Imposto de Renda: questão constitucional e viés de classe

A luta por um sistema tributário justo conecta-se diretamente com as opções de classe e disputa de rumos em torno dos destinos de um país. Não é à toa que muitas mobilizações na história tiveram como estopim a questão tributária. A Revolução Inglesa (século 17), a Independência dos EUA (século 18), a marcha de Gandhi na Índia (século 20) e até mesmo a Inconfidência Mineira (século 18) são exemplos disso.

Nos termos do Art. 145, §1º da Constituição Federal, os impostos no Brasil devem ter caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte. Dessa forma, seriam instrumentos voltados para a distribuição de renda e minimização das desigualdades sociais, baseando-se na máxima “quem pode mais paga mais, quem pode menos paga menos”.

Contudo, sabemos que predomina no Brasil uma tributação regressiva. Assim, como a maior parte dos tributos incidem sobre as mercadorias, acabam punindo as famílias de menor renda, porque impactam sobre o preço final dos produtos, indistintamente, sem auferir a capacidade contributiva dos que estão comprando.

O Imposto de Renda, em virtude de sua natureza de tributo direto, aparentemente, possui um caráter justo, visto que aqueles que possuem melhores condições pagam mais. No entanto, a defasagem nos valores atuais da tabela de alíquotas tem gerado enormes distorções, comprometendo esse objetivo.

O movimento sindical, desde 1996, desenvolve a luta pela correção justa da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Recentemente, o Conselho Federal da OAB ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.096) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a correção da tabela pelo índice da inflação, IPCA.

Entre 1996 a 2001 a tabela do Imposto de Renda sequer foi reajustada, acarretando em perdas significativas, especialmente para os assalariados. Em 2005 a tabela foi reajustada em 10%, em 2006, 8%.

Somente a partir de 2007 é fixado um índice de correção a ser aplicado anualmente, 4,5%. Ainda assim, inferior à inflação apurada. Dessa forma, há um déficit agregado, desde os anos 90, em torno de 62%, de modo que principalmente os trabalhadores estão penalizados.
Para exemplificar, as regras do Imposto de Renda deste ano estabelecem isenção para quem ganha até R$ 1.787. Se houvesse correção pela inflação, a isenção atingiria quem ganha até R$ 2.758.

A correção inadequada da tabela do IRPF, em percentual inferior ao da inflação, ofende a Constituição Federal quanto ao conceito de renda (art. 153, III), à capacidade contributiva (art. 145, § 1º), o não-confisco tributário (art. 150, IV) e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), em face da tributação do mínimo existencial.

Há uma nítida violação de dispositivos constitucionais à medida em que, a despeito do aumento real dos rendimentos médios do trabalhador, a tabela continua defasada, engolfando os crescimentos salariais obtidos na última década.

Nunca é demais lembrar que, em termos percentuais, quem ganha menos acaba comprometendo maior fatia dos seus rendimentos com tributos, que possuem efeito relativo menor à medida em que se eleva a faixa de remuneração. Tudo isso decorre da brutal injustiça tributária que privilegia os impostos indiretos, dentre os quais o ICMS e o IPI.

Oportuno afirmar que uma reforma tributária justa deve levar em conta não apenas a correção da tabela do IRPF e o aumento de sua progressividade, mas também desonerar a cadeia produtiva e os salários, compensando com a tributação nas grandes rendas e dividendos oriundos da especulação financeira.

A rigor, vários setores da economia nacional defendem mudanças em nosso sistema tributário, levando em conta seus interesses e prioridades de alteração. A disputa de ideias traz à tona as diversas compreensões sobre os caminhos da Nação. Cabe aos setores progressistas formarem convicções em torno de teses avançadas, pois a questão tributária não foge a esta regra e revela também o viés de classe.

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