Leitura crítica da mídia

Em “Pérolas. Patranhas, disparates e trapaças nos meios de comunicação” http://www.rebelion.org/noticia.php?id=25903

O exercício, bem orientado, pode desvelar a podridão e a miséria dos discursos da maioria dos políticos e a mentira e a manipulação da grande maioria dos meios de comunicação. O leitor desatento assimila toda uma massa de informações e, automaticamente, a repassa, sem a menor avaliação crítica sobre a sua origem, sobre deliberadas distorções e manobras.

Domingo, 11 de junho, o caderno TV do Correio Braziliense publicou a seguinte declaração do jornalista Franklin Martins: “Vou continuar fazendo o jornalismo que sei fazer. Pego a notícia, interpreto e dou ao telespectador o direito de formar a própria opinião”. E, sobre a crise no governo federal: “É uma cobertura complexa. Mas procurei ser isento e não entrei no clima de linchamento”. É uma posição que contrasta com o perfil, por exemplo, da revista Veja, que “há algum tempo deixou de ser modelo de bom jornalismo”, como exposto pelo jornalista-referência Alberto Dines. E “quando a expectativa é grande e faltam fatos, inventa-se”, a respeito da tão desmoralizada, embora recorrente, notícia sobre dólares cubanos para a campanha do PT. 

Alguém já verificara não ser necessário pesquisar em muitas fontes para identificar as trapaças. Basta pegar um único caderno, de um único jornal, de um só dia. Vamos, pois, à experiência. O Jornal é o Correio Braziliense, daquele mesmo Domingo. A maioria dos jornais dos domingos, por falta de notícias “quentes”, requenta e/ou retoca notícias antigas, mesmo aquelas que não se sustentam, ou, então, apela para o processo criativo de que fala Dines: inventa algo.

A manchete principal em letras garrafais: “Campanha com dinheiro público”. O leitor ao lado logo comentou: “Parece que a oposição descobriu provas incontestes de que nosso presidente está gastando o dinheiro do orçamento público em campanha pela sua reeleição”. Lá dentro do jornal, na parte que não fica exposta para leitura, uma manchete menos ficcional: “Dinheiro público nas campanhas de deputados”. Aí, a desgraça já estava feita: o governo Lula condenado nas cabeças de quem levou a sério o jornal. Manobra proposital, claro. E a notícia cuida apenas de uma prática consagrada nas casas legislativas: o uso da verba indenizatória dos gabinetes dos deputados, geralmente usada para telefone e combustível. Em época eleitoral a verba é usada para divulgação do trabalho parlamentar. Uma trapaça do jornal, com fim político.

Na mesma capa do mesmo jornal, outra manchete: “PT ajuda, com advogados e telefones, os 540 integrantes do MLST que participaram do quebra-quebra na Câmara”. No corpo da matéria, apenas a informação de uma única militante de que lhe teriam disponibilizado telefones de advogados a quem poderia recorrer, sem detalhes importantes, como revela o jornalista autor da matéria. Ao lado, a informação da direção nacional do PT rebatendo a ficção jornalística. É o exemplo de uma afirmação leviana e insustentável. Trambique puro.

Na terceira página, duas manchetes com sabor tucano: “Governo corre para distribuir cartões” e “Urgência no bolsa-família”, sobre uma suposta pressa do Governo Federal em distribuir os cartões do Programa Bolsa-família em virtude da aproximação do processo eleitoral. No corpo da matéria, nenhuma comprovação do que indica a chamada e, por outro lado, o esclarecimento formal sobre a insinuação natural, fruto de disputa política. A pressa do projeto vem de fevereiro de 2005, considerando-se que alimentação e educação exigem pressa. Mais uma pérola da opção política do jornal.

Na página 4, sob a manchete “Palco para mostrar força”, o jornal destaca a preparação da convenção tucana em Belo Horizonte. Esperava-se reunir 10 mil pessoas para tentar fazer decolar a campanha tucana à presidência. Sonhava-se estimular a unidade do PSDB em meio a frustrantes informações de “corpo-mole” por parte de tucanos de alta plumagem. A matéria escondeu o fato de que o evento fora transferido do “Mineirinho”, estádio mais espaçoso, para o auditório do Expominas, visando concentrar os militantes em espaço menos amplo e, assim, dar mais visibilidade ao “ânimo” tucano. Se a preferência política do jornal fosse outra, teríamos a manchete: “PSDB foge do mineirinho para fingir força”. A omissão da transferência é, naturalmente, devida ao caráter militante tucano do jornal. Um dado que reforça a afirmação do jornalista Franklin Martins de que “a imprensa e o PIB brasileiros estão ao lado do candidato tucano”.

A matéria da sétima página, sobre a convenção estadual do PT paulista, para homologação das candidaturas de Aloizio Mercadante ao governo de São Paulo e de Eduardo Suplicy para reeleição ao Senado, além de candidaturas a deputado federal e estadual, tem por manchete única: “mensaleiros homologados”. No período mais agudo da crise política que se abateu sobre o Partido dos Trabalhadores, com óbvios respingos no governo Lula, a grande imprensa utilizava com bastante reserva ou grafava entre aspas, a palavra mensaleiro ou mensalão. É que o deputado Roberto Jefferson, criador do termo, foi cassado por não haver provado – nem as CPIs provaram – pagamento de remuneração periódica em correspondência com importantes votações de interesse do governo. No caso dos deputados citados na matéria da convenção paulista, trata-se de deputados do PT acusados de envolvimento com dinheiro ilegal e absolvidos pelo plenário da Câmara de Deputados. Fica muito estranho acreditar que deputados petistas recebessem remuneração de caixa 2 para votar matérias de interesse do governo.

Dois pesos, duas medidas: na convenção dos tucanos, em Belo Horizonte, não foi referida como presença incômoda, nem tratado como “mensaleiro”, o senador Eduardo Azeredo que, então presidente nacional do PSDB, confessou haver recebido alguns milhões, quando candidato à reeleição para Governador de Minas, inaugurando o denominado valerioduto e, agora, absolvido pelo Senado.

Um corte para o último dia 16 de junho. A Folha de São Paulo estampa, em letras garrafais, a manchete única da capa, ao lado do respectivo texto em que o candidato a vice-presidente, na chapa de Alckimin, senador José Jorge, declarara, em convenção festiva: “como dizem por aí, o presidente Lula é dado ao hábito da bebida”. Na minha leitura, uma carona da Folha, na falta de assunto do casca-grossa, para dizer: “Atenção, leitores-eleitores, Lula bebe!” No mesmo caderno, em páginas menos nobres, sem a mínima chamada de capa, a notícia que remete a uma grande possibilidade do indiciamento de cardeais tucanos e mais de 150 políticos ligados à base de apoio a FHC por recebimento de cerca de 40 milhões, não contabilizados. A já autenticada lista de Furnas.


Pérolas. Patranhas, disparates e trapaças nos meios de comunicação.

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