PEC requenta cláusula de barreira

Se algum cidadão brasileiro tem dúvidas quanto aos objetivos de uma reforma política pensada pelos conservadores, pode colocar as barbas de molho. Logo na primeira sessão ordinária, que inaugurou nesta segunda-feira, 05 de fevereiro, a 53ª legislatura do

O senador, um dos autores do “Pacote de Abril”, de 1977, anunciou que está apresentando previamente “uma proposta de emenda constitucional (PEC) que busca restabelecer agora pela via constitucional, como quer o Supremo Tribunal Federal, a chamada cláusula de desempenho”. E solicitou “o apoio dos colegas presentes” para sua iniciativa. Somente não explicou a origem da sua inspiração para afirmar que o STF deseja enfrentar novamente esse problema.


 


Velho corvo da ditadura


 


Sem a menor cerimônia, o senador do PFL resgatou seu papel histórico na construção do entulho autoritário: “A cláusula de desempenho é um instituto que está inscrito em nossa legislação desde 1978. A Emenda Constitucional nº 01, de 1978 — à época, eu era Presidente da Câmara e fui o seu subscritor —, já prescrevera a necessidade de dotarmos o País da chamada cláusula de desempenho, chamada, distorcidamente, de ‘cláusula de barreira’, pois, na realidade, não há barreira. Existe apenas o partido que melhora o desempenho. Pois bem, essa cláusula de desempenho vigorou até 1982. Em 1982, ela foi revogada. Em 1988, a Constituinte não a acolheu. Depois, retornou à legislação brasileira em 1995, com a Lei nº 9.096, de 1995, que é a lei que dispõe sobre os partidos políticos. Aliás, por ocasião da prorrogação dessa lei, encontrava-me como Presidente da República e a sancionei”.


 


Cláusula de Berlim


 


Sublinhou também, reafirmando a velha concepção autoritária — de origem alemã — que visava à proscrição dos partidos políticos divergentes: “Uma das medidas essenciais para a criação de verdadeiros partidos é obviamente a presença da cláusula do desempenho. Por outro lado, devo dizer também que essa cláusula é uma invenção nossa. A Lei Fundamental da Alemanha de 1949 – eles mudaram o nome da Constituição, pois a Alemanha ainda estava dividida pelo Muro de Berlim e havia um sonho, que, ao final, se realizou, de a Alemanha se integrar. Então, os alemães não chamavam a Constituição por esse nome, e, sim, de Lei Fundamental, à espera de que a Alemanha do Leste, a Alemanha Oriental, se unisse novamente à Alemanha Ocidental, o que ocorreu em 1989, simbolicamente, com a queda do Muro de Berlim.  A Alemanha adota a cláusula de desempenho desde 1959. Além da Alemanha, se não me engano, 36 países a adotam. Na verdade, tenho conhecimento de 44, mas consegui levantar apenas 36”.


 



Coisa privatizada


 


Ao final do seu discurso, Marco Maciel reafirmou: a emenda constitucional que visa “restabelecer a cláusula de desempenho”, significa “um grande passo para criar verdadeiros partidos políticos no País”, fazendo com que “realmente essa sonhada reforma política deixe de ser um mero discurso para se converter em ação prática e concreta”. Enfim, invertendo a equação do seu sonho totalitário, citou “Joaquim Murtinho, Ministro da Fazenda de Campos Sales se não me engano e, depois, Senador” numa sentença que ele remonta a 1907: “É necessário republicanizar a República”. E concluiu: “Enfim, República quer dizer res publica, conforme os romanos, ou seja, coisa pública. A coisa pública, portanto, é algo que tem a ver com cidadania, que é a palavra-chave da democracia”.


 


Como que a rememorar sua antiga condição de velho corvo da ditadura, e inconformado com a decisão do STF, que rejeitou por unanimidade a cláusula de barreira, agora trabalha maliciosamente para restaurar essa ameaça à liberdade constitucional de estruturação partidária e à democracia no Brasil. Para tanto, quer, de todo modo, converter a “coisa pública” e a “cidadania” no carcomido sonho privado da privatização partidária. A resposta a esse sonho certamente passa pelo fórum da mobilização popular — o único caminho para uma reforma política democrática no Brasil.



 

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