior dela – da conta. Em função do fracasso das estadualizações, novos processos de transferência da gestão da União para os governos estaduais estão suspensos.


 


Acompanhado de dois assessores técnicos, Moraes afirmou, enquanto aguardava seu vôo de Fortaleza para o Rio de Janeiro, no último dia 9 de abril, que a qualidade dos trens urbanos decaiu com a estadualização. O presidente da CBTU, que é um órgão vinculado ao Ministério das Cidades, criticou duramente os trens de Fortaleza. Segundo ele, o fato de os vagões circularem com as janelas trancadas e sem ar condicionado representa um “descaso” com os usuários, já que a cidade passa a maior parte do ano com temperaturas em torno dos 30º. Ele também disse que os trens e suas estações estão em situação precária na Capital e Região Metropolitana.


 


Caso cumpra a decisão que comunicou a interlocutores, de oficializar, através de relatório, que a estadualização dos trens urbanos de passageiros foi um erro, o presidente da CBTU pode impor um significado mais simbólico que prático às ações federais. A CBTU pode criar o entendimento que os governos estaduais não tiveram capacidade técnica e econômica de gerir o transporte sobre trilhos e que, agora, só com o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que envolve recursos federais que serão acompanhados diretamente pelos órgãos de Brasília, é que as obras poderão andar.


 


Casos



O entendimento de que a estadualização do transporte sobre trilhos não foi uma boa alternativa está explícita também nas ações atuais da CBTU. Segundo a assessoria de comunicação do órgão, os sistemas de transportes de Belo Horizonte (MG) e de Recife (PE), que estavam em processo de estadualização, não vão mais sair da alçada do Governo Federal.


 


A pretensa estadualização do Metrô do Recife (Metrorec), por exemplo, que vem sendo discutida desde 1993 e até hoje não teve um desfecho, demonstra bem qual o problema principal encontrado nesse processo de passagem das atribuições federais para os governos estaduais: a falta de dinheiro. O Governo de Pernambuco não tem condições de arcar com as despesas totais que o metrô gera na Capital. Atualmente, 68% dos custos são gerenciados e pagos pela União.


 


Histórico


 


O processo de estadualização dos transportes sobre trilhos no País passou longe de ser uma unanimidade. Muitas correntes, principalmente ligadas aos trabalhadores metroviários e ferroviários, se colocaram contra e denunciaram o que era o início da privatização das linhas de trem e metrô urbanos.


 


Até o final da década de 80, o transporte sobre trilhos das principais capitais brasileiras eram de responsabilidade federal. Com a criação do Plano Nacional de Desestatização (PND), em 1990, foi implantado o Programa de Estadualização desses sistemas de locomoção. Os primeiros trens a serem estadualizados foram os de São Paulo e do Rio de Janeiro – este último hoje privatizado.


 


No Ceará, o Metrofor foi criado em 1997 com a finalidade de projetar o metrô da Região Metropolitana de Fortaleza e, futuramente, operá-lo. O transporte de passageiros sobre trilhos acabou ficando para a Superintendência da CBTU em Fortaleza. A partir de 2002, a responsabilidade de operar, manter e modernizar os trens urbanos foi dividida com o Metrofor, que é gerido pelo Governo do Estado.


 


Segundo Eduardo Pacheco, secretário de formação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes (CNTT), a estadualização do sistema de trilhos, em tese, era positiva. “Era a idéia de que a gestão do sistema ficaria mais próxima do local onde o transporte seria operado, possibilitando maior facilidade na integração com outros sistemas de transportes”, disse. “A crítica que se colocava a este sistema de estadualização é que, com um sistema nacional e uma gestão unificada, seria mais fácil se otimizar os transportes. Existiria padronização de sistemas e baratearia as compras em larga escala. Além disso, nada impediria de que existissem gestões locais, mais próximas do Estado e municípios”, ressaltou.


 


Para Pacheco, o reconhecimento do presidente da CBTU, de que a estadualização foi um erro, é positivo para mudar um processo de estagnação e diminuição da malha ferroviária de transportes urbanos no Brasil. “É fundamental reconhecer o erro para tentar reparar as conseqüências do que foi feito. É um gesto de humildade, de entendimento do Estado que a política pensada não se viabilizou”, concluiu.


 


Estadualizações ameaçam CBTU


 
A interrupção da estadualização dos trens urbanos das principais capitais brasileiras também é de interesse da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). Até 2006, com o processo de estadualização das malhas de Recife e Pernambuco a todo vapor, era discutida a possibilidade de se extingüir a Companhia, uma vez que ela, por ser federal, perderia sua razão de existir.


 


Se todos os transportes sobre trilhos das capitais brasileiras fossem estadualizados, a CBTU, vinculada ao Ministério das Cidades desde 2003, não teria mais função. A situação ficou ainda pior em 2005, quando, no contexto dos objetivos setoriais do Ministério das Cidades, a Companhia teve definidas como atividades finalísticas a implantação, modernização e manutenção dos sistemas de trens urbanos “até sua regionalização”. Além disso, foi definido para ela que deveria “viabilizar novo modelo de transferência da gestão dos sistemas de trens urbanos para os governos locais”.


 


No entanto, a partir de 2006, com uma mudança de rumos na administração da Companhia, aliada a novos interesses do Governo Federal, ela começou a trabalhar com a expansão de sua atuação. Na época, a empresa se encontrava com um quadro de funcionários deficitário e com salários defasados.


 


Desde 2007, com o anúncio do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê algumas obras de expansão de linhas de trens urbanos e metrôs nas Capitais, a CBTU, então, voltou a ter importância para estudar os casos, acompanhar a aplicação dos gastos e vistoriar as obras.


 


Informação surpreende Metrofor


 
O presidente do Metrofor, Rômulo Fortes, se disse surpreso com a informação de que o presidente da Companhia Brasileira de Transportes Urbanos (CBTU) criticou a estadualização do transporte sobre trilhos no País e no Ceará. Segundo ele, durante a passagem de Elionaldo Maurício Magalhães Moraes por Fortaleza, nenhuma palavra foi trocada sobre insatisfação sobre os rumos dos trens no Brasil.


 


“Não acredito que isso vá para um relatório. No máximo, ele pode se reportar a algumas cláusulas que não foram cumpridas da melhor forma”, declarou Rômulo Fortes. “Essa informação que você está trazendo, para mim é nova. Quando ele esteve aqui, chegou a ser questionado sobre isso por um repórter, mas respondeu que sobre isso não falaria e que sua viagem a Fortaleza tinha um caráter de medir, executar e pagar as obras do Metrofor”, disse.


 


Fortes preferiu destacar que o presidente da CBTU considerou as obras do Metrofor como satisfatórias. “(Os técnicos da CBTU) se mostraram muito preocupados com a linha Oeste do Metrô, mas ficaram satisfeitos com o que viram”, afirmou. “Como a CBTU responde por todas as obras do grupo gestor do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), eles vieram fazer também análises do nosso sistema”, disse.


 


 


Fonte: O Povo