Suécia saiu de crise semelhante à dos EUA nos anos 90
Enquanto as autoridades norte-americanas buscam por soluções para a crise financeira mais séria desde a Grande Depressão, elas poderiam tirar algumas lições de outra emergência bancária dolorosa e onerosa. No início dos anos 90, um enorme estouro de bolha
Publicado 08/04/2008 15:36
As crises sueca e norte-americana compartilham muitas características: ambas ocorreram após períodos de desregulação financeira e ambas exibiram bancos audaciosos empregando manobras contábeis para assumir quantidades insustentáveis de dívidas. Apesar das condições econômicas piores do que as atuais nos Estados Unidos, a Suécia se recuperou rapidamente.
Mas isso ocorreu de uma forma que seria altamente controversa nos Estados Unidos. A Suécia usou dinheiro dos contribuintes para reconstruir seus bancos feridos. “No caso da Suécia, a solução no final foi parar no balancete do governo. O governo acabou recapitalizando o sistema”, disse o economista David Rosenberg, do Merrill Lynch. “Há uma lição aqui.”
A gestão bem-sucedida da crise pela Suécia pode oferecer um roteiro para as autoridades norte-americanas. Mas a limpeza sueca não foi barata. Ela custou à população cerca de 6% do produto econômico anual; uma conta equivalente para os Estados Unidos atualmente seria de quase US$ 850 bilhões. E a Suécia conseguiu implantar um socorro governamental ilimitado apenas por causa de um amplo consenso político que é difícil imaginar em meio ao clima hiperpartidário de uma eleição norte-americana.
“Havia uma tradição na Suécia de cooperação entre os partidos. Era uma crise tão óbvia que todos estavam realmente assustados”, disse Peter Englund, da Escola de Economia de Estocolmo.
Uma história familiar
Para qualquer um que esteja prestando atenção à deterioração das condições financeiras nos Estados Unidos, o episódio sueco parece estranhamente familiar. Primeiro, ocorreu uma expansão por vários anos, com os ganhos aumentando e os bons tempos parecendo permanentes.
Mas em meio ao boom, as sementes dos futuros problemas foram plantadas na Suécia. Uma desregulação abrangente dos mercados de crédito em 1985 introduziu os banqueiros a novos clientes, produtos e mercados que nem eles e nem os reguladores do governo entendiam plenamente. “A autoridade supervisora não estava preparada para o novo ambiente que surgiu após a desregulação do mercado de crédito. Isto fez com que, durante os anos 80, os bancos pudessem conceder empréstimos duvidosos e às vezes altamente inseguros sem qualquer intervenção supervisora”, escreveu Urban Backstrom, na época alto funcionário do Ministério das Finanças.
Grande parte da avalanche de novos empréstimos foi despejada em um mercado imobiliário exageradamente aquecido, onde os preços dos imóveis comerciais mais que dobraram na segunda metade dos anos 80. Os primeiros sinais de problemas surgiram entre as empresas financeiras responsáveis por grande parte desses investimentos. Em setembro de 1990, uma empresa chamada Nyckeln – conhecida como “The Key” (a chave) – encerrou suas atividades quando foi incapaz de renovar seu financiamento.
Muitas financeiras eram de propriedade de um punhado de grandes bancos que dominavam a economia sueca. Empresas como a Nyckeln financiaram suas operações com um novo tipo de papel comercial chamado “marknadsbevis”, que os bancos garantiam. Quando a Nyckeln se tornou inadimplente, o mercado para estes títulos repentinamente entrou em colapso e as perdas ricochetearam de volta aos balancetes dos bancos, assim como os bancos americanos de hoje sofrem com as perdas com os títulos complexos que cancelaram em seus balancetes.
“Há uma semelhança notável com o que está acontecendo agora”, disse Staffan Viotti, alto conselheiro do presidente do banco central sueco.
No final de 1991, havia indicações de que dois dos maiores bancos suecos tinham esgotado suas reservas de capital e estavam caminhando para a falência. Os preços dos imóveis, que antes pareciam capazes de apenas subir, despencaram 50% em 18 meses.
A economia encolheu em 1991 pela primeira vez em 10 anos e então continuou encolhendo em 1992 e 1993. O desemprego deu um salto repentino de 1,6% em 1990 para 12% em 1993. As autoridades do governo que debatiam sua resposta se depararam com “um clima de emergência nacional de um tipo quase semelhante a uma guerra”, segundo Viotti.
Diante do temor de que um colapso do setor bancário faria a economia ruir, o governo sueco emitiu em setembro de 1992 uma garantia a todas as obrigações dos bancos. Depositantes, credores e parceiros comerciais estariam protegidos das perdas. Mas para evitar o encorajamento de um comportamento financeiramente arriscado no futuro, os acionistas tiveram que sofrer. Em troca do dinheiro público, o governo recebeu títulos dos bancos individuais enquanto os proprietários existentes viram suas participações encolherem.
Os legisladores suecos criaram uma agência independente – a Autoridade de Apoio aos Bancos – para administrar a reabilitação do setor bancário e lhe deu um cheque em branco. Mas todos os bancos que buscaram ajuda do governo tiveram que se submeter a um levantamento detalhado de cada um de seus empréstimos. Na prática, isto representou um processo de triagem financeira promovido pelo governo, separando as partes saudáveis do setor bancário das que estavam podres.
As partes “boas” do setor foram salvas com injeções de novo capital tanto do governo quanto de fontes privadas. As partes “ruins” foram colocadas em duas empresas de administração de ativos criadas pelo governo e vendidas. Um grande banco, o Gota Bank, foi à falência e foi fundido ao saudável Nordbanken em 1993 (atualmente conhecido como Nordea).
“Uma das lições mais importantes é que as autoridades devem poder intervir o mais rápido possível quando um banco enfrenta problemas”, escreveu posteriormente Stefan Ingves, o arquiteto da operação de socorro e atual presidente do Riksbank, o banco central sueco.
Bom para os suecos…
A forma como o governo decidiu lidar com a situação levou a uma recuperação econômica quase tão repentina quanto a crise que a precedeu. A economia expandiu a uma taxa anual de quase 4% tanto em 1994 quanto em 1995. A garantia emergencial aos bancos foi eliminada em 1996 e substituída por um sistema de depósitos de seguro semelhante à Federal Deposit Insurance Corp. nos Estados Unidos.
A solução firme da crise por parte da Suécia recebeu aplauso dos economistas, incluindo do então presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Alan Greenspan, que disse em 1999 que o episódio mostrou que uma “solução rápida é boa”. O FMI usou o caso sueco na preparação de uma lista de “melhores práticas” para os países asiáticos que tentavam sobreviver às suas próprias crises no final dos anos 90.
Atualmente, a porta-voz do Departamento do Tesouro, Brookly McLaughlin, disse que as autoridades estão cientes da experiência sueca mas não a consideram “um exemplo para nós”.
Fonte: USA Today