“O Exótico Hotel Marigold”: Sabor de Novo

Filme do diretor inglês John Madden sobre as redescobertas do viver na terceira idade une jovens e idosos na Índia emergente

A idéia de que os seres humanos vivem em ciclos etários é tão velha quanto a própria sociedade de classes. Cada ser humano, por sua vez, deve se adequar ao comportamento de sua faixa etária. Principalmente na terceira idade. Nesta faixa supostamente nada mais se realiza, nenhuma paixão se reacende, só resta o crepúsculo existencial. Talvez por isto, o marketing da eterna juventude seja um dos motores da sociedade de consumo. Forma de preparar, desde cedo, as novas gerações para as futuras etapas da vida. Assim, do capitalismo nada escapa; tudo tem valor de mercado.

Não é à toa que a escritora Deborah Moggach as define em seu livro, no qual é baseado o filme “O Exótico Hotel Marigold”, como “Estas Coisas Burras”. E o diretor inglês John Madden (“Shakespeare Apaixonado”) o segue à risca. O que vale não é a idade, sim o espírito livre, a capacidade de se redescobrir nas mínimas coisas. E descobre-se que se deu tanta importância às coisas tolas, que não valem o esforço. Igual a Jean Ainslie (Penelope Wilton), resmungona, que descobre ter vivido a vida inteira com o homem, Douglas Ainslie (Bill Nighy), que não se satisfazia com ela.

Este é o único fio, de um filme bem estruturado, que traz o desencanto. A história dos idosos ingleses e dos jovens indianos é cheia de vida e descobertas. É através do roteiro de Ol Parker e do livro de Moggach que Madden desmonta as couraças às quais todas as idades se prendem. Os sete ingleses na terceira idade, por não terem dinheiro para bancar uma estada num balneário europeu, acabam num hotel em ruínas em Jaipur, Mumbai, Índia. Cada deles tem uma aspiração inconfessa. O juiz Grahan (Tom Wilkinson), o mais enigmático deles, empreende uma busca de seu passado amoroso.
É ele que revela a profusão de estruturas e classes sociais, mescladas à religião, à tecnologia e a “herança” colonial britânica. A câmera de Madden o segue em suas andanças, na identificação com as crianças com as quais joga basebol na rua de terra. E seus passeios em diferentes meios de transporte, da bicicleta e motocicleta aos velhos coletivos. É uma Índia que convive com seus traços emergentes e milenares, de automóveis e caminhões e bois, elefantes e camelos. Sem escapar às profundas divisões de classes, até chegar ao menor degrau; os intocáveis, aos quais estão reservadas as tarefas mais degradantes.

Resquícios do colonialismo

É nesta estrutura sócio-cultural que as idosas Judith (Lucy Robinson), Evelyn (Judi Dench) e Muriel (Maggie Smith) e o idoso Norman (Ronald Pickup) irão se redescobrir. Judith e Norman têm em comum a busca do par ideal. Evelyn quer encontrar sentido para sua vida, depois da morte do marido. Decide pôr sua experiência de dona de casa à disposição das empresas indianas. E Muriel, reacionária, mal humorada, presa à cadeira de rodas, só quer voltar a andar. Estas mulheres e homens são vítimas das couraças que lhes foram impostas. A eles restaria só a espera da morte, caso não mirassem no outro, seja nos companheiros britânicos, seja nos/as indianos/as.

Há sempre a possibilidade de redescobertas, de aberturas para a vida. Há espaço, inclusive, para a paixão, o romantismo, o puro interesse. É desnecessário curtir um passado que se tornou memória, às vezes frustrante. Muriel revela num desabafo à Intocável que a atende no Hotel Marigold que serviu por décadas uma família e ao estar idosa e paralítica foi simplesmente descartada. Os ciclos, assim, impõem suas cargas. A resposta pode estar ao lado ou numa casa à sua espera, como ocorre com Graham. São teias muitas vezes imaginárias. Evelyn fazendo palestra sobre seu cotidiano, quando achava que nenhuma contribuição poderia dar às novas gerações.

Assim o trio Moggach/Parker/Madden mescla as experiências dos idosos britânicos aos esforços dos jovens empreendedores indianos. Sonny (Dev Patel), dono do hotel em ruínas se esforça para reconstruí-lo, Jay (Sid Makkar), dono de um cal-center, tem problemas no treinamento de suas operadoras. Há ironia nestas trocas de conhecimentos. Os idosos ingleses se revitalizam em sua ex-colonia indiana. Mas não deixam de passar a idéia de que os emergentes indianos ainda precisam de seus antigos colonizadores. É Muriel, recuperada, que ao revitalizar o arruinado hotel, passa melhor esta visão.

Madden aproveita o veio aberto por Danny Boyle, em “Quem Quer Um Ser Milionário” e contrapõe aos idosos o jovem par amoroso Sonny/Sunaina (Tena Desae). A oposição da mãe dele Ms.Kapoor (Lillette Dubey) e do irmão dela, Jay, traz, de novo, o peso das diferenças de classe e a submissão da mulher na sociedade indiana. Há nestas sequências muito de Bollywood, com o atrapalhado arranjo final. Porém o centro do filme é o romper dos estereótipos dos ciclos da vida. Para um planeta que caminha para a predominância de idosos, com a estigmatização e a marginalização a que a estrutura capitalista os relega, não deixa de ser reconfortante.

“O Exótico Hotel Marigold” (“The Best Exotic Marigold Hotel”).
Comédia Dramática. Reino Unido. 2011. 118 minutos.
Fotografia: Ben Davis.
Música: Thomas Newman.
Roteiro: Ol Parker, baseado no livro “These Foolish Things”, de Deborah Moggach.
Direção: John Madden.
Elenco: Judi Dench, Bill Nighy, Dev Patel, Tom Wilkinson, Maggie Smith.

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