Qual a estratégia do PT?
A história do PT é rica em lutas sociais, mas pobre em estratégia política. Compreensível quando se trata de um partido concebido e organizado por distintas tendências e correntes de opinião, numa disputa interna sem fim.
Publicado 02/03/2016 10:35
No máximo, a direção do partido – abalizada pela tendência majoritária – apresenta essa ou aquela proposta, tese, documento ou programa de governo, quase sempre visando o imediato.
Ainda mais em momentos de crise, predominam ações espontaneístas e de curto fôlego, tal como foi a saída de José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça. Quem ocupará o seu lugar e qual política adotará daqui pra frente? Altivez ou submissão?
É como nos lembra Paulo Nogueira em seu Diário do Centro do Mundo: “Cardozo simboliza o espetacular erro cometido pelo PT ao chegar ao poder. O partido não fez valer os votos que recebeu para colocar em posições chave pessoas alinhadas com seus projetos”. Ou seja, falta ao PT um programa estratégico de governo, elaborado coletivamente e apoiado pela maioria.
Pesquisando a história do PT, é possível constatar que quase todos os seus objetivos traçados são emergenciais ou circunstanciais: que fazer para vencer a eleição de um sindicato; qual melhor coligação para eleger um prefeito, onde priorizar uma disputa para governo; como a militância deve se comportar para ir ao segundo turno…
A crítica aqui não é com relação a prioridade dada em atuar em governos ou no parlamento. Mas a falta de uma estratégia clara e bem definida do maior partido de esquerda da América Latina, em sintonia clara com os seus aliados do mesmo campo progressista.
Lênin disse que “o pecado mortal da II Internacional não foi o de ter aplicado, em seu tempo, a tática da utilização das formas parlamentares de luta, mas em ter superestimado a sua importância, até considerá-las quase como as únicas possíveis, tanto assim que, quando chegou o período das batalhas revolucionárias abertas e a questão das formas extraparlamentares de luta se tornou mais importante, os partidos da II Internacional fugiram às novas tarefas, não as reconheceram”.
A atuação parlamentar da esquerda brasileira – somada a sua participação em diversas prefeituras, governos de Estado, e na própria Presidência da República – cumpriu e cumpre papel importante na ascensão das forças democráticas, e o consequente avanço na agenda popular e as conquistas de direitos dos trabalhadores. Mas não se pode desguarnecer da luta teórica no campo das idéias e tampouco das lutas populares na esfera dos sindicatos e demais movimentos sociais.
Mas a estratégia se modifica ao longo do tempo. Se em uma primeira fase o objetivo era erradicar a fome no Brasil, hoje a meta é melhorar a alimentação de todos. Se antes o objetivo central era o de dobrar o número de jovens na universidade, hoje é necessário empregar esse exército de toga. A cada dia surgem novas demandas de uma sociedade cada vez mais complexa e dinâmica que necessitam estar contemplada na estratégia partidária ou de governo.
A chamada classe média de hoje não é mais reacionária do que foi o campesinato russo na época de Lênin. A diferença é que o PCUS soube definir bem sua estratégia. Entre 1903 até fevereiro de 1917, a força fundamental da revolução era o proletariado e a reserva imediata os camponeses. O objetivo central naquele momento era o de derrubar o czarismo. Uma vez alcançado objetivo, outra estratégia entrou em ação.
É inconcebível, na atual quadra política, não atualizar o discurso político – afinado com a nova estratégia – e com isso se isolar da classe média. A direção do ataque principal deve ser o isolamento da burguesia rentista, parasitária e antinacional e todos os seus capachos. Nesse esforço, a esquerda deve se desdobrar em atrair para o seu lado todos os setores da pequena-burguesia que também estão sendo alvos dessa crise do capitalismo mundial.
Isso tudo, sem uma estratégia clara e bem definida, perecerá mais cedo ou mais tarde. A sorte, até então, é que a direita brasileira também carece de uma estratégia.