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Nicolás Guillén: Trilogia

*

I


 


Suor e Látego


 


Látego,
suor e látego


 


O sol despertou mais cedo
e achou o negro descalço.
Corpo nu ensangüentado
sôbre o campo.


 


Látego,
suor e látego.


 


O vento passou gritando:
– Que flor negra em cada mão!
O sangue lhe disse: vamos!
Êle disse ao sangue: vamos!
Partiu sangrando, descalço,
Tremendo, o canavial
abriu a passagem.


 


Depois céu silencioso,
debaixo do céu o escravo
tinto no sangue do amo.


 


Látego,
suor e látego,
tinto no sangue do amo;
látego,
suor e látego
tinto no sangue do amo,
tinto no sangue do amo.


 


II


 


Cana


 


O negro
junto do canavial.


 


O ianque
sôbre o canavial.


 


A terra
sob o canavial.


 


Sangue
que se vai.


 


III


 


Um Longo Lagarto Verde


 


Por êsse Mar das Antilhas
que também chamam Caribe,
batidas, por duas ondas
e ornada de espumas brandas,
na luz do sol que a persegue
e pelo vento varrida,
cantando em lágrimas viva:
Cuba navega em seu mapa:
um longo lagarto verde
com olhos de pedra e água.


 


Alta coroa de açúcar
de agudas canas tecida,
coroa não por ser livre,
escrava desta coroa,
rainha só para fora
mas para dentro vassala,
e tão triste entre as mais tristes
Cuba navega em seu mapa:
um longo lagarto verde
com os olhos de pedra e água.


 


Junto da beira do mar,
tu que estás sempre a guardar,
pensa bem, guardião marinho,
na ponta daquelas lanças,
no largo rumor das ondas,
no grito das labaredas
e no lagarto desperto
mostrando as unhas no mapa:
um longo lagarto  verde
com olhos de pedra e água.


 


Edmundo Moniz – Poema da Liberdade
Uma Antologia Poética de Dante a Brecht
Editora Civilização Brasileira