Jornalismo e jornalismo

O Jornalismo é uma atividade profissional, de natureza técnica, da área da Comunicação Social. Para o desempenho dessa atividade, a pessoa tem que adquirir conhecimento técnico específico, o que pode ser feito em curso de terceiro grau, que era obrigatório no Brasil.

Esse era o pressuposto básico, com objetivo principal  de caracterizá-lo como uma profissão regulamentada. Em vários aspectos, porém, a atividade do jornalista ou da jornalista transpõe os limites da técnica e vai bater em campos vizinhos da expressão artística ou científica.

Em muitas das funções que a lei destinava ao jornalista profissional, supostamente habilitado, é necessário mais do que o conhecimento da ferramenta. Precisa algo que não se aprende em escola, que está ligado a valores individuais, de sensibilidade estética ou conhecimento específico, que invadem outras searas.

Parte significativa da obra de Jack London, por exemplo,  é composta de reportagens. É uma reportagem, também, Canudos, a obra-prima de Euclides da Cunha, um clássico da literatura brasileira. A todo instante, vemos reportagens da TV competindo em festivais como peças cinematográficas. E a simples diagramação de uma página de revista ou edição de matéria de TV envolve conceitos estéticos, que mais se aproximam das artes plásticas.

Ninguém melhor para escrever sobre uma ocorrência geológica do que um geólogo. Um ambiente florestal será mais bem descrito por um botânico. Uma viagem espacial, por certo, será explicada com mais acuidade por um astrofísico. E assim por diante. Cada um deles pode escrever, dispensando um profissional para entrevistá-lo. É isso que ocorre mundo afora em toda história do Jornalismo.

Essa discussão rende teses acadêmicas e embates sindicais, mas é inevitável aceitar que o Jornalismo, ao lado da técnica, tem muito de outras áreas, que exigem largo conhecimento. Enquanto uma atividade que tem códigos e ferramentas próprias, é técnica, aplicada por profissionais habilitados. E é um canal de expressão para quem queira e precisa se comunicar.

Aí entram alguns aspectos importantes. Um deles é o da confusão que normalmente se vê entre “liberdade de imprensa” e “liberdade de expressão”. A primeira tem a ver com o direito de possuir uma máquina impressora e papel de imprensa, algo que ainda hoje tem restrições em alguns países. No Brasil mesmo, só se tornou totalmente liberado há algumas décadas. Mas na Argentina, por exemplo, é polêmica atual.

A outra significa o direito de colocar a boca no trombone, falar, escrever ou mostrar o que quiser, mas sabendo que o outro lado também tem seus direitos. Há limites. Não pode fazer como o Dr. Godinho, personagem de Eça de Queiroz no romance Crime do Padre Amaro. Anti-clerical, ele dizia: “contra o clero, havendo denúncias, publiquemo-las; não havendo, inventemo-las”.

Coisa parecida ocorre com alguns outros temas emblemáticos. Um caso é o do nepotismo. Se um funcionário do governo nomeia um filho para um cargo no órgão que dirige, há uma chuvarada de críticas. E está certo. Não pode mesmo. Mas, vejamos um exemplo. As emissoras de rádio e TV são concessões de serviço público. Só que ninguém faz concurso para entrar e está cheio de filhos e outros parentes de figurões trabalhando nas próprias emissoras. E tudo bem.

Mas esse não o problema mais grave. No Brasil, a grande mídia detém os veículos não como instrumentos de utilidade pública, mas como parte de um jogo de poder. No plano interno, suas pautas são fúteis, centralizadas e com forte conteúdo ideológico, em defesa do grande capital e no combate a propostas populares, como a reforma agrária.

Desce o cacete no governo federal, mas vive mamando em seus cofres. Basta ver os principais telejornais do País, que são financiados por empresas ou órgãos estatais, via patrocínio direto ou inserções publicitárias. E nem carece de falar da vergonhosa cobertura da campanha eleitoral.

No cenário internacional, reproduz materiais das agências americanas e nelas se orienta. Eu, por exemplo, sou contra a pena de morte. Seja no Iraque, seja nos Estados Unidos. Mas essa mídia só destaca execuções em países que quer criticar. Como se fizesse diferença entre injeção letal, cadeira elétrica ou enforcamento. Para citar apenas um caso: mataram Saddan Hussein de que forma?

E no Brasil, a mídia progressista sempre teve dificuldade de se manter. O empresariado mais aberto fica com um pé atrás e as contribuições pessoais, assinaturas e compra em bancas, de modo geral, historicamente não conseguem dar sustentabilidade aos veículos.

O que se salva são os veículos de entidades, inclusive universidades e, hoje, a redes ou mensagens individualizadas na Internet.

Ou seja, a liberdade de imprensa existe, mas a liberdade de expressão é restringida pela censura feita pelos próprios órgãos da grande mídia. Só a opinião deles vale. Na atualidade, os colunistas e os repórteres que merecem destaque são escolhidos a dedo, sem falar, claro, nos editores e manda-chuvas.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor