Pessoas-pax

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“O desejo põe máscaras diversas, em ocasiões diferentes, conforme os seus interesses”. (Krishnamurt). Não há desejo sem máscara, o desejo é uma máscara em si mesmo. E vive a detonar e fabricar bombas-relógio do prazer. Há pessoas que vivem dizendo: meu sonho de consumo é comprar uma calça de marca podre de chique. Isto é tudo de bom que pode existir neste mundo. Geralmente tais criaturas são grandes consumidoras dos recursos da vida. E nada dão em troca, a não ser sua contribuição individual ao desperdício coletivo.

São vorazes vampiros, bocas sugadoras dos recursos da natureza, bem como da paz e serenidade das pessoas de seu convívio. Não compartilham nem doam, absorvem como esponjas, são sanguessugas de energia física e psíquica. Ouvi um dia desses uma dessas criaturas normóides dizer, a um grupo de agregados familiares: “meu sonho de consumo é minha mãe tomar conta do meu filho. Assim economizo no mil quinhentas pilas em mensalidade de berçário”. Ou seja: deseja consumir sua genitora até que fique só pele e osso. Tudo pela santa e nobre causa de criar o rebento que irrompeu no mundo graças a férrea vontade e esforço dela (a mãe) e de seu marido. Para que viesse a ser gestado, gastou uma nota avultada em clínica de reprodução induzida – laboratório de fazer gente, para ser mais preciso. Agora que cansou de cuidar do pimpolho, quer passar adiante o imbróglio, uma vez passado o surto de vaidosura puerperal percebeu que no chinfrin dos dias criar filhos implica em gastar mais do que quinhentos contos.

Assim são as criaturas de consciência invertida: transformam os dias do existir em desperdício e gastura. E Nunca se cansam de refocilar em rasuras. Tais são os que se refocilam em comilança compulsiva, transformando em insaciável avidez por comida o vazio que resulta de não terem vida interior. A prosseguir, em marcha acelerada, a atual pandemia de obesidade, uma família unida e fortalecida em volume físico terá mais materialidade e peso do que uma divisão alemã de tanques Panzer. É muito peso de existir insustentável, para pensamentos e emoções com alta taxa de déficit de qualidade de viver. E porque não nos enfada nos empanturrar no lixão de luxo que nos dão nos palácios de fast-food, nos tornamos nefastos em relação ao planeta, e cargas muito pesadas para o aparelho locomotor de nós mesmos.

Uma amiga, psicóloga, disse-me algo que extrapolou minha capacidade de espanto quanto ao que pode se estranho o animal humano. Revelou que no Cepaigo (Centro Penitenciário de Aparecida de Goiânia) como de resto em unidades prisionais das grandes e médias metrópoles do Brasil, mulheres abastadas, bem casadas, teúdas e manteúdas, ditas bem postadas e bem sucedidas na vida familiar e profissional, a pretexto de visitar, levar sua compaixão aos “pobres prisioneiros”, em verdade lá comparecerem com o propósito de arranjar namorados, possíveis amantes, que possam manter e proteger, mesmo sendo mantidas por provedores da família patriarcal. Na visão da psicóloga, tais criaturas assim agem em compulsão instintiva de instinto de morte. É o prazer de flertar com o abismo – pois que futuro risonho e róseo esperam de criaturas muitas delas monstruosas, em cuja folha corrida figuram crimes hediondos?

O noticiário policial vem revelando que a associação para o crime agora se dá no seio da sagrada família: mães traficando para seus maridos presos, e para si próprias, utilizando filhos e filhas, sendo que estas, postas a traficar e a prostituir, são usadas como moeda de pagamento para dívidas contraídas dentro das cadeias. Não bastasse isto, ainda abunda, e prejudica, a malta das pessoas pax, que são criaturas mortais e mortíferas para si próprias, e para quem com elas se engalfinha em ralação explícita de corpo ou de alma. Perdas & danos somam-se no livro de caixa dos dias, a perder de vista os prejuízos a jusante e a montante, ante as montanhas de desastres anunciados. Mas existem as que pertencem ao tipo das pax-passivas: atraídas por fatais abismos das personas disfuncionais (que não funcionam, ou funcionam mal) – a elas horripila tomar como namorado, amante, esposa ou marido , uma pessoa que seja normal, que não seja atraída pelos abismos do mal.

Se o “normal” com quem estão em relação comparece ao encontro marcado, lembra do aniversário, e dá um presente de bom gosto, e caro, vêem o fato como excesso de normalidade. Logo ferem com sua desconfiança à pessoa que lhes é fiel. E assim vão, de solidão em solidão, a fazer estragos na paz que ainda não conseguiram destruir. Estas almas são vampiros do mundo vital, diabólicas e frias – e o sentido de suas vidas é demolirem harmonias – e se assim vivem, é porque não querem ser felizes.

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