Grande mídia boliviana faz cruzada contra lei antirracista de Evo
A luta do presidente boliviano, Evo Morales, contra o preconceito de classe e de raça da grande mídia de seu país obteve uma vitória histórica nesta sexta-feira (8). A despeito dos protestos dos veículos golpistas da Bolívia, Evo sancionou uma corajosa lei antirracista — que, segundo ele, também fortalece a soberania nacional.
Publicado 08/10/2010 18:17
"Aprovamos a lei contra o racismo e a discriminação, que busca a igualdade entre os bolivianos e bolivianas", declarou o presidente depois de assinar a nova norma. Para Evo, a nova lei visa a "descolonizar a Bolívia e evitar a discriminação dos povos indígenas".
Claro que uma iniciativa dessa envergadura só levaria irritação à direita boliviana. Parlamentares de oposição denunciam, como sempre, um atentado contra a liberdade de expressão. Cerca de 60 jornalistas da mídia golpista local entraram em greve de fome em todo o país, sobretudo em La Paz — um reduto político das forças conservadoras.
Os jornalistas criticam o artigo 16 desta lei que pune até com a suspensão da concessão de meios de comunicação que incorrerem em discriminação. Também protestam contra o artigo 23 — que suspende a imunidade dos jornalistas, que poderão ser julgados ante a justiça por racismo. De forma nada sutil, os barões da mídia e seus serviçais querem liberdade apenas para continuar a destilar ódio de classe e desestabilização do governo.
Mas a chamada Lei Contra o Racismo e Toda Forma de Discriminação recebeu o entusiasmado apoio de mais de cem organizações não governamentais (ONGs) — que participaram da elaboração do texto e queriam evitar que os parlamentares mudassem a proposta. Por isso, cobraram a aprovação na íntegra do documento. Além disso, a iniciativa é respaldada por entidades que participam da base social aliada ao governo, como sindicatos urbanos e rurais, povos indígenas e entidades de direitos humanos.
O texto começou a ser elaborado há dois anos, quando houve sucessivas denúncias de racismo no país. Em 2008, na Região do Chaco, surgiram denúncias de que havia escravidão, e, em Sucre, agricultores foram submetidos a situações de humilhação.
"Queremos que a mídia também faça parte deste esforço para trabalhar com a questão do racismo", disse a representante da Rede Contra o Racismo, Amanda Davila. "É uma lei em que o racismo é tratado como um crime. Se alguém comete um crime, deve ser submetido à lei”, afirmou. “Se a mídia faz a defesa do racismo e racismo é crime, então deve ser punida."
Os artigos referentes ao papel da imprensa foram objeto de negociação entre Evo e os representantes dos veículos de imprensa da Bolívia. Na terça-feira, empresários da comunicação e jornalistas conseguiram algumas pequenas concessões do governo no projeto de lei. Evo aceitou que fosse retirada uma menção direta aos jornalistas como potenciais responsáveis pelo racismo, mas manteve duras punições aos veículos de comunicação.
"Não se pôde obter um acordo sobre esse tema, nem modificar sequer o artigo respectivo, porque as organizações que ajudaram, alentaram e elaboraram essa norma legal se opõem e ameaçam se mobilizar", disse o porta-voz governamental Iván Canelas. Pela nova redação da lei, em vez da menção aos jornalistas fica expresso que "nenhum cidadão poderá alegar imunidade nem fórum (privilegiado) algum" contra as acusações de racismo.
Segundo a Associação Nacional de Prensa (ANP) boliviana, 20 dos 23 jornais do país publicaram na quinta-feira primeiras páginas em branco com uma única frase em protesto contra o projeto: "Sem liberdade de expressão, não existe democracia". Pouco antes da votação, o presidente confirmou que seriam mantidos os dois artigos que geraram a polêmica.
"Nos meios de comunicação, costumam dizer que nós, os indígenas, não somos capazes de governar e de liderar. Essa atitude vem sendo passada de pai pra filho há muitas gerações — e temos que mudar essa atitude", disse o senador Eugenio Rojas, do partido MAS (Movimento ao Socialismo), que é indígena aimara. “A lei não é mordaça, como dizem os donos dos jornais. A lei é preventiva e educativa e prevê mudanças na educação, na capacitação dos professores e na seleção de trabalhadores. Os meios de comunicação devem nos ajudar nesta luta.”