A Guerra como negócio

Acaba de sair novo livro do jornalista e escritor norte-americano Stephen Kinzer, tratando do Oriente Médio, em especial do Irã. A obra, batizada aqui de “Todos os Homens do Xá”, relata as disputas políticas e conflitos armados no Oriente Médio desde a década de 1940, e demonstra como o lucro da indústria bélica move as guerras na região.

Kinzer foi correspondente do insuspeito New York Times naquela região por mais de uma década. Hoje, é articulista do inglês The Guardian e professor universitário nos EUA. Ele defende que a política externa brasileira acerta em cheio ao manter boas relações com o Irã. Quem apóia a Al Kaeda é a Arábia Saudita e a Jordânia, por exemplo, e ambos os governos mantêm boas relações com Washington.

Já o Irã e a Turquia, embora sendo "estados religiosos" (a Revolução Francesa aboliu isso há dois séculos), são países de forte natureza democrática, com cabeças abertas a outras culturas e forte tradição democrática. O golpe de 1953 no Irã, que levou o xá Reza Pahlevi ao poder por 25 anos, foi coordenado, segundo Kinzer, pelo serviço secreto americano.

Resgatando passado, o jornalista demonstra que, em 53, o Irã era um exemplo de democracia no mundo. O primeiro ministro Mohammed Mossadegh, eleito com forte apoio popular, foi derrubado pelo golpe do xá.

Mossadegh nacionalizou a Anglo-American Oil Company, uma das sete irmãs do petróleo. Além de nacionalista, o Irã ameaçava também os interesses americanos por outro motivo: o caráter democrático do regime lá instalado poderia contaminar todo o Oriente Médio. E democracia é sinônimo de autonomia.

O que o Brasil e a Turquia tentam agora é reerguer o espírito democrático do Irã, que, segundo Kinzer, “está na alma do povo e na base das instituições”. Aliás, se os EUA quisessem mesmo a paz apoiariam gestões de Teerã no Paquistão e no Afganistão, pois é forte a influência iraniana nesses países.

Quando o xá foi derrubado pelos aiatolás, em 1979, estudantes invadiram a embaixada americana para evitar nova intervenção ianque nos assuntos locais. “A história estava na memória”, diz ele. Ou seja, as ações dos jovens iranianos era um recado: repetir 53, não!

Ele explica que, se o Irã fosse chamado a atuar, não haveria motivo para que o Iraque e o Afganistão fossem invadidos. E diz que o Brasil e a Turquia compreendem esse papel histórico do Irã, que conta com a vontade do seu povo, independente de quem estiver no governo.

Mas aí entra um entrave maior, que são os interesses da indústria bélica, em especial a americana. Essa questão pesa muito mais do que qualquer injunção diplomática. No caso do Iraque e do Afganistão isso é claro, porque as tropas americanas levaram mais instabilidade do que esperança de paz para a região.

Qualquer principiante sabe que não há chance de as tropas ianques derrotarem os rebeldes encastelados nas montanhas afgãs. E tampouco esses têm chances de tomarem o poder central. É um empurra-empurra que faz da guerra uma atividade que gera uma mórbida atividade econômica. O futuro daquela gente que se lasque.

Outra fonte, uma entidade mantida pelo parlamento Sueco, reforça isso. O Livro do Ano do SIPRI (Instituto Internacional de Pesquisa da Paz de Estocolmo), lançado em junho passado, enfatiza que não houve até então redução nos gastos bélicos na região.

“A crise financeira e o colapso econômico que afetou a maior parte do globo teve pouco efeito sobre o nível de gastos militares, a produção e a transferência de armas”, informa o SIPRI Yearbook 2010 logo na sua introdução. Depois, apresenta números comprobatórios.

Um cálculo por baixo, feito pelo Congresso Americano, revela que as guerras no Iraque e Afganistão consumiam quase U$ 1 trilhão até o início de 2010. Essa quantia representa perto de 2/3 do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 2009.

A retirada de tropas dos EUA do Iraque que o presidente Barak Obama está fazendo não refresca muito. Ficaram lá 50 mil soldados, para garantir “apoio estratégico”. É só fazer a conta de quanto custa cada soldado por dia, morando nos cafundós do Judas. É alimentação, fardamento, munição, carros de combate rodando e por aí afora.

Já no Afganistão, segue a aventura. A indústria bélica fornece o fuzil, o foguete lança-míssel e o tanque anfíbio. E, no mesmo conglomerado há as empresas de logística que se metem em tudo, inclusive nos cuidados com a saúde dos membros da tropa.

São 2.000 empresas que lucram com o “combate ao terror” nos EUA. Investir em segurança é parte das funções dos estados, estejam onde estiverem. Uma coisa, porém, é garantir segurança. Outra, bem diferente, é apostar na guerra para sustentar bons negócios.

E aí volto ao colega Kinzer. Invadir o Irã agora seria  desastre estratégico, até porque adiaria as próprias negociações de Israel com a Palestina. Sem contar que, ali, há um contencioso. Kinzer diz que o povo iraniano admira os americanos, por motivações capitalistas, mas na hora do vamos ver, o amargo Vietnã seria fichinha.

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