Régis Bonvicino: A favor do aborto e da união homossexual
Leio, em “O Estado de S. Paulo”, que a CNBB desautorizou, em nota oficial, o ato do Arcebispo de Olinda e Recife de excomungar a mãe da menina de nove anos de Alagoinhas (PE) que interrompeu a gravidez de gêmeos há poucos dias. A CNBB manteve, no
Publicado 13/03/2009 16:33
A emenda da CNBB saiu pior do que o soneto de José Cardoso Sobrinho. Não creio que o Vaticano seja, hoje, representativo da bíblia ou do cristianismo. Em nota de cinco de março, a propósito do caso da menina, a CNBB condenou o Estado e as leis humanas, que adjetivou de circunstanciais, e reafirmou a lei divina: “Não matarás”, que interpreta, afirmo, de modo restritivo. A igreja católica – produto da institucionalização de uma crença – invoca legitimidade histórica, para – pasmem – lutar pelo poder nas sociedades humanas. Crença é questão privada.
Quero dizer que sou a favor da legalização do aborto em algumas hipóteses. Sua prática está descriminalizada na maioria dos países da União Europeia. As leis estabelecem prazos para a interrupção da gravidez. Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Grécia, Bulgária, França, Noruega e Finlândia permitem o aborto até 12 semanas, como informa Bibiana Aído Almagro. Como ela, não sou a favor do aborto como primeiro método anticoncepcional e sim como decisão da gestante, dentro de um marco temporal.
A Holanda permite o aborto até 18 e a Suécia até 24 semanas. A descriminalização, nos moldes europeus, infunde segurança jurídica à uma sociedade, como a brasileira, na qual tanto a gestante quanto os médicos são tratados como criminosos. É preciso que se estabeleça política de confiança quanto à interrupção da gravidez – um tema pessoal e de saúde pública.
O Vaticano despreza a vida animal
O “Não matarás” da CNBB, que incita, indiretamente, seus fiéis contra o Estado e as leis “humanas”, não inclui, em seu rol de proteção, a vida animal – vilipendiada todos os dias no Brasil e no mundo, sobretudo, na China; não inclui uma defesa intransigente do Pantanal, da Amazônia e dos indígenas; não inclui uma política ecológica em nível global. Restringe-se ao aborto e, quanto aos outros temas, a palavras lançadas ao vento. Não é a família e ou uma vida isolada que correm risco, mas, todo o planeta, com o aquecimento, a mudança de clima e a depressão econômica.
O Vaticano não tem políticas sustentáveis para a vida: seus instrumentos são a caridade, muitas vezes feita com dinheiro público, e o autoritarismo. Basta ver o exemplo das fundações voltadas aos adolescentes em conflito com a lei, nas quais a igreja católica recebe parte do orçamento para trabalhar em “parceria” com o Estado – que ao cabo condena. Faz caridade – algo pontual e não estrutural – com o bolso alheio.
As ações sociais da CNBB são fragmentadas e ineficazes. Compreensão? Piedade? Do que? De quem? Causam, em consequência, prejuízos econômicos. Melhor que voltasse a debater o sexo dos anjos. E parasse de tensionar uma sociedade já esgarçada pela desigualdade e por velhas leis. Como não há mais partidos políticos, mas, partidos eleitorais, os políticos tornam-se reféns do Vaticano com medo de perder votos dos “católicos” e, por outro lado, dos “evangélicos” – estes, com suas “igrejas”, como informa diariamente a mídia, um caso de polícia, quase sempre.
Igreja ditadora
O Vaticano transmite a mensagem do autoritarismo ao mundo! E a CNBB a de submissão a dogmas abstratos. Ou seja, a igreja propaga a ideia, subliminar, de ditadura! Seu descompasso com o tempo presente é tão nítido que, apesar de 66 países assinarem documento em favor da total descriminalização da homossexualidade, o papa concitou seus fiéis a boicotarem a idéia.
Há homossexuais dirigindo países (Islândia), províncias e prefeituras (Paris) no mundo todo. Eles igualmente não têm direitos, de acordo com o Vaticano. Bento XVI afirmou que o homossexualismo revela uma inclinação para o mal, como chefe da Congregação da doutrina da Fé, quando ainda não era papa.
Tal como o budismo, o catolicismo oficial abole a história, ao condenar homossexuais, ao condenar abortos imperiosos, ao excomungar seres humanos e, principalmente, ao negar as necessidades da vida contemporânea.
O prefeito de Zaragoza, na Espanha, quer dar o nome de José Maria Escrivá – o fundador da Opus Dei – à uma rua. Houve revolta e polêmica na cidade. Não se aceita mais a presença de qualquer igreja em espaços republicanos. As religiões são maus negócios para a maioria dos homens, que precisam abolí-las do espaço público. A era da religião-instituição, como observa o filósofo Gianni Vattimo, terminou.
Hoje, as igrejas deseducam a sociedade por meio da caridade e da intolerância. Os religiosos de fé devem se sublevar contra as igrejas, contra a religião oficial – centros ditatoriais de poder. E o Congresso brasileiro poderia parar de instaurar CPI’s eleitorais para votar a extinção das Medidas Provisórias (que acabaram com os partidos políticos), a reforma política, a reforma tributária, a legalização do aborto em certos casos, e a legalização da união homossexual.
Fonte: Último Segundo