O papa não quer ser fruto da evolução
O papa Bento XVI se reuniu, de 1º a 3 de setembro, com 39 seus ex-alunos de teologia para debater sobre evolução das espécies e religião, um assunto que, desde a descoberta de Charles Darwin, deixa os cristãos constrangidos. O padre Stepha Horn, que or
Publicado 11/09/2006 16:36
Não foi definido quando serão publicadas as atas do encontro deste ano – quando ainda não era papa, Ratzinger publicava imediatamente o relato de seu encontro anual com ex-alunos. O jesuíta Joseph Fessio, que participou do conclave, adiantou que “os cientistas estão ultrapassando os limites da ciência” ao explicar o surgimento dos humanos a partir da evolução das espécies, pois “tiram uma conclusão ideológica que não é comprovada pela teoria”! Bento XVI, em sua missa inaugural como papa, logo depois de ser ungido, afirmou: ''Não somos um produto casual e sem sentido da evolução. Cada um de nós é resultado de um pensamento de Deus''.
A preocupação do alto clero com os temas científicos tem razão de ser, pois é cada vez mais difícil conciliar a crença nas interpretações bíblicas e evangélicas da realidade com o crescente e cumulativo conhecimento alcançado sobre a natureza e o mundo físico. E cada vez mais os cientistas que entram num templo para participar de algum ofício religioso têm de “deixar o cérebro lá fora”, como acicatou o zoólogo britânico Richard Dawkins.
Está para fazer 200 anos que Charles Robert Darwin nasceu (foi em 1809) e ainda hoje as várias religiões sentem o golpe que sua descoberta causou na versão da criação dos humanos por um ser sobrenatural. Publicada pela primeira vez em 24 de novembro de 1859, “A origem das espécies por meio da seleção natural ou a preservação das raças favorecidas na luta pela vida”, não indica nenhum “criador” para explicar a transmutação das espécies.
Ele descobriu que a seleção natural, a sobrevivência dos mais aptos, leva à melhora de cada criatura em relação às suas condições de vida e que a evolução não ocorre a esmo, “mas é determinada pela geologia, pelo clima, pela competição e pelas demais forças que compõem o meio total e que têm sido formas moldadoras da vida desde o começo dos tempos”, como explicam David E. Brody e Arnold R. Brody em “As sete maiores descobertas científicas da história”.
Calcula-se que existam, atualmente, cerca de 1 milhão de espécies de animais – dos quais 751 mil espécies de insetos e apenas uma espécie em que “a natureza tomou consciência de si mesma”, como Friedrich Engels se referia à espécie humana. No livro “A descendência do homem”, publicado em 24 de fevereiro de 1871, Darwin informa que “o homem descende de alguma forma menos altamente organizada”.
As descobertas de Darwin foram depois desenvolvidas por ciências que sequer existiam em sua época (ele morreu em 1882). Hoje, sabe-se que a vida emergiu de uma sopa primordial há cerca de 4 bilhões de anos, na forma de uma célula bacteriana. Há aproximadamente 600 milhões de anos, células bacterianas deram origem à primeira vida multicelular. Há 545 milhões de anos houve diversificação da vida subaquática, que levou aos animais concheados uns 80 milhões de anos depois. Há 395 milhões de anos surgiram animais terrestres, pela evolução de anfíbios a partir de peixes há cerca de 350 milhões de anos. Uma devastadora extinção ocorreu há 250 milhões de anos, seguida da evolução dos dinossauros, também extintos há 65 milhões de anos. O clima da Terra se resfriou e os mamíferos se diversificaram. Há 4 milhões de anos, os primeiros membros da família humana dos primatas emergem na África. E no início do mês de setembro de 2006 da era Cristã um grupo de religiosos, alguns dos quais não deixarão descendentes, já que dizem ter optado pelo celibato, reuniram-se no Castelgandolfo, a residência de verão do pontífice católico, perto de Roma, para discutir como conciliar esses fatos com a “conclusão ideológica que não é comprovada pela teoria” que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus e que Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar (de quê?).