Volta às aulas: tecendo fios de esperança, fazendo de outros modos…

No retorno das aulas presenciais no Maranhão, empreendeu-se esforços compreendo as limitações do momento, a desigualdade social e digital e o empenho valoroso das comunidades escolares

Funcionários seguem protocolos sanitários para a entrada dos estudantes nas escolas maranhenses

Por Francisca das Chagas dos Passos Silva e Nádya Christina Guimarães, pedagogas e Mestres em Educação

Sem insistências de discurso, ainda cabe refletirmos que a pandemia por COVID-19 marcará a história por muitos dias a frente, impactando fortemente a vida da população mundial sob vários aspectos: socioemocionais, econômicos, políticos e educacionais. No Brasil, ela segue seu curso danoso, alargando fortemente as desigualdades sociais e visivelmente revelando como é adversa a condição em que muitos brasileiros ainda vivem.

Seguindo nossa linha de aprofundamento sobre as consequências da pandemia, podemos considerar ainda que, não bastasse as trajetórias de vidas interrompidas, seus efeitos no mundo, seguem alimentando uma crise sem precedentes, inclusive na educação, especialmente educação pública. É nesse sentido que Cericato e Silva ponderam que, sobre as desigualdades sociais e educação, é necessário “ampliar um pouco o debate sobre o que está acontecendo com a gente, essa conjuntura que nós nunca tivemos e nunca vivenciamos, que nos impõe diferentes desafios e escancara os problemas existentes na sociedade brasileira, nas diferentes regiões do país” (2020, p. 4).

O Relatório da UNESCO sobre a questão aponta que a COVID-19 deixou 1,57 bilhão de estudantes em 191 países fora da escola no momento mais grave de seu curso. No mesmo recorte temporal, no Brasil 52,8 milhões de estudantes ficaram fora das salas de aula, incluindo todos os níveis e etapas, da Educação Infantil ao Ensino Superior, em atendimento aos protocolos de distanciamento social e a fim da preservação do bem supremo da vida. Naquela ocasião, Governos, gestores educacionais, profissionais da educação, famílias, todos foram surpreendidos e passaram a viver uma situação de imprevisibilidade. (UNESCO, 2020).

Hoje, avaliando as consequências da pandemia na educação, já podemos observar de modo sensível o aumento dos déficits de aprendizagem e ampliação das taxas de abandono e evasão escolar. Paralelamente, podemos citar também a maior exposição das crianças e jovens à violência e a exploração, o crescimento da insegurança alimentar e nutricional e o aumento do trabalho infantil.

Contudo, destacamos o favorecimento do caos na ausência de cumprimento do papel legal do Ministério da Educação, que acabou por atribuir aos Estados e Municípios a total responsabilidade pela gestão de suas redes de ensino durante a pandemia, sem qualquer orientação e suporte financeiro nessa direção em âmbito nacional. Todo o desprezo pela educação pode ser confirmado por meio de diversas posturas, falas e medidas, como foi o caso da Ação Direta de Inconstitucionalidade protocolada pela Presidência da República contra a Lei da Conectividade, que levaria ainda em 2021 acesso a internet para estudantes e professores das redes públicas.

POR AQUI, UM MARANHÃO DE RESISTÊNCIA E ESPERANÇA

 Dados de escolarização da rede pública extraídos do Censo Escolar 2020, revelam que o Estado do Maranhão possui 10.603 unidades de ensino, 1.701.861 estudantes, distribuídos por seus 217 municípios, um território desafiador onde, certamente, fazer gestão das políticas públicas em tempos de crise desemboca em grandes tarefas.

Assim, prosseguir com os serviços públicos já existentes e implementar novos, exige compromisso ético, cívico e elevada responsabilidade social do gestor. Lamentavelmente, o que presenciamos no Brasil, de março de 2020 até hoje, foi um ataque à vida de diversas formas, pois quando o Governo Federal negou a pandemia, negou também seus efeitos, atacando a saúde do povo, a educação das crianças e dos jovens, o emprego e a renda do trabalhador e da trabalhadora, enfim, massacrando cada cidadão e cada cidadã.

Foi neste cenário que as escolas brasileiras passaram por longo tempo completamente fechadas, um dos percursos mais extensos do globo no cenário pandêmico. Dentre alguns dos motivos, pelo tamanho atraso na compra de vacinas e pela falta de apoio técnico e financeiro aos municípios e estados por parte do Governo Federal. Vimos com isso desastrosas consequências como o aumento da insegurança alimentar e nutricional das nossas crianças, mulheres deixando seus empregos, jovens sem esperança no futuro, docentes sobrecarregados e um imensurável vazio educacional.

 Apesar de todos estes desafios, destacamos a brava atitude de várias unidades da federação, que foram em buscar de mitigar os danos na educação, sobretudo, dedicando-se em manter o vínculo do estudante com a escola, especialmente àquele vínculo que diz respeito ao afeto. Deste modo, acompanhamos uma mobilização respeitosa e fraterna em vários cantos do país, repleta do compromisso amoroso com cada individuo, como bem ensinou Paulo Freire, ainda que tal movimento não conseguisse alcançar todos.

Da distribuição da alimentação escolar à entrega de equipamentos para acesso à internet, diversos estados resistiram e mantiveram o compromisso com o direito fundamental à educação para os que mais precisam dela, o que os levou por um caminho que possibilitou a reabertura gradual das escolas e os avanços locais da vacinação contra a COVID-19 para docentes e estudantes, apesar de todas as vozes contrárias da política nacional.

Foi assim que o Maranhão chegou até aqui e recentemente anunciou o retorno das aulas presenciais. Na construção deste percurso, empreendeu-se esforços compreendo as limitações do momento, a desigualdade social e digital e o empenho valoroso das comunidades escolares.

Apesar da via dolorosa da pandemia, e sem desrespeitar as incalculáveis perdas, houve no Maranhão a certeza de que era importante fazer o caminho de volta. Os índices epidemiológicos obtidos junto às autoridades de saúde indicaram que era possível voltar de forma cautelosa com a devida observância dos protocolos sanitários. Então, planejadamente e entre muitos desafios, a resistência tomou forma de esperança no reencontro das pessoas com a escola.

A volta, mesmo em caráter parcial, no modelo híbrido como muitos denominam, impõe algumas características singulares: a coragem, a esperança, a ousadia. Além disso, colocou-se como imprescindível o enfrentamento das incertezas e o próprio medo. É sobre isso que pensamos ao falarmos no tecer caminhos de esperança. E falar de esperança é desafiador ao passo que há um risco constante de se cair em esperancismos.

Contudo, passando do pulsar animado dos sentimentos á atitudes concretas, é possível agir verdadeiramente sobre as duras realidades e consolidar caminhos que encontram a devida justiça social, pois seu contrário (a injustiça) facilmente acha abrigo nos braços inertes e nas vozes que naturalizam a miséria de tantos.

No sentimento afetuoso, no zelo, na humanidade desenhada pela educação, é possível seguir na esperança que mobiliza e alimenta trajetórias por um real melhor e possível, compreendendo que ele passa pela entrega comprometida de serviços públicos em quaisquer tempos e com especial atenção para que deles mais necessita. Desta feita, a esperança não é espera e o caminho não será labirinto, como já disse o grandioso Paulo Freire…

“ESPERANÇAR, é se levantar,  
ESPERANÇAR, é ir atrás,
ESPERANÇAR  é não desistir!
ESPERANÇAR, é levar adiante
ESPERANÇAR, é juntar-se com outros
Para fazer de outro modo...”

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