Canindé de França: Tributo ao Sen. Dinarte Mariz – Um Resgate da Memória Histórica
“Não existe ninguém tão pobre, que nada possa oferecer ao outro”.
Dom Heldér Câmara
Publicado 27/07/2009 16:10 | Editado 04/03/2020 17:08
O mês de julho não é somente o mês de julho, é o mês de Santana. Assim seria se possível fosse alterar a nomenclatura definida pelos Romanos. Teríamos junho, santana e os demais meses do ano. Roma ainda é forte, sua influência permanece viva, mesmo que moribunda, exemplos não faltam, como a instituição do Senado, a presença no Direito, na Religião e no calendário. Na melhor tradição Seridoense não se diz mês de julho, se diz: mês de Santana.
E foi, exatamente em 09 de Santana de 1984, que faleceu o Senador Dinarte Mariz, detentor de uma longa e prestigiada carreira política, de Prefeito nomeado em Caicó, a Senador Biônico. Representação parlamentar idealizada na mente do ilustre intelectual golpista da Ditadura Militar – General Goubery do Couto e Silva. Foram 54 anos de atividade política, seja no Executivo, no Legislativo ou na atividade pública e partidária.
Grandeza de personalidade
O Senador Dinarte Mariz não quis ou não teve oportunidade de estudar formalmente, logo adentrou no mundo do trabalho. Não teve diploma de Universidade, isso em nada compromete o seu legado, ou mesmo apequena a sua grandeza de portador de inteligência privilegiada e sabedoria aguçada. As duas juntas, inteligência e sabedoria, construíram um homem de forte personalidade e de perfil além do seu tempo, empreendedor e politicamente vitorioso, não sei se realizado.
Como homem de atividade e ação pública, a história registra que Dinarte cometeu acertos e praticou erros, o que é absolutamente admissível, em se tratando principalmente da atividade política, parlamentar e executiva.
Dentre os feitos, realizações e atividades, uma me chama atenção, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, feito extraordinário e indescritível do ponto de vista do conhecimento e do saber elaborado, de profunda repercussão para a consolidação e o desenvolvimento do nosso Estado, o Rio Grande do Norte. Se fosse nos dias atuais, poderia se dizer, uma conquista de natureza civilizacional.
O Centro Educacional José Augusto – CEJA, é outra obra, que à época foi bastante criticada, principalmente pela oposição “política” que lhe era feita, não pela idéia, mas pela grandeza física, o tempo passou, quase meio século depois o CEJA é uma Escola atual, e tecnicamente viável do ponto de vista da estrutura, da localização e da capacidade de atender a demanda do Cuó e das adjacências.
A Revolução de 30 e o Golpe de 64
O Senador Dinarte Mariz, presenciou e participou de fatos políticos importantes ocorridos na República, em 1930, posicionou-se favorável a assunção de Getúlio Vargas à presidência da República, advindo da força e do processo revolucionário, marco estruturante do Estado Nacional e da configuração do país enquanto nação soberana. Na Insurreição Comunista de 1935, foi uma das lideranças que comandou a repressão ao levante popular. Já Senador, apoiou a deposição do presidente constitucional, João Goulart, no início da década de 60, posicionando-se a favor do golpe militar e a conseqüente instauração do Regime Militar e dos governos autoritários que se seguiram até 1985.
Os fariseus e o Senador
Na linguagem popular, posso dizer que não me espanto, o desprestígio e mesmo a falta de respeito, ou se não de gratidão aos que corriam e bradavam em todos os lugares, em todas as alturas o nome, não se pronunciava nem Dinarte, mas o Senador do Coração do Povo, ou ainda, mais carinhoso, o velho Senador, tamanha era a bajulação e a vontade de ser visto ou ouvido por Dinarte Mariz. Ser visto já era alguma coisa, sinal de prestígio, e se o Senador apertasse a mão, com certeza, a depender do sujeito e da sua personalidade não a lavaria mesmo que fosse nas águas sagradas do histórico e místico Poço de Santana.
Essa mesma gente, alguns poucos que se locupletaram e fizeram carreira política no lastro do prestígio do Senador, ainda quando lhe é conveniente, fala e às vezes até chora, lágrimas de crocodilo, sentimento de víboras e relação de marcado interesse e oportunismo. Dos vermes da política, dos aproveitadores e dos abutres do “Poder Público”, para não dizer que eu disse cofres, não se pode esperar outra coisa, senão gestos e atitudes mesquinhas, incompatíveis com a dignidade dos que tem personalidade.
Não tomei conhecimento de nenhuma manifestação alusiva ao aniversário da morte do Senador, profundo silêncio, omissão total. Se quer, uma celebração foi realizada, falta de padre ou pastor não foi, pelo menos de pastores o rebanho está bem assistido, há lobos travestidos de ovelhas. Nem uma AVE MARIA foi rezada.
Avoroçados e cínicos
O Senador Dinarte Mariz, pelo que fez e pelo que representa não merece tamanho desrespeito, pelo menos na dimensão humana deveria ser lembrado, principalmente pelos que receberam o seu apreço e foram beneficiários do seu prestígio político em vida. Aqui não me refiro aos familiares, em sinal de respeito às suas vidas privadas. A constatação e a crítica são de natureza pública e não privada, ou familiar.
Hoje, Dinarte por razões óbvias, não pode mais oferecer nada, a não ser o seu legado, sua referência política e testemunho de vida pública idônea, competente, proba e de muita dedicação aos interesses públicos e da causa que o moveu durante décadas de ação política. Talvez por isso, possa ser explicado o silêncio criminoso de alguns que em situações e momentos de conveniência ainda se dizem Dinartistas, os mais avoroçados e cínicos, se dizem ainda, da bandeira vermelha do velho Senador do coração do povo.
Não é forçoso reconhecer que existem poucos, gente do povo e mesmo personalidades de diversos segmentos que respeitam e conservam a memória do Senador, estes para se ver e se encontrar, só com uma forte e potente luneta, ou melhor, seria mais apropriado um microscópio de alta resolução, preferencialmente eletrônico.
A Solidão
Passados apenas 25 anos de sua morte física, posso dizer que do ponto de vista da história é um tempo muito curto, exíguo, o que não justifica, e nem tampouco consola o pseudo- esquecimento. Não houve qualquer demonstração de afeto ou intenção de sentimento. Faltou mesmo foi gratidão e reconhecimento à memória do Senador.
Caicó: Ponto de Partida e de Chegada
Como eu, e tantas outras pessoas, não nascemos em Caicó, mas nem por isso deixamos de ser filhos e filhas de Santana, Caicoenses. Dinarte Mariz também não era, e nem por isso deixou de ser, nunca se escusou de promovê-la, de amá-la, de dignificá-la, ou seja, sempre a exaltou, seja como Prefeito, Governador ou Senador, assim foi seu míster, e o fez com grandeza de espírito e reconhecimento pessoal, denodo e esmero público.
A sua carreira política se inicia em Caicó como prefeito nomeado, e o seu retorno definitivo obedeceram a um ditame do ciclo da vida e não da morte, um desejo de raiz, um reencontro de identidade, ocorreu por ocasião do seu sepultamento em solo materno, na sua querida e emblemática Terra de Santana-Caicó.
Sobre Caicó, disse:
“O mundo é grande de se ver, e eu já vi tudo. Mas eu vejo tudo a partir de Caicó”.
Tenho a opinião de que o Senador Dinarte de Medeiros Mariz deve ser considerado na sua dimensão humana e política, mais política do que humana, tendo em vista a sua trajetória de homem público. Aqui não me cabe, e nem convém analisá-lo do ponto de vista ideológico. Devemos observar o cenário e atores de sua época histórica em que viveu e participou como cidadão, sujeito ativo e protagonista de um momento histórico vivo e em movimento permanente.
É possível imaginar que pelos compromissos e zelo que devotava à Caicó, se vivo estivesse, o Senador estaria muito inquieto, ou mesmo insatisfeito com a atual situação pela qual a nossa cidade está submetida.
À guisa de esclarecimento devo dizer que não tenho relações de parentesco ou de apadrinhamento, nunca fui e nem sou Dinartista, nem tampouco beneficiário de qualquer ato que me favoreceu pessoalmente ou pessoas de minha consanguinidade.
Este trabalho em forma de artigo é tão somente um justo e oportuno reconhecimento, um encontro com a história de um pedaço do todo que é a subjetividade concreta deste lócus, chamado CAICÓ. O concebi e coloco para conhecimento e apreciação crítica, a referência política e histórica de uma personalidade que enobreceu Caicó, e principalmente o Rio Grande do Norte, no cenário da política brasileira.
Guardemos a memória política do Senador!
Respeito ao Cidadão Dinarte de Medeiros Mariz e aos seus familiares.
por Canindé de França, é Advogado, Pedagogo e Professor da rede pública de ensino do Estado, ex-Vereador em Caicó, pós-Graduado em Planejamento de Políticas Públicas, Presidente da Associação Nacional dos Órgãos Estaduais de Terra do Brasil/Anoter, Vice-Presidente do Partido Comunista do Brasil-PCdoB/RN, e atual Secretário de Estado de Assuntos Fundiários e de Apoio à Reforma Agrária do Governo do Estado do Rio Grande do Norte.