Exército acoberta Pazuello. Qual a surpresa?

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Foto: Erasmo Salomão / Ministério da Saúde

Não deveria haver surpresa na proteção que o general Eduardo Pazuello recebeu do Exército por participar de atos de apoio à Bolsonaro e, tampouco, nas três sindicâncias abertas contra o 3º Sargento da Marinha, Michel Santos, por fazer críticas ao presidente. Afinal, só os ingênuos ou dissimulados acreditam na imparcialidade das Forças Armadas.

Se é verdade que um dos fundamentos da estrutura militar é a “disciplina”, é igualmente sabido que “não cumprir ordens absurdas” é o outro fundamento basilar dessas normas, cuja eventual transgressão não se enquadra na quebra da disciplina e da hierarquia.

Assim, quando o general Eduardo Pazuello foi proibido por Bolsonaro de comprar vacinas do Butantã e proferiu a deplorável frase “um manda outro obedece”, ele não estava zelando pela disciplina da caserna, uma vez que nem mesmo os militares devem cumprir ordens absurdas. Ele estava praticando o mais abjeto servilismo – o que certamente constrange os seu pares ciosos da disciplina militar – e deixando patente que uma parcela da tropa, na qual ele se enquadra, não se importará em quebrar as regras militares, desde que isso seja para agradar o chefe e afrontar a democracia.

O papelão que protagonizou no seu depoimento à CPI da Covid, ao tentar blindar o presidente e assumir para si as inúmeras barbaridades praticadas no ministério da saúde no enfrentamento da pandemia, está dentro dessa lógica.

Mas para que não restasse nenhuma dúvida de seu desprezo pela disciplina castrense – desde que para agradar o chefe – ele foi ao comício de Bolsonaro e ali, com a desenvoltura de candidato, discursou e foi “homenageado” pelo papelão que acabara de cumprir na CPI.

Havia quebrado todas as regras da disciplina militar. A sua punição era dada como certa até mesmo pelo vice-presidente presidente Hamilton Mourão, igualmente militar e cioso dessa norma primária de funcionamento da tropa, especialmente quando se tem conhecimento de que o 3º Sargento da Marinha, Michel Santos, já foi alvo de três sindicância por fazer críticas a Bolsonaro (FSP 07.06.2021).

Mas Pazuello, além de não ser punido, ainda ganhou um cargo na “cozinha do palácio”, o que gerou dezenas de declarações que oscilam entre o caricato, a vigarice e ou a tola surpresa com a doce subordinação do Exército aos caprichos de Bolsonaro.

Santa ingenuidade. Qual é a surpresa?!

O estado nada mais é do que um instrumento de dominação da classe dominante, como bem demonstrou Marx, ao apontar os limites do estado tripartite, no qual os poderes funcionariam de forma harmônica e independente, proposto por Montesquieu no seu esforço teórico de se contrapor ao estado autoritário, comandado por um imperador com poderes absolutos, como sustentava Thomas Hobbes, em o Leviatã.

Após as inúmeras quarteladas promovidas pelos militares ao longo da nossa história, incluindo os ameaçadores tuítes de Eduardo Villas Boas – então comandante do Exército – contra uma eventual absolvição de Lula, o que permitiu a vitória de Bolsonaro, não é razoável que alguém ainda tenha ilusão com essa infantilidade de “isenção da tropa”.

As forças armadas do Brasil e ou de qualquer outro país do mundo são, no máximo, organizações de estado, quando não se comportam como milícia a serviço de “chefetes” e, como tal, estão a serviço da classe dominante – que não deve ser confundida com governantes de plantão.

É preciso ter isso claro e tomar medidas. Não podemos aceitar chantagem e ameaça de ninguém. E se não quisermos um país tensionado em 2022 é preciso superar esse impasse agora, imediatamente.

Declarações do presidente de que “não aceitará qualquer outro resultado que não lhe seja favorável” ou a recorrente tentativa de desacreditar o voto eletrônico e reimplantar o voto impresso, cujas fraudes estão amplamente documentadas ao longo de sua existência, são mais do que evidências, são provas materiais de que eles tentarão mais um golpe, se as urnas não lhes forem favoráveis, como é o cenário mais provável de hoje.

Ninguém pode viver com medo. Se é verdade que viver implica em riscos e perigos, é igualmente verdadeiro que é preciso enfrentar e superar esses desafios. Fingir que o problema não existe é o pior dos mundos e de uma ingenuidade incompatível com os anseios de um país que precisa de paz, trabalho e democracia para se agigantar.

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