Matilde Ribeiro é homenageada em depoimento à CPI
A CPI Mista dos Cartões Corporativos foi palco, nesta quarta-feira (9), de um justo ato de desagravo à ex-ministra Matilde Ribeiro, que deixou o governo em fevereiro após ser alvo de uma série de acusações por parte da grande imprensa por suposto uso irre
Publicado 09/04/2008 21:35
A base aliada do governo aproveitou o depoimento de Matilde Ribeiro à CPI dos Cartões Corporativos para realizar um ato de desagravo à ex-ministra da Igualdade Racial –que deixou o governo em fevereiro após ser vítima de uma série de denúncias –que depois mostraram-se manipuladas– sobre o uso de cartões corporativos. Parlamentares da base aliada prestaram sucessivas homenagens à Matilde que, emocionada, negou que tenha usado de “má fé” nas despesas com os cartões.
Assessoras da ex-ministra chegaram às lágrimas com as palavras de solidariedade de deputados e senadores governistas. “Para mim, você sempre será ministra do nosso governo. Tudo aquilo que Vossa Excelência fez no ministério nos orgulha, e muito”, disse o líder do governo na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS).
Assim como Fontana, outros líderes governistas foram à CPI para prestar solidariedade à ex-ministra. A senadora Ideli Salvatti (PT-SC) nem chegou a acompanhar os trabalhos da comissão, mas fez questão de dar um abraço pessoalmente em Matilde no início de seu depoimento.
O senador Paulo Paim (PT-RS) exaltou o passado de Matilde que, segundo ele, enfrentou uma série de preconceitos até chegar ao ministério. “Eu conheço a sua história, sua vida. Para nós, negros, nada é fácil neste país. Com infância pobre, mulher e negra, foi três vezes discriminada. Hoje, é uma intelectual que muito orgulha a comunidade negra”, afirmou.
O deputado Vicentinho (PT-SP) disse que a ex-ministra tem o apoio de todos os parlamentares da base aliada. “Minha irmã, nós estamos com você em todos os momentos. Sua vinda à CPI anulou qualquer má interpretação a seu respeito”, declarou.
Importante ferramenta
A ex-ministra fez questão de destacar que o uso do cartão é uma importante ferramenta de auxílio ao dia-a-dia da administração pública.
Por orientação da Controladoria Geral da União (CGU), Matilde Ribeiro teve que devolver R$ 2.815,35 aos cofres públicos. “O dinheiro foi devolvido e a análise feita indicou que não significou um ato intencional. Com isso, considero que me coloquei quite com a administração pública, considerando inclusive as recomendações para o futuro. Em nenhum momento usei o cartão para fim pessoal próprio ou de outrem”, ressaltou Matilde Ribeiro.
A ex-ministra disse que decidiu pedir demissão do cargo para não deixar que questionamentos sobre ela atrapalhassem o trabalho da secretaria. Ela disse ainda estar disposta a dar continuidade aos seus trabalhos mesmo fora do governo. “Quando pedi demissão, não foi por pressão do governo. Mas foi em nome da continuidade das políticas de governo. Mas isso não está pautado em negação da minha vida política. Eu continuarei, seja na universidade, movimento social ou qualquer outra condição de trabalho. Continuarei na trincheira”, afirmou. Ela aproveitou para reafirmar o valor da promoção das políticas de igualdade racial e a importância do uso de mecanismos como o cartão corporativo na promoção dessas políticas.
Em resposta ao relator da comissão, deputado Luiz Sérgio (PT-RJ), Matilde Ribeiro explicou, que utilizou o cartão corporativo para pagar uma compra pessoal, em um free shop de aeroporto na volta de uma viagem de trabalho, por engano. “Confundi o cartão corporativo com o cartão pessoal, ambos da mesma cor e bandeira. Foi um fato isolado”, afirmou.
Sobre os R$ 127 mil pagos a uma locadora de carros com o uso do cartão, a ex-ministra disse que é comum realizar a locação de carros quando a autoridade está fora de Brasília e que a secretaria é pequena demais para realizar licitação para cumprir essa função. “Não houve intenção de usar o cartão para substituir a licitação, e sim de facilitar o trabalho', acrescentou.
Lacerda: em defesa do sigilo
Além da ex-ministra, o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Paulo Lacerda, também depôs ontem na CPI Mista dos Cartões Corporativos. Ele defendeu a manutenção do sigilo nas despesas feitas pelo presidente da República e seus familiares com cartões corporativos e contas tipo B (a despesa é justificada por nota fiscal depois de o servidor receber uma verba). Afirmou ainda que esse procedimento é normal em outros países.
“Os gastos do presidente da República não podem se tornar vulneráveis por uma prestação de contas que venha causar ameaça ao mandatário”, disse Lacerda. “A segurança da rainha da Inglaterra não é diferente. A prestação de contas dela não é diferente”, concluiu. Ele defendeu também o sigilo dos gastos da Abin. Segundo ele, em 2007, a Agência teve orçamento de R$ 69 milhões, dos quais somente 11,7 milhões ficaram na rubrica de sigilo. “Mas isso não significa a inexistência de controle”, observou Lacerda, ao garantir que não interessa à Abin a “bisbilhotagem política.”
Esvaziamento
A oposição esvaziou o depoimento de Matilde, a exemplo do que já havia ocorrido esta manhã com o depoimento de Lacerda. A estratégia dos senadores do DEM e PSDB é abandonar a CPI mista dos cartões para concentrar as investigações na nova comissão, que será instalada no Senado. Com os trabalhos da comissão esvaziados, o depoimento de Matilde durou pouco mais de duas horas.
Os deputados Vic Pires (DEM-PA) e Índio da Costa (DEM-PA) foram os únicos da oposição a participar das duas audiências. Os dois evitaram, no entanto, fazer questionamentos à ex-ministra. Pires chegou a elogiar Matilde à frente da Secretaria de Igualdade Racial, mas disse considerar “estranho” que o governo tenha autorizado o seu depoimento à CPI após a disposição de blindar outras autoridades.
“A senhora foi a única nessa história toda que caiu, o governo não lhe deu a mão. Se a senhora não teve culpa no cartório por dolo, continuaria no cargo. É isso que eu acho que o seu governo deveria ter feito. A gente vive uma vida política em que se homenageia os mortos, os vivos não”, criticou.
Costa, por sua vez, afirmou que se a ex-ministra foi usada como “bode expiatório” pelo governo e que a CPI vai descobrir novas irregularidades no uso dos cartões corporativos.
A presidente da CPI, senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), lamentou o “fim melancólico” dos trabalhos da comissão.