Cássio Borges – Transposição e Castanhão

Diz o engenheiro Manoel Bomfim Ribeiro em sua contribuição ao livro “Toda a verdade sobre a transposição do rio São Francisco” que no Nordeste brasileiro estão acumulados cerca de 37 bilhões de m3 de água e que, deste total, 50%, ou seja, 18,5 bilhões de

Se a realidade fosse tão simples como acima exposta pelo ilustre engº Manoel Bomfim Ribeiro, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, certamente, a Ciência Hidrológica não existiria nos currículos da escolas de engenharia. Se isto fosse tecnicamente verdadeiro, se o volume útil de uma barragem no semi-árido nordestino pudesse ser determinado através de uma simplória operação aritmética, o mistério que envolve a vazão regularizada pelo açude Castanhão estaria desvendado. Bastaria, dividir por 2 (dois) a capacidade de acumulação daquele reservatório na sua cota de regularização (cota 100m), que é de 4,5 bilhões de m3 e teríamos, o valor do volume útil, ou seja, 2,25 bilhões de m3, que daria uma vazão regularizada, com 100% de garantia, de 71,3 m3/s. Uma quimera! Pois o valor disponível é de apenas 19 m3/s.


 


Para efeito de comparação, apliquemos o critério adotado, equivocadamente, pelo engenheiro acima mencionado, ao açude Ores, cuja capacidade de acumulação é de 2 bilhões de m3. Sua vazão regularizada, com 100% de garantia, seria de 31,7 m3/s. Na verdade, a vazão regularizada pelo Orós é de apenas 12 m3/s.


 


Mesmo no caso do Castanhão que possue um volume de acumulação duas vezes e meia maior do que o do açude Orós, sua vazão regularizada de 19 m3/s ainda é um valor discutível, visto que, para sua determinação, conforme afirmamos no livro A Face Oculta da Barragem do Castanhão (1998), o índice de evaporação foi tomado pelos seus projetistas como sendo de 1.700 mm/ano, em vez de 2.500 mm/ano, como seria mais próximo da realidade. Note o leitor que o engenheiro Manoel Bomfim Ribeiro, no artigo que ora comentamos , faz referência a uma evaporação de 3.000 mm/ano no semi-árido nordestino, enquanto o EIA/Rima, do próprio açude Castanhão, menciona 2.893 mm/ano. Por que, então, consideraram apenas 1700 mm ? Com que propósito? São perguntas que, até hoje, não tivemos resposas.


 


A discussão sobre a real vazão regularizada efluente do açude Castanhão ainda necessita de aprofundamento, mas já podemos adiantar uma irrefutável conclusão: no semi-árido nordestino não se pode medir a importância hidrológica (benefícios) de uma barragem pelo seu volume ou altura.


 


Em face do exposto, as conclusões do engenheiro Manoel Bomfim Ribeiro, não devem ser levadas em consideração, pois são destituídas de embasamento técnico-científico e, portanto, inadmissíveis para justificar, como é seu propósito, a existência de água superficial em abundância em nossa Região.


 


Cássio Borges é Engenheiro Civil ex-diretor da Diretoria de Estudos e Projetos e da Divisão de Hidrologia do Dnocs