Ex-preso político acusa Mendes de tramar contra o Executivo
O jornalista, escritor e ex-preso político Celso Lungaretti diz no seu blog que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, tentará mais uma vez “usurpar a prerrogativa do governo federal” que concedeu refúgio político a Cesare Batti
Publicado 23/01/2009 19:40
Cesare Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália acusado de participar de quatro assassinatos quando militava na década de 70 no Proletários Armados para o Comunismo. Ele está preso no Brasil desde 2007 por ordem de Gilmar Mendes. O Ministério da Justiça concedeu a ele no último dia 13 o refúgio político que lhe garante o direito de morar e trabalhar no país.
O jornalista lembra que em 2007, antes de ser conduzido à presidência do STF, Gilmar Mendes foi o único ministro a sustentar que o Supremo deveria discutir se os crimes atribuídos a Olivério Medina, ex-integrante das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), eram políticos ou comuns.
A investida de Mendes não teve sucesso. O STF acabou reconhecendo que a decisão do governo brasileiro de conceder o status de refugiado político a Medina foi acertada do ponto de vista jurídico. A Lei do Refúgio (9.474, de 22.08.1997) é taxativa: o “reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição.”
“Mendes agora pedirá aos ministros do STF que voltem atrás no seu entendimento anterior, utilizando apenas o argumento esfarrapado de que, no caso de Medina, o Conare (Conselho Nacional para os Refugiados) foi favorável à concessão do refúgio e agora indeferiu o pedido, em votação dividida (3×2). Ocorre que o Conare é apenas primeira instância e o ministro da Justiça, a instância definitiva, conforme igualmente estabelece a Lei 9.474”, diz o jornalista.
Tese da viúva da ditadura
No caso Battisti, o jornalista diz que Mendes baterá na “surrada tese das viúvas da ditadura brasileira”, ou seja, a de que, ao resistirem na luta armada ao poder totalitário os ativistas políticos estariam cometendo crime comum. Ele lembrou que o presidente do STF já considerou que os crimes praticados pela ditadura militar de 1964 são equivalentes “aos excessos porventura praticados por membros da resistência”.
Diz que o ministro omite que no caso da ditadura a tortura, por exemplo, tratava-se de um regra não assumida formalmente, mas praticada em grande escala.
“No segundo caso, de exceções condenáveis, mas compreensíveis no contexto de uma luta que os resistentes travavam em condição de extrema inferioridade de forças, contra um inimigo que não hesitava em seqüestrá-los e executá-los ao arrepio de qualquer lei, como fez na Casa da Morte de Petrópolis e no final da campanha do Araguaia”, argumentou.
Perfil de Celso Lungaretti
Celso Lugaretti participou do movimento secundarista (1967/68) e da Vanguarda Popular Revolucionária (1969/70). Paulistano e autor do livro “Náufrago da Utopia”, o jornalista foi preso e torturado pelo regime militar e acabou sendo considerado um delator pelos seus companheiros de luta armada.
Sob tortura, o atual jornalista aceitou a imposição dos militares e renegou publicamente a guerrilha. Na ocasião, o capitão Carlos Lamarca o acusou de ter revelado o endereço de um campo de treinamento da guerrilha.
Em 2004, à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, ele juntou documentos dos arquivos secretos da ditadura e demonstrou que seu depoimento na época na TV foi feito sob extrema coerção e que não havia delatado ninguém, isso depois de 34 anos.
De Brasília,
Iram Alfaia