Viver Duas Vezes

O filme aborda os problemas da doença de Alzheimer em um professor que resiste em aceitá-la.

Deixei esse filme guardado em minhas anotações e resolvi revê-lo, para novamente refletir sobre o envelhecimento e sua realidade inexorável.

O filme Viver duas vezes inicia com a canção do tema Perfídia, e tem uma bela fotografia, mostrando uma cena singela entre os dois jovens, Emílio e Margarita, que aparecem de forma marcante no início do filme quando, o professor de matemática Emílio (Oscar Martínez), lembra de sua adolescência ao mesmo tempo em que começa a apresentar sintomas de Alzheimer, demonstrando com persistência em suas palavras o desejo de retornar para sua cidade da infância para reencontrar seu amor juvenil. Mais um filme de enfrentamento às expressões da questão social na plataforma de streaming Netflix.

O filme aborda os problemas da doença de Alzheimer em um professor que resiste em aceitá-la. Ama a matemática como ama a recordação de seu amor de adolescência, como se fosse ao mesmo tempo um desejo de rever momentos de amor desse período mas também de resistir a doença.

Dessa forma, consegue convencer a filha Julia, interpretada por Inma Cuesta(uma mulher determinada), para a aventura da viagem. A menina Blanca, de 12 anos, neta de Emilio, surpreende por seu dinamismo, inteligência e superação com relação a sua paraplegia, desempenhando um papel marcante no filme. A interação entre avô e neta reforça a importância do relacionamento intergeracional, onde os dois assimilam vivências e aprendizados.

O roteiro do filme é envolvente e nos tocou particularmente, tanto por minha profissional, como por vivenciar essa realidade com amigos (as) e familiares, fazendo-nos refletir acerca da condição da velhice, preconceitos, dúvidas, ansiedade, que envolvem tanto o portador da doença como familiares.

O envelhecimento atualmente é visto como fenômeno social diante do crescimento da população idosa. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), vivenciamos hoje a “Era do Envelhecimento” ou o fenômeno do envelhecimento populacional, período referente à 1975 à 2025, o que significa compreender que o mundo está envelhecendo.

A ONU destaca que por volta do ano 2050, pela primeira vez na história, o número de idosos será maior que o de crianças abaixo de 14 anos, isto é, a população mundial deve saltar de 6 bilhões para 10 bilhões, sendo que o número de pessoas idosas deve triplicar para 2 bilhões, ou seja, quase 25% da população do planeta. O envelhecimento mundial ocorre num ritmo bastante acentuado e sem precedentes na história da humanidade. No Brasil, o crescimento da população idosa é cada vez mais relevante, tanto em termos absolutos quanto proporcionais. Os efeitos do aumento desta população já são percebidos nas demandas sociais.

Em resenha publicada no Portal Vermelho com o título Para Sempre Alice”, que trata de filme da mesma temática, que embora retrate a história de uma professora de linguística que aos poucos é acometida por Alzheimer, da mesma forma evidencia a importância da família e do afeto.

Trouxe nessa ocasião uma análise do conceituado médico de Drauzio Varela, que explica que o Mal de Alzheimer (nome atribuído ao médico Alois Alzheimer, neurologista alemão que primeiro descreveu essa patologia) provoca progressiva e inexorável deterioração das funções cerebrais, como perda de memória, da linguagem, da razão e da habilidade de cuidar de si próprio. É um distúrbio cerebral irreversível e progressivo que afeta a memória e as habilidades de pensamento e, em alguns casos, a capacidade de realizar as tarefas consideradas simples.

No Brasil, temos 1,5 milhão de pessoas vivendo com essa doença. Considerando uma estimativa de que nas próximas três décadas a doença possa quadruplicar, é urgente que o Estado se robusteça e que o SUS possa atender em sua plenitude.  Pensemos quantas pessoas que dedicaram suas vidas à criação de seus filhos, à construção da sociedade e encontram-se vivendo sob condições muitas vezes desumanas tanto pela falta do diagnóstico, quanto pela incompreensão de familiares, considerando a sobrecarga diária de trabalho, as dificuldades financeiras, agravadas no atual quadro de nosso país, pela progressão da doença que pode trazer sinais de irritabilidade e agressividade da pessoa portadora do Mal de Alzheimer, e também aos familiares que não souberem lidar com a situação.

No Supremo Tribunal Federal (STF) tramita uma ação de inconstitucionalidade, apoiada pelo Conselho Nacional de Saúde  (CNS), contra a EC 95/2016 (Emenda Constitucional que congelou os gastos da União com despesas primárias por 20 anos) e que precisa de    ampla mobilização popular para sua revogação. 

Os desafios para o governo da esperança de Lula serão imensos, tanto para retomar o financiamento para o maior e mais organizado Sistema Público de Saúde do mundo, onde a única fonte de atendimento de 70% da população é o SUS, quanto para qualificar o atendimento em um cenário no qual os (as)  brasileiros (as) estão cada vez mais empobrecidos e dependentes de políticas públicas em todos os setores, situação agravada com o desgoverno do presidente moribundo que cessa em 13 dias pela nossa alegria e alívio.

A indicação da Dra. Nisia Trindade de Lima (a confirmar), a primeira mulher eleita presidente da Fiocruz, para o Ministério da Saúde, recebe de todos (as) nós um viva à gestora e intelectual, que tem sua trajetória marcada pela defesa e valorização da ciência no Brasil e na realização de ações que aproximam a ciência da sociedade. Uma mulher competente, humana, estudiosa, corajosa para um Ministério de grande significado.

O filme é didático para reiterar a importância do afeto, a humanização nos relacionamentos e ainda para lembrar que muitos de nós poderemos ser acometidos/as pela doença degenerativa, não apenas essa, mas por outras e que o cuidado é fundamental.

Viver duas vezes (Vivir dos veces) – (Pode conter spoiler)
Filme espanhol, lançado em 2019
Diretora: Maria Ripoll
Roteirista: María Mínguez

Elenco:
Oscar Martinez
Inma Cuesta
Mafalda Carbonell
Nacho Lopez
Disponível na Netflix

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