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Peça remonta reunião que decretou o AI-5, o golpe dentro do golpe

Uma mesa, 20 ministros, um general. Assim foi instaurado o Ato Institucional-5, em dezembro de 1968, quando a ditadura militar brasileira acentuou a repressão aos opositores do regime. Hoje, passados 50 anos, é assustador o quanto algumas das frases ditas na fatídica reunião parecem atuais. É a partir deste recorte histórico que se desenvolve a peça “AI-5 – uma reconstituição cênica”, em cartaz na capital paulista até dezembro deste ano.

Por Mariana Serafini

Peça AI-5 - Giorgio Donofrio

De acordo com o diretor, Paulo Maeda, a ideia de remontar no palco a reunião que culminou no AI-5 surgiu logo após o impeachment que depôs a presidenta Dilma Rousseff, em 2016. “Depois de ler toda a ata da reunião e comparar com o áudio integral, me surpreendeu como algumas frases continuam atuais”, diz o diretor que fez um trabalho de pesquisa nos documentos da época para remontar no palco um recorte mais próximo possível do que de fato aconteceu há 50 anos.

Sendo assim, a peça nasceu a partir da vontade de usar este episódio obscuro da história para retomar a memória coletiva e propor um ponto de reflexão para o presente. “Criar uma reconstituição cênica de uma reunião que aconteceu de fato no dia 13 de dezembro de 1968. Criar um diálogo direto com o público para que todos tenham acesso às palavras que foram ditas durante a ditadura militar”, diz o texto de apresentação do espetáculo.

Após se reunir com um grupo de amigos atores, Paulo conseguiu montar o espetáculo com um elenco de 20 pessoas e entrou em cartaz em 2016. De lá pra cá a apresentação foi ganhando forma. Com o desenrolar do cenário político atual, porém, fragmentos foram inseridos, a fim de criar um paralelo entre os dois períodos. “Entram eventos impactantes, como o assassinato da Marielle [Franco], por exemplo, isso não pode passar batido. Então vamos inserindo na boca dos ‘ministros’ algumas pílulas que fazem paralelo com a situação de hoje”, explica.

Foto:  Giorgio Donofrio

“A intenção, desde o início, é fazer essa relação entre esses dois períodos que quebraram a Constituição. É surpreendente como a fala final do general Costa e Silva durante a reunião se aproxima muito do pronunciamento de Michel Temer quando ele assumiu a presidência após o golpe contra Dilma”, constata o diretor.

No desenrolar da “reunião”, surgem elementos na mesa que fazem alusão direta ao movimento que resultou no golpe de 2016 – como o “pato da Fiesp” e a camisa da CBF. Porém, esta relação não é escancarada de forma óbvia, justamente para aguçar o pensamento crítico do espectador. Segundo Paulo, este é um debate constante entre os atores, sobre até que ponto o espetáculo deve ser “didático”, ou manter a sutileza ao comparar os dois períodos.

A peça fica em cartaz em São Paulo – sempre às terças-feiras – até o dia 13 de dezembro, quando o AI-5 completa 50 anos. Daqui até lá, é impossível dizer quantos golpes a democracia brasileira ainda sofrerá, o fato é que, certamente, serão incorporados pelo elenco.

Serviço:

Peça: "AI-5"
Direção: Paulo Maeda
Assistência de direção: Thammy Alonso
Local: Casarão do Belvedere – Sala Cecy e Carmen – rua Pedroso, 283 (próximo à estação São Joaquim do Metrô)
Horário: Terças-feiras às 20h30
Preço: R$30 e R$15 meia entrada (pagamento somente em dinheiro)
Classificação: 14 anos
Duração: 90min
Elenco: Alexander Vestri, André Hendges, Caio Marinho, Danilo Minharro, Emerson Grotti, Fabio Viecceli, Fernando Pernambuco, Francisco Damasceno, Gero Santana, Lucas Scandura, Paulo Goya, Pedro Stempniewski, Pedro Felicio, Rafael Castro, Ramon Gustaff, Renato Mendes, Ricardo Socalschi, Roberto Melo, Roberto Borenstein, Thales Alves, Thammy Alonso, Thiago Meiron, Thiago Marques e Wilson Saraiva