A crise do capitalismo aponta o dedo para ele mesmo

Explorando a crise do capitalismo no século XXI, o surgimento do fascismo como fenômeno de desvio de foco e a luta pela democracia e inclusão social.

O mundo percorre a terceira crise cíclica do capitalismo, a mais longa até hoje, a primeira do século XXI. A precursora foi no século XIX e a seguinte no início do XX, a quebra da bolsa de Nova Iorque foi seu marco, a mais célebre.

O que diferencia essa crise que percorremos? A consolidação de uma ultradireita, de traço fascista, que aponta o dedo para o próprio capitalismo, mas coloca a conta da crise, a sua responsabilidade fundante, nos mais pobres que são atendidos pelo que chamam de um “Estado Assistencialista”. Traço presente nos discursos e práticas pós-eleição de javier Milei na Argentina, por exemplo.

O fascismo virou um fenômeno para tentar desviar o foco das massas dos reais responsáveis pela crise que assola o sistema e, pasmem, parte da classe trabalhadora e dos mais pobres foram capturadas por essa narrativa, alcançadas pelas redes socias, em particular aplicativos de troca de mensagens.

Aqui se busca impedir esses setores de construírem uma correta análise de sua realidade concreta e que percorram um caminho de mudança ou de ruptura com o que os oprime. O fascismo se apresenta como um fenômeno realmente de massas e, em certa medida, até mesmo de ruptura. Mas ele pega a indignação dos trabalhadores/as e desvia para uma espécie de defesa velada do próprio sistema carcomido de opressão.

A ideia é que funcione como um instrumento de “domesticação” dos setores mais amplos do povo direcionado para uma defesa do próprio capitalismo. Para eles, nessa narrativa, o problema não é o sistema e sim os que o dirigem, estes não são “capitalistas” o suficiente, não o conseguem fazer operar como se deve, não estão à altura do capitalismo…

Ao chegarem ao poder esses representantes da ultradireita operam um “ajuste” no Estado, entregando para os mais pobres a conta a ser paga, o traço mais gritante disso é mais uma vez a Argentina que assiste o crescimento de um desemprego galopante e o aumento alarmante da população abaixo da linha da miséria em poucos meses.

Os fascistas operam justamente na busca da escolha um inimigo, eles precisam disso na narrativa que sustentam, seja um setor da sociedade, o “comunismo”, o “socialismo”, os “índios”, e por aí vai. O nazismo operou isso elegendo os judeus como inimigos, Bolsonaro o fez com os imigrantes haitianos e venezuelanos, com os quilombolas e indígenas, com a esquerda em geral. Quando a situação pedia, sacava da cartola o inimigo de plantão.

Isso não é novo, Giuliano Da Empoli descrevia em seu livro Engenheiros do Caos esse fenômeno ocorrendo via microtargets em grupos de WhatsApp nos países europeus que viram a ascensão da nova onda fascista, a exemplo da Itália e Hungria. Algumas vezes esses disparos de mensagens eram profundamente específicos, buscando estimular e dialogar com preconceitos contra minorias políticas que no geral não tem condições estruturais de se defender.

A agenda do fascismo representado pela ultradireita tem tido dificuldade de ser implementada em marcos democráticos, por isso busca sufocá-los ou destruí-los depois que chegam ao poder, como foi feito na Hungria, com mudanças nas leis que permitiram a sequência de reeleições de seu presidente, nas ameaças de Bolsonaro contra a democracia, o Congresso e o Supremo e nas proibições de Milei de manifestações dos movimentos sociais argentinos.

No mundo atual, a defesa da democracia, do Estado democrático de Direito, do resgate do Estado de Bem-Estar Social aplicado na Europa pós-Segunda Guerra e da visão desenvolvimentista latino-americana da Cepal adquire conotação quase revolucionária. Só é possível derrotar a ultradireita e o fascismo trazendo setores do centro e da direita de cada nação para a defesa da democracia até aqui construída em cada país, amplas frentes para brecar o avanço do desmonte dos direitos dos mais pobres e necessitados.

E quanto ao povo, não cabe culpá-los, somos parte deles também, é preciso ter paciência e perseverança para dialogar com cada um, para romper a barreira do ódio e do preconceito que foi erguida entre parte deles e a esquerda. Não é simples, mas é necessário investir em mais e melhor comunicação das ideias democráticas e progressistas em todos os espaços, trazendo tal ideário de volta para a maioria dos brasileiros.

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