O caso Eluana: morrer com dignidade é um direito humano

Há 17 anos a italiana Eluana Englaro, hoje com 38 anos, após acidente de trânsito, encontra-se em vida vegetativa. O pai dela, Beppino Englaro, depois de quase uma década de embates na Justiça, obteve em 2008 uma autorização para retirada da sonda nasoent

A decisão gerou debate acirrado na Itália, com repercussões na mídia mundial, a exemplo do caso Terri Schiavo, norte-americana em vida vegetativa de 1990 a 2005, após parada cardíaca associada à bulimia. Na época, ela estava em processo de separação do marido, Michael Schiavo, fato que gerou várias disputas judiciais entre ele, o responsável legal por ela, e os pais dela, Mary e Bob Schindler, que não concordavam com a supressão da conduta terapêutica paliativa. O marido, por três vezes, obteve na Justiça o direito de retirada da sonda nasoentérica. Por duas vezes, a família de Terri conseguiu liminares que garantiram a permanência da mesma. Ela faleceu, aos 41 anos, em 31.3.2005, 13 dias após a retirada da sonda nasoentérica.


 


 


Para Roberto Goldim, ''inúmeros componentes de litígio dos familiares, entre si, com a sociedade, a classe médica, o sistema judiciário, a Câmara dos Deputados dos Estados Unidos e o governo do Estado da Flórida, atestam a complexidade que esse caso assumiu. Uma das circunstâncias agravantes foi a divergência de opinião entre os familiares da paciente''.


 


 


Situações tipo Terri e Eluana sacodem a opinião pública, desabrocham posturas emocionadas a favor ou contra a eutanásia, os mesmos contrários ao aborto, colocando a discussão na ordem do dia num contexto de forte comoção, pois por dias e dias assiste-se a uma encenação de filme de terror: espera-se alguém morrer por inanição. O método é macabro e longo. A boa morte é breve e indolor.


 


 


Desconheço contribuições positivas de debates movidos a comoção para um olhar de respeito e de solidariedade, das sociedades e dos governos, pelo sofrimento pessoal e familiar de quem a rigor não vive, apenas vegeta; assim como em casos em que a pessoa doente tem consciência para definir que, diante de doenças incuráveis e causadoras de sofrimentos inúteis, cujo desfecho é a morte, ao optar pela antecipação da morte (suicídio assistido ou a eutanásia), expressa seu direito à autonomia e ao exercício do livre arbítrio, recusando meios extraordinários de prolongar a vida em sofrimento quando não há perspectivas de cura.


 


 


As discussões sobre a finitude da vida, a morte e o morrer, embora complexas, merecem uma abordagem mais racional e de respeito à autonomia das pessoas e às concepções de sacralidade e de qualidade da vida humana. Refiro-me a uma maior compreensão do que é dignidade perante a morte e que é um direito humano morrer com dignidade, embora sistematicamente desrespeitado pela ideia de santidade da vida humana, presente em diferentes denominações religiosas e na obstinação terapêutica – a maior indutora de sofrimentos inúteis, tida por alguns teóricos da bioética como prática de tortura médica, pois produz sofrimentos que não levam à cura, posterga desnecessariamente a morte e desconsidera o aforismo que sintetiza a boa prática médica: ''Curar algumas vezes, aliviar sempre que possível e consolar sempre''.

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