Ninguém fala de outra coisa

O Maranhão venceu com êxito a primeira fase de combate, qual seja, a adoção de medidas sanitárias eficazes de retardamento da chegada do vírus.

O governador do Maranhão, Flávio Dino - Foto: Divulgação/Secap

Há algumas semanas o Maranhão protagonizou  manchetes nacionais devido à compra de respiradores chineses. Agora o estado será o primeiro estado a implementar lockdown, medida ainda mais severa de isolamento social que proíbe a circulação de pessoas e estabelece um rol mínimo de atividades essenciais –  saúde, segurança e alimentação. A medida decorre de determinação judicial, em consonância com as ações previamente implementadas pelo governo estadual para o enfrentamento da pandemia. 

Na esteira dos acontecimentos políticos que envolvem a covid-19, por que o Maranhão saiu na frente? Essa é a resposta que tento encontrar nas próximas linhas. A oposição que Flávio Dino tem feito à Bolsonaro, tanto no âmbito da narrativa como das ações práticas têm mostrado como é possível diferenciar-se do projeto político hegemônico no país, vigente desde as últimas eleições presidenciais.

No Maranhão, o ceticismo em relação aos danos causados pelo vírus não tem encontrado eco na administração estadual. Embora o governo de Dino tenha ponderado bastante sobre o isolamento total, a medida viria mais cedo ou mais tarde. A decisão judicial antecipa um desgaste que o governador preferiria não ter em relação a setores da sociedade ainda resistentes, por razões econômicas, às medidas restritivas. 

O peso da condução de uma coalizão de governo heterogênea se impõe nos momentos de crise, e apesar de um número razoável de forças internas atuarem de forma dissonante, Dino tem conseguido liderar o Palácio dos Leões nos rumos que temos visto em outros países pelo mundo. Das compras conjuntas pelo Consórcio Nordeste até o lockdown existe um percurso de ações concretas de enfrentamento ao vírus.

A mídia nacional tem acompanhado com algum empenho os desdobramentos dos novos desafetos de Bolsonaro, a saber Wilson Witzel (RJ) e João Dória (SP) que foram eleitos, nunca é demais relembrar, na esteira de um projeto de extrema-direita. Ambos se reposicionaram, ambos desembarcaram do bolsonarismo, mas é importante ressaltar que as escolhas de Witzel e Dória só corroboram a sistemática que Dino aplicou desde o início do governo.

Enquanto alguns acusam os governadores do Rio e São Paulo de oportunismo político, os dois estados concentram um número impressionante de casos confirmados. Os dois souberam aproveitar, assim como fez Mandetta, o momento de se despedir de um governo federal ainda inerte sobre o que fazer.

Tenho dito ao longo das semanas que o preço a ser pago por conta do coronavírus é alto e sobrará para diversos governantes. Se não há dicotomia que sustente economia e saúde, há um trade off entre salvar vidas e prejudicar ainda mais a economia e vice-versa. No meio dessa equação, o lockdown também tem um ponto de saturação. Nesse quesito a minha aposta é que o Maranhão se adianta corretamente e, em se mantendo o direcionamento de medidas duras de restrição, colherá bons resultados nos próximos dois meses, pelo menos até a curva de contaminação diminuir. 

A leitura que faço é que o Maranhão venceu com êxito a primeira fase de combate, qual seja, a adoção de medidas sanitárias eficazes de retardamento da chegada do vírus. Vale lembrar que foi um dos últimos estados com casos confirmados. Barreiras em aeroportos e rodoviárias, campanhas de isolamento social e cancelamento das aulas ainda com a situação inicial.

A segunda fase é a que vivemos agora, ampliação de leitos de UTI exclusivos para a covid-19, capacitação de equipe técnica, aluguel de hospitais, incremento da capacidade de receber pacientes, hospitais de campanha e operações cinematográficas para aquisição de insumos e equipamentos para a rede hospitalar. No entanto essa fase tem um teto. O quantitativo de recursos disponíveis é finito (camas de hospital, respiradores, fluxômetros, enfermeiros, médicos, etc) e o número definitivo de leitos possíveis de se ampliar no território chegará a um limite. Após isso, a fase seguinte é o gerenciamento dos casos graves, rotatividade dos leitos disponíveis e gerenciamento dos óbitos e também, como temos falado aqui, o isolamento total.

Por isso mesmo o tempo do lockdown precisa ser oportuno, isto é, precisa acontecer no intervalo entre a primeira e segunda fase. Após a contaminação generalizada, a circulação dos leitos de UTI fica inviável (na rede pública e privada) e as pessoas ficam, mesmo aquelas teimosas que saíram de casa para jogar bola na praia, completamente desassistidas.

Enquanto isso, em Brasília, o  presidente da República cria atrito com o poder judiciário, vide os ataques ao STF, a interferência na Polícia Federal e a demissão do ministro Sérgio Moro. Do lado de cá Flávio Dino resiste e coloca à prova sua popularidade junto aos maranhenses. Não existe lugar fácil na crise, mas alguns lugares são mais difíceis que outros. O mês de maio será decisivo e revelará quem obteve sucesso na tomada de decisão.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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