Tempos bicudos para a democracia

Sucedem-se atentados a sedes do PT. Não parecem tresloucados, ao contrário, bem calculados para se “naturalizarem” no cotidiano e formarem parte da paisagem política. Pergunto que tipo de liberdade tem em mente um cidadão oposicionista, digamos, ​um​ tucano, que conviva com isso naturalmente? Por que o PSDB não condena de pronto e de público tais “manifestações”?

Que tipo de liberdade tem em mente alguém do meio cultural – atentem, logo do meio cultural – no episódio ocorrido no Festival de Cinema de Gramado: convidado ao palco do Festival para entregar algumas estatuetas para concorrentes de longas-metragens, Luiz Carlos Barreto, o Barretão, defendeu a democracia e se disse contra os que “planejam um golpe no país”. O produtor foi aplaudido pela maioria da plateia, mas era possível ouvir algumas vaias.

A resposta veio a seguir. O jornalista Luiz Fernando Emediato, autor do livro que inspirou o filme “O Outro Lado do Paraíso”, que recebeu o prêmio do Júri Popular, voltou a abordar a questão política. Ele criticou as vaias ao Barretão e lembrou que em nenhum momento foi citada a presidente Dilma. Apesar de assumir posicionamento contrário ao atual governo, Emediato também saiu em defesa da democracia. “Eu não gosto da presidente Dilma, mas ela foi eleita. Eu fico triste de ouvir vaias quando se defende o estado de direito. Eu não gosto desse governo, eu trabalhei nesse governo. Mas existe uma coisa que é golpe, existe a constituição. Sem o estado de direito tem tortura, tem morte, tem escuridão”, afirmou, levantando aplausos seguidos de silêncio.

Que tipo de liberdade tem em mente alguém que numa manifestação de oposição ao atual governo na capital de São Paulo cruza com uma mulher sustentando um cartaz lamentando que a presidenta Dilma não tivesse sido morta na tortura recebida dos órgãos de repressão?

Na Operação Lava a Jato se debate que poderia ter havido contribuições legais e registradas a partidos políticos, embora supostamente provindas de operações ilegais de empresas. Aliás, contribuições de igual valor para PT e PSDB. Por que se calam os tucanos? Que tipo de democracia se tem em mente acusar o PT e mesmo assim votar por manter o financiamento privado de campanha?

Ninguém pense, nessa hora, em se justificar com a hipocrisia própria da política ou com a luta política entre campos opostos. Isso é simplesmente atentar contra a democracia, e tem elevado custo: aquele pago por toda uma geração que combateu a ditadura militar para que tivéssemos liberdade de expressão.

Tempos bicudos estes, para a democracia brasileira.​

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