“A Origem”: Besteiras em tela grande

Diretor britânico Christopher Nolan introduz trama psicanálica para tornar seu filme complexo e termina por produzir filme confuso e cansativo

          Os blockbusters, “arrasa quarteirões”, cheios de explosões, efeitos especiais e trama rala, tentam a todo custo atrair a atenção do público. Afinal, entre “tonéis” de Coca-Cola e baldes de pipoca, eles cumprem o programa traçado e elevam os lucros dos conglomerados que produzem os filmes de massa. São truques que lhes rendem bilhões de dólares desde que Steven Spielberg dirigiu “Tubarão” em 1975, criando uma série subprodutos (bonecos, camisetas, canetas, posters, etc), relacionados ao filme, até chegar à estrutura mercadológica do produto audiovisual, iniciada com o vídeo (VHS) no final daquela década.

         Hoje ela compreende as tradicionais salas de exibição, muitas digitais, DVD, Blue Ray, payperview, canais pagos, tv aberta e o playstation, que o transforma em jogos. O cinema então se tornou apenas o início da cadeia de difusão do produto-filme, não a mais lucrativa. Daí entende-se a parafernália que o diretor-roteirista Christopher Nolan transformou “A Origem”, que cumpre todas as etapas do blockbuster, com sua tendência a romper com a linearidade e introduzir subtramas que dão ao espectador a impressão de estar diante de uma obra de arte.

          Isto se dá por ele introduzir análises caras à psicanálise, como conflitos entre pai e filho e temor do pai de cuidar dos filhos na ausência da mãe. E porque não do sonho como ponto de partida dos temores subconscientes, em que cada um dos personagens pode entrar no sonho do outro e modificar-lhe o andamento. Ambos dariam complexidade à trama e alçariam Nolan à condição de autor, classificação criada pelos críticos do Cahiers du Cinema nos anos 50, para consolidar o cinema como arte.  Nada mais falso. Nolan se encaixa perfeitamente no roteirista de fórmulas cinematográficas, cumprindo tudo que as majors exigem para uma superprodução de US$ 160 milhões: ação contínua, personagens ralos, cortes rápidos, profusão de efeitos especiais, explosões e violência.

                   Diretor repete receita
                   do bolo cinematográfico

          São estes ingredientes, como numa receita culinária, que garantem sua permanência na estrutura hollywoodiana. Desde “Amnésia”, em que inverte a trama do filme, começando do final para o início, que ele tenta impor seu “estilo”. Menos em “Insônia”, em que se ateve ao que interessava: o efeito provocado pelo fuso horário no comportamento do policial (Al Pacino), que investiga um crime no Alasca, onde o dia é constante por ele se localizar no topo do planeta. Esse deslocamento, presente também em “A Origem”, só confirma sua tendência a um tipo de cinema em que os efeitos externos (a ação do tempo), ou subconsciente    (os sonhos), prevalecem sobre a vontade dos personagens. E não passa disso.

            Então tratá-lo como autor é desperdício de tempo. Em “A Origem” têm-se um grupo de espiões, liderados por Don Cobb (Leonardo de Caprio), que, contratado pelo empresário japonês Saito (Ken Watanabbe), tenta controlar a mente do concorrente deste para adquirir seu conglomerado. Parece enredo de filme de James Bond. Porém, os espiões usam o controle da mente, via sonhos, para cumprir o contrato. E permitem a Nolan exercitar seu “estilo”: criando camadas de ação: uma com a invasão da fortaleza do concorrente, outra com o sonho alternativo da jovem espiã Ariadne (Ellen Page) e, por último, a do conflito de Cobb com sua mulher Mal (Marion Cotillard), também espiã. Em certo momento, estas subtramas se embaralham, dando a impressão de que os sonhos dos espiões se fundiram.

            No entanto, Nolan não expõe as subtramas com clareza suficiente para que o espectador possa identificá-las e saber o que cada uma delas representa no contexto da trama principal. Lança mão de sucessivos diálogos explicativos em meio à ação para aclarar as intenções dos personagens e os rumos da trama. Os diálogos então suprem a falta de imagens que fariam o filme andar sem se tornar cansativo. Justamente o que fez o sucesso e os lucros do cinemão em mais de um século: clareza, simplicidade, personagens com os quais o público se identifique. Porém, ele, Nolan, faz o contrário. Afinal trata-se de blockbuster, não um filme de arte, ou um bom filme de ação, cuja única pretensão é divertir o espectador e muitas vezes o leva à reflexão.

            “A Origem” termina sendo um desperdício de tempo do espectador. Suas tentativas de complexidade e chamadas psicanalíticas não o redimem. Como está “A Origem” é mais um produto visual para cumprir as etapas préestabelecidas para o retorno do capital investido em sua produção. E ocupar o espaço de produções independentes do Terceiro Mundo, que não se prestam ao esquema da cadeia mercadológica de Hollywood, que domina 96% do mercado internacional. Muitas vezes isto se dá porque os incentivos nos paises em desenvolvimento são apenas para a produção, não sendo completados com incentivos à distribuição, exibição e exposição do filme (manutenção na cadeia mercadológica do cinema ao comércio audiovisual) enquanto produto visual voltado para a preservação da identidade cultural.

A Origem”. (“Inception”). Ficção Científica. EUA/Reino Unido. 2010. 148 minutos. Roteiro/Direção: Christopher Nolan. Elenco: Leonardo DiCaprio, Marion Cotillard, Ellen Page.

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