Filhotes de Franco

Solo voy con mi pena
Sola va mi condena
Correr es mi destino
Para burlar la ley


Perdido en el corazón
De la grande Babylon
Me dicen el clandestino
Por no llevar papel


Pa' una ciudad del norte
Yo me fui a trabajar

No dia 18 de junho passado, o Parlamento Europeu aprovou em Estrasburgo a chamada ''diretiva do retorno'', uma lei celerada que permite a detenção por 18 meses de imigrantes que forem capturados sem papéis em solo europeu, até serem expulsos. Menores de idade também poderão ser deportados. O texto dessa lei de clara inspiração fascista foi aprovado tal qual saiu da reunião dos ministros do Interior da UE. Todas as propostas de emenda ao texto no sentido de atenuar seus aspectos mais cruéis foram recusadas. A votação oferece uma imagem sombria da correlação de forças na Europa da Otan, dos trustes e da reação burguesa triunfante: 369 votos a favor, 197 contra (esquerda unitária, socialistas e verdes) e 109 abstenções (em geral socialistas). Votaram a favor os deputados da direita (o grupo ''popular'' europeu e os liberais), os da extrema-direita e parte dos socialistas. Votaram contra os do bloco da esquerda unida (onde é forte a presença dos comunistas), outra parte dos socialistas e os Verdes. As abstencões foram sobretudo de uma terceira parcela dos deputados socialistas, que assim confirmaram, uma vez mais, o caráter intrinsecamente gelatinoso da II Internacional social-democrata. Os socialistas espanhóis e alemães estão entre os que votaram a favor da ''diretiva da vergonha''.


 


 


Ao fazerem causa comum com a direita e a extrema-direita, os socialistas espanhóis nos ajudaram a compreender a discriminação imposta por seu governo contra brasileiros e outros ''sudacas'' (termo depreciativo usado na Espanha para designar os sul-americanos), que atingiu proporções alarmantes em 2007, quando mais de três mil de nossos compatriotas foram barrados pelos meganhas no aeroporto de Madri. Provavelmente havia entre eles alguns em situação problemática, mas o pior problema é a mentalidade colonialista da polícia espanhola (hoje às ordens do socialista Zapatero), que exibiu, em milhares de episódios de expulsão arbitrária, descarada prepotência e arrogância. (É de temer pelo tratamento que será reservado, com a aprovação da lei celerada sobre imigrantes,


 


 


A sanha anti-sudaca dos beleguins de Barajas prosseguiu sua escalada nos primeiros meses de 2008. Em março último, 248 brasileiros foram sumariamente expulsos, inclusive, como em dois dos exemplos que seguem, quando apenas pretendiam fazer uma conexão para outros destinos. No dia 9 de fevereiro do corrente ano, Patrícia Camargo Magalhães, pós-graduanda em física pela Universidade de São Paulo, em rota para participar de um congresso científico em Portugal, foi detida pela polícia espanhola no aeroporto de Madri/Barajas, quando esperava a conexão para o destino final da viagem. Ela ficou três dias presa no aeroporto de Madri, até ser reexpedida para o Brasil, perdendo passagem e Congresso. ''Durante os dias em que esteve presa'', informou o noticiário do UOL, ''as autoridades da Espanha não esclareceram o que faltava para a entrada de Patrícia ser liberada''. A carta de expulsão refere-se à ''falta de documentos'', sem dizer que documentos faltavam.


 


 


Dois dias depois, outra brasileira, Camille Gavazza Alves, formada em turismo (o que torna particularmente irônica a discriminação sofrida), foi impedida, na mesma situação, de continuar viagem à Irlanda, onde faria um curso de inglês. Ela estava com os comprovantes de sua matrícula e residência, seguro-saúde, 3.000 euros em espécie, além de cartão de crédito com outros mil euros. Mas os meganhas de Barajas prenderam-na por ''falta de documentos''.


 


 


Enfim, após uma tardia reação diplomática, o número de brasileiros barrados começou a cair em abril. ''Pero no mucho'', como dizem os argentinos. Segundo o UOL, ''o setor de imigração do aeroporto de Barajas continua sendo acusado de maus-tratos e de mandar brasileiros embora sem justificar devidamente o motivo da expulsão''. No dia 14 de abril, ''Juliana Rossi, 23, turismóloga (sic) permaneceu por mais de 12 horas presa no aeroporto''. Ela estava ''com passaporte válido, bilhete de ida e volta, 2.000 euros em dinheiro para 20 dias de estadia, cartão de crédito, contrato de aluguel da mãe'' (que iria hospedá-la), além de carta-convite padrão. Assim como já haviam relatado outros brasileiros impedidos de entrar na Espanha, Juliana confirma que as instalações da imigração são precárias e que os policiais falavam de forma grosseira, repetindo sempre ''sienta y callate''. Relatou ainda que na primeira sala em que ficou confinada não havia telefone, nem cadeiras suficientes. A segunda era ainda pior: não tinha banheiro e as cadeiras estavam quebradas. Serviram-lhe ''comida […]cheia de pequenos bichinhos''.


 


 


A embaixada espanhola em Brasília afirmou, entretanto que as acomodações onde os estrangeiros são mantidos cumprem os requisitos básicos exigidos pelas normas européias: possui serviço sanitário, camas e telefone público. ''A sala é inspecionada periodicamente e a polícia da imigração recebe formação especializada para atender aos estrangeiros''. Mentiras. A ''formação especializada'' consiste em farejar viajantes com pouco dinheiro e em humilhar latino-americanos e africanos. Quanto às ''normas européias'', a circulação é proibida e há sempre um policial na porta vigiando os detidos no último andar do aeroporto de Madri.


 


 


A ''explicação'' dos policiais para as expulsões é sempre a mesma: faltam documentos. Não se deram, claro, ao trabalho de dizer que documentos faltavam. Provavelmente, Patrícia, Camille, Juliana bem como milhares de outras e outros, que da hospitalidade espanhola só conheceram a expulsão sumária e discricionária, não dispunham da certidão de nascimento de suas bisavós. Sobretudo, eram jovens, viajavam em classe econômica e não tinham reserva em hotéis de luxo. É o que basta, na mentalidade neoliberal e colonialista que prospera na Espanha de hoje, para torná-los merecedores da desconfiança, quando não do desprezo com que são tratados.


 


 


O generalíssimo Francisco Franco, um dos mais sinistros carniceiros do século 20, deixou muitos filhotes na Espanha. A começar de seu sucessor, o atual reizinho Bourbon, que no estilo do ''sienta y callate'' dos esbirros do aeroporto de Madri, mandou o ''sudaca'' Chávez calar a boca.

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