Governabilidade no governo Lula : paciência e resiliência

É necessário observar, do rescaldo eleitoral, o que o campo democrático tem pela frente

Foto: Ricardo Stuckert

Por uma momento as forças democráticas e progressistas brecaram a ascensão do fascismo no Brasil, na sua versão bolsonarista. Foi uma vitória histórica, dado que, pela primeira vez na história republicana desse país, pós Constituição de 1988, uma força eleitoral enfrentou todo o aparato estatal, colocado à disposição do presidente da república, que a utilizou escancaradamente; uma aliança sombria do fascismo com as igrejas neopentecostais e pentecostais, com os ruralistas reacionários; e com a disponibilidade de uma grande massa de meios de comunicação, de diversos tamanhos, colocados a serviço da candidatura de Bolsonaro.

Sob esse aspecto, a vitória de Lula foi épica, mas só foi possível porque, além de sua figura histórica, ele conseguiu forjar a maior aliança eleitoral já vista, tendo como eixo a defesa da democracia.

Após a vitória é necessário observar, do rescaldo eleitoral, o que o campo democrático tem pela frente, afinal daqui a dois anos, ocorrerão as eleições para prefeitos e vereadores, o que pode fortalecer ou fragilizar a aliança democrática para 2026. Parece uma postura apressada, mas é preciso salientar que a luta de classes nesse país atingiu um novo patamar, marcado pelo acirramento dessa luta.

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Nessa nova quadra política, é preciso observar os governadores eleitos, já que eles são instrumentos de pressão no campo parlamentar, pois, em muitos casos, articulam suas bancadas, acima dos interesses partidários nacionais, gerando um permanente atrito no sistema político. Nesse caso a eleição de três bolsonaristas nos três maiores estados do país, em termos de força econômica e populacional, no caso Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulos, todos no sudeste; a consolidação do bolsão reacionário no Sul, com a eleição de governadores de extrema-direita no Paraná e Santa Catarina; e a eleição de governadores conservadores no Centro-Oeste, mostra um país dividido, em termos de governança e a força do bolsonarismo e do reacionarismo, já que no Nordeste e no Norte, os governadores eleitos parecem defender a democracia.

A Câmara de Deputados saída das urnas, também mostrou a força do fascismo bolsonarista, sem bem que suas bancadas estão cheias de oportunistas de primeira hora. A aposta de Bolsonaro de ter base de apoio no Partido Liberal (PL), de Waldemar Costa Neto, conhecido pelo seu oportunismo descarado, aparentemente deu certo. Um partido que elegeu 33 deputados, já tinha crescido para 76 em 2022, ganhando, ao lado da legislatura, 43 deputados, saltou para 99 ((+23)) e que agora, junto com os conservadores da União Brasil, união dos Democratas com o Partido Social Liberal (PSL), que dera sustentação a Bolsonaro em 2018 e que foi descartado pelo presidente em 2022, que elegeu 59 deputados; mais os progressistas, que ganharam 10 cadeiras, chegando a 47; e o agora minúsculo Partido Social Cristão (PSC), com 6 deputados, foram um bloco com 211 deputados (alguns analistas falam em 189).

Do outro lado teremos uma grande coligação de governabilidade, o que por si só já expressa complexidade política.

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Olhando o Conselho Político da Equipe de Transição se vê claramente que partidos pretendem operar dentro do governo: PSD, PSB, Agir, PROS, Avante, Solidariedade, MDB, PV, PSOL, PCdoB, Rede, PDT e obviamente o PT. São 13 partidos que, somados, dão 223 votos na Câmara. Mas imaginar que todos os deputados desses partidos apoiarão a governabilidade de Lula é pura utopia, mas, somados ao núcleo duro político (a Federação) e mais alguns deputados progressistas, talvez, apenas talvez, o governo tenha entre 129 e 130 votos fechados, o que, convenhamos, diante do que foi o processo eleitoral, deve ser visto como algo positivo.

Já no Senado, os bolsonaristas, enfiados no PL, fizeram inflar a bancada desse partido, que tinha apenas 3 senadores e agora chega à nova legislatura com 11. Nessa casa parlamentar o trabalho do novo governo será o de atrair o máximo de senadores que puder do PSD (10 senadores), do União Brasil (12 senadores), MDB (10 senadores), mais alguns senadores, para ver se consegue chegar a 42 votos, a maioria.

A governabilidade do novo governo, que o PT reconhece ser de frente ampla, o que já é um grande avanço, será construída, num permanente esforço para viabilizar a redemocratização do país e eu ouso dizer que o cenário aponta para um governo de centro, puxado para a direita, o que torna a tarefa das forças mais progressistas mais desafiadora, pois redemocratizar e mexer nas estruturas montadas pelo ultraliberalismo desde 2016, será um trabalho digno de Hercules.

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