Chegada da PF a Raposa Serra do Sol assusta moradores
Onze caminhonetes, pelo menos 20 agentes fortemente armados, delegados e um negociador formam o contingente que participa da primeira incursão da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, iniciada na Vila Suru
Publicado 12/04/2008 21:42
A missão agora é somente garantir a paz social, mas na prática, a chegada dos policiais deixou moradores assustados e acirrou o clima de troca de acusações entre favoráveis e contrários à permanência dos arrozeiros na área.
“Trouxe inquietação. A comunidade está revoltada. Não precisamos de ninguém para fazer a nossa segurança”, criticou Deise Henrique, mulher de um tuxaua (cacique) ligado aos arrozeiros.
Inicialmente, o comboio policial foi na direção da Escola Estadual Padre José de Anchieta, onde as aulas foram suspensas após depredação no início do ano. De bicicleta, o jovem Felipe dos Santos acompanhava a movimentação e falou baixo para não ser ouvido pelos federais.
“Era para eles [policiais] terem vindo quando estávamos em cima da ponte, mais preparados”, disse Santos, em alusão à base de resistência armada que moradores tinham montado na ponte sobre o rio Surumu para a possível desintrusão de não-índios.
Papel negociador
Na porta da escola, o negociador da PF esclarece para um grupo de mulheres que a presença policial não tem mais como objetivo retirar ninguém da área. “O papel do negociador é diminuir atritos quando há tensão entre a comunidade e a própria polícia”, explicou o delegado Fernando Segóvia, coordenador geral da operação.
O diretor da escola, Evaldo da Silva Alves, diz ao negociador que as mulheres “são gente do Paulo César [Quartiero, líder dos arrozeiros]” e é xingado pelo grupo. “A presença da polícia vai ser boa. Aqui estamos ameaçados por pistoleiros e tem de ter continuidade o processo de desintrusão”, argumenta Alves.
Amazonina Batista, 57 anos e 15 filhos, diz que índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) não são moradores da Vila Surumu, mas vão lá para provocar os que apóiam os arrozeiros. “Eles chegam aqui na marra, ameaçando e isso eu não aceito. Fazem barreira na rua e nos impedem de passar”.
O comboio policial retrocede e segue rumo ao outro lado da rua de terra batida da Vila Surumu, onde se concentram índios que opõem aos arrozeiros. Os relatos de ameaça continuam, mudando apenas o acusador. O tuxaua da comunidade do Barro, Alcides Constantino, reclama da destruição das pontes de acesso à vila e credita o ato ao líder dos arrozeiros.
“A pessoa [Quartiero] não respeita as leis. É uma área indígena já homologada. Os pistoleiros dele passam aqui com arma fazendo pouco da gente”. O tuxaua confirma a montagem de uma barreira da sua comunidade,q eu diz ser necessária para a proteção.
Arrozeiros
A professora Leontina Magalhães responsabiliza pessoas ligadas aos arrozeiros pela depredação da escola e diz que os policiais devem ficar atentos aos criminosos da região.
Um bomba caseira foi encontrada pelos policiais dentro da Igreja Católica da comunidade: “Segundo ao administrador da igreja, alguém pôs a bomba lá. Ela será apreendida e pessoas serão ouvidas no inquérito que apura a fabricação de bombas caseiras aqui”, relatou o delegado Segóvia.
A noite cai em Vila Surumu e os policias vão embora com a promessa de voltar a partir de segunda-feira (14) para instalar bases permanentes ao longo da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Mas não deixam saudade em todos. “Xô urubus”, grita uma moradora aliada aos arrozeiros.
A presença ostensiva da força policial se estenderá até o julgamento de mérito no Supremo Tribunal Federal de ações que contestam o decreto de homologação da Raposa Serra do Sol.