Liminares barram lei seca nas rodovias e impedem fiscalização
Fator decisivo para a redução da violência nas estradas durante o carnaval, proibição de venda de bebidas alcoólicas às margens das BRs não deve surtir mesmo resultado na semana santa.
Publicado 22/03/2008 11:36
A pontada como fator decisivo para a diminuição da violência nas estradas federais de Minas Gerais durante o carnaval, a proibição da venda de bebidas alcoólicas nas rodovias não deve surtir o mesmo efeito durante a semana santa. Protegidos por liminares, centenas de bares e restaurantes localizados às margens das BRs venderam bebidas normalmente, na quinta-feira, no primeiro dia de movimento do feriadão. Nem mesmo a Polícia Rodoviária Federal (PRF) realizou blitzes nos bares, como ocorreu nos quatro dias de folia.
A autorização obtida na Justiça permitiu cenas insólitas, com direito a motoristas bebendo cerveja perto de policiais rodoviários que almoçavam e não podiam proibir a comercialização. A Advocacia Geral da União (AGU) tenta cassar as liminares, mas, das 12 ações ajuizadas em Minas, conseguiu derrubar apenas três. O que atenua o problema é que, mesmo com a autorização, donos de restaurantes afirmam ter havido queda nas vendas, efeito da divulgação sobre a proibição e da conscientização dos motoristas.
“Certo, sei que não é. Mas vou tomar apenas essa cerveja. Quem vem aqui para almoçar não senta para ‘encher a cara’, ainda mais numa hora dessas”, disse o operador A. F., de 43 anos, que almoçava com a mulher no Restaurante Cantinho Mineiro, às margens da BR-040, ao lado do Posto Chefão. Minutos depois, seguiria viagem para Conselheiro Lafaiete, na Região Central, a 100 quilômetros da capital. O operador tomava cerveja mesmo com os patrulheiros na mesa vizinha. “Você veio conversar comigo só porque estou bebendo, não é?”, afirmou , constrangido. Ele criticou alguns pontos da Lei Seca, que proíbe a venda de álcool desde 1º de fevereiro. “A maioria das pessoas não bebe quando está na estrada, mas dentro da cidade, onde é permitido”, argumentou. E reclamou dos buracos no trecho da BR-040 entre BH e Lafaiete, que está sem contrato de manutenção desde 15 de janeiro. “É um problema muito maior”, garantiu. Depois do almoço, adiantou que pediria à mulher para dirigir até Lafaiete.
Segundo um dos proprietários do Posto Chefão, Daniel Henrique Santana, a venda de bebidas corresponde a aproximadamente 10% do faturamento do restaurante. Mas, mesmo funcionando com a liminar do Sindicato de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de BH (Sindhorb), o efeito da lei foi sentido. “Houve queda de 30% na venda de bebidas. As pessoas estão mais conscientes, mas também têm medo de ser pegas dirigindo alcoolizadas”, disse. Dentro do restaurante, o gerente comercial L. F. J., de 35 anos, viajava com a família para um sítio perto da Lagoa dos Ingleses, e também tomava cerveja no almoço. “São duas pessoas dividindo uma garrafa – 300 ml para cada –, não dá para ficar alcoolizado”, justificou. Para não ficar preso no tráfego da volta do feriado, domingo, ele retornará a Belo Horizonte apenas na segunda-feira.
Quem também bebia cerveja olhando para o asfalto, quinta-feira, era o motorista E.F.P, de 38 anos. Ele dividia a garrafa com um amigo, no Restaurante Ravena, na BR-381. E tratou de lembrar que não estava a serviço. “Moro aqui perto, não seria maluco de beber e trabalhar. Hoje em dia, você não pode meter o pé pela mão”, destacou. O gerente do restaurante, Vanderlei Reis, de 44 anos, vende bebidas graças às liminares. Ele também percebeu uma maior conscientização dos condutores. “Os passageiros costumam tomar alguma coisa. Motoristas de caminhão até tomam algo para relaxar no fim da tarde, mas, também, só seguem viagem no dia seguinte”, afirmou o comerciante.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), até a última semana, pelo menos 129 estabelecimentos comerciais em Minas foram multados por causa da Lei Seca. Nos casos de reincidência, o Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (Dnit) tem autonomia para fechar o acesso da estrada ao bar ou restaurante. No entanto, ainda não houve registro de episódios do tipo.
Durante a semana santa, a fiscalização nos estabelecimentos não será reforçada, segundo a PRF. A liminar obtida pelo Sindihorb é a mais abrangente e beneficia cerca de 500 municípios de BH, Região Metropolitana, Norte de Minas e Zona da Mata. Na última semana, o ministro da Justiça, Tarso Genro, admitiu alterações na Medida Provisória (MP) com as determinações da Lei Seca, mas disse que o objetivo central da medida – criar dificuldades para motoristas que insistem em beber e dirigir – será mantido. Um dos aspectos a ser analisado é a venda em estradas federais que atravessam zonas urbanas.
A concessão de 217 liminares pela Justiça em 16 estados e no Distrito Federal, autorizando a venda de bebidas alcoólicas em vários trechos das BRs, levou a Polícia Rodoviária Federal a mudar os planos de fiscalização na semana santa. Como no carnaval, a PRF chegou a montar um grande esquema para pôr em prática até a meia-noite de domingo. Mas, resignada e sem poder fiscalizar muitos bares e restaurantes, a direção do órgão informou na quinta-feira em Brasília que não lhe resta alternativa senão cumprir as decisões judiciais e concentrar a fiscalização nas regiões em que a MP não foi revogada. Os estados campeões de liminares são Goiás (60), Santa Catarina (45) e Piauí (32).
Fonte: Estado de Minas