Autocrítica
Me referi, algumas vezes, a necessidade da autocrítica petista se este partido quiser e se dispuser a re-aglutinar forças de esquerda, democráticas e populares com vistas a reconquistas de espaços institucionais importantes que permitam aplicar seu “programa” de reformas, algumas até ingênuas, dada as circunstancias postas.
Publicado 02/05/2016 15:45
Alguns militantes acham rigorosa minha cobrança, como se isso fosse algo de cunho moral e passional. Mas o que é autocrítica então? Autocrítica é um processo de auto avaliação crítica de um indivíduo, ou coletivamente de uma sociedade, de uma instituição, sobre seus próprios atos, considerando principalmente os erros que eventualmente tenha cometido e suas perspectivas de correção e aperfeiçoamento.
Não me refiro portanto a ação oportunista dos que fazem autocrítica formal apenas para ocupar espaços na mídia. O que aliás muito se viu no início de 2016, por parte de alguns dirigentes e quadros petistas, de dentro do Governo. Aliás, os ex-governadores do PT, da Bahia e do Rio Grande do Sul, são os principais exemplos daqueles que buscam expor em jornais de grandes circulações esse tipo de conduta, no afã de aplacar ou saciar a sede dos editoriais da grande mídia. Ledo engano!
Rosa Luxemburgo expôs certa vez que: “Sem dúvida, não existe outro partido para o qual a crítica livre e incansável de seus próprios defeitos seja, tanto quanto para a social-democracia, uma condição de existência. Como devemos progredir na medida da evolução social, a contínua modificação de nossos métodos de luta e, por conseguinte, a crítica incessante de nosso patrimônio teórico, representam as condições de nossa existência. Pertence, entretanto, à sua natureza, que a autocrítica em nosso partido não atinja seu objetivo de servir ao progresso, e só poderíamos nos felicitar muito se ela se move na direção de nossa luta… Qualquer crítica que contribua para tornar mais vigorosa e consciente nossa luta de classe para a realização de nosso objetivo final merece nosso agradecimento. Mas uma crítica procurando retroceder nosso movimento, fazê-lo abandonar a luta de classe e o objetivo final – uma tal crítica, longe de ser um fator de progresso, só seria um fermento de decomposição”.
A história e a realidade estão a exigir autocrítica ou ao menos uma-auto análise séria e consequente. Não oportunista e vazia! É verdade que um Partido com a natureza que o PT tem, ou seja uma organização de esquerda, mas capitalista, não entenderá a necessidade de uma autocrítica aos moldes dos comunistas. Como estes entendem, ou deveriam entender, o papel construtivo desta atitude.
Um partido que busca dirigir politicamente a luta da classe operaria e dos trabalhadores (as), a autocrítica é condição para que a construção partidária e o sucesso da própria luta. É fundamental para que a luta e a organização evoluam acompanhando as contínuas modificações da realidade e da luta de classes.
Gramsci, intelectual comunista italiano também aborda a questão, a exemplo de Vladimir IIitch Lenin e Rosa Luxemburgo, de forma categórica:
“É certo que a autocrítica se tornou uma palavra da moda. […] Mas aí está tudo: que o sucedâneo seja aplicado a sério, que a autocrítica seja ativa e “impiedosa”, porque nisto está sua eficácia maior: que deve ser impiedosa. Viu-se, no entanto, que a autocrítica pode dar origem a belíssimos discursos, a declamações sem fim e nada mais: a autocrítica foi “parlamentarizada”. Porque até agora não se observou que destruir o parlamentarismo não é tão fácil como parece. O parlamentarismo “implícito” e “tácito” é muito mais perigoso do que o explícito, porque tem todas suas deficiências sem ter seus valores positivos. Existe muitas vezes um regime de partido “tácito”, isto é, um parlamentarismo “tácito” e “implícito” onde menos se acreditaria. É evidente que não se pode abolir uma “pura” forma, como é o parlamentarismo, sem abolir radicalmente seu conteúdo, o individualismo, e isto em seu preciso significado de “apropriação individual” do lucro e da iniciativa econômica tendo em vista o lucro capitalista individual. A autocrítica hipócrita é justamente uma destas situações”.
Cabe aqui ressaltar que o termo “parlamentarismo” usado pelo autor diz respeito ao fenômeno em que os partidos socialistas e comunistas passaram a ser dirigidos em maior ou menor grau por correntes parlamentares (Deputados, Senadores, Executivos) e seus grupos. Qualquer semelhança não é mera coincidência.
A autocrítica: refere-se à capacidade interna do indivíduo de realizar uma crítica de si mesmo. Ela implica na análise de seus atos, da sua maneira de agir, dos erros cometidos e das possibilidades de realizar uma auto correção. Desta forma o sujeito (coletivo ou individuo) se aprimora. Esse mecanismo é inerente ao processo de autoconhecimento – o ser conhece a si mesmo, identifica seus pontos fortes e fracos, suas potencialidades, e a partir daí corrige os rumos de sua jornada existencial, e se aplica também a um grupo social e a uma instituição.
Esta sucessão de movimentos psíquicos/sociais, que compõe o encontro do indivíduo consigo mesmo, e que passa necessariamente pela autocrítica, é mais complexa do que parece. Normalmente as pessoas estão tão mergulhadas na rotina, e preocupadas em ver no outro os defeitos que lhe são inerentes, bem como em julgar seus semelhantes, que se esquece de voltar-se para si mesmo e realizar um exame minucioso de suas próprias atitudes. Os que se aventuram nessa caminhada interior encontram em sua trilha melindres e suscetibilidades, bloqueios e outras tantas dificuldades.
Por outro lado, há pessoas extremamente perfeccionistas que exigem demais de si mesmas, e dos outros, e assim exageram na sua auto avaliação, mergulhando fundo na autocrítica e só enxergando defeitos e sombras em seu íntimo. Enquanto os outros erram pela falta desta qualidade, estes pecam pelo seu excesso. É necessário encontrar sempre o equilíbrio nesses processos psicológicos.
Em doutrinas políticas filosóficas, como o marxismo-leninismo, a autocrítica é vista como é. Um método científico e também enquanto exercício político constante. Através deste método os socialistas/comunistas buscam a transformação da sociedade por meio da prática do Comunismo, resultado final de um desenvolvimento dialético – confronto entre tese e antítese, do qual brota a síntese, que se torna tese e dá sequência a esse processo infinito. Esta forma de abordar a realidade engloba uma constante busca da verdade e do aperfeiçoamento de uma realidade, que assim passa por um exame permanente do real – a crítica – e pela procura de uma perfeição também interior – por intermédio da autocrítica.